Avante, camaradas!


Temos Arménio Carlos em versão sindicalista suave. Foi tão meiguinho para o governo das esquerdas, sustentado pelos seus camaradas do comité central, que até teve de justificar a mobilização deste ano como um ataque ao governo anterior


Há já algum tempo que vinha sustentando a suspeita de que uma parte substancial do meio sindical deixou de representar o povo e os trabalhadores portugueses. Isso é evidente no caso da FENPROF, liderada por um professor (?) que, da última vez que deu uma aula, o Pacto de Varsóvia ainda era vivo. Julgo que ninguém levará a mal que se pergunte como é que um docente que não leciona há quase 25 anos pode representar efetivamente os professores.

Mas o fosso entre sindicalistas profissionais, ou sindicalistas políticos, e trabalhadores não se cinge à FENPROF. Ele está cada vez mais aberto. Contaminou toda a CGTP. Tomemos como exemplos as duas últimas celebrações do 1.o de Maio. Em 2015, Arménio Carlos pedia aos trabalhadores que transformassem “as eleições legislativas no momento alto da luta (…) pondo um ponto final na política de direita e no governo PSD/CDS” que, dizia, tinha “destruído 500 mil postos de trabalho” e “centenas de milhares foram obrigados a emigrar”. Era o Arménio Carlos na versão sindicalista musculado.

Em 2016, o líder da CGTP tirou o meio milhão de desempregados do discurso e esqueceu os 20 mil postos de trabalho que se perderam no primeiro trimestre. Temos Arménio Carlos em versão sindicalista suave. Foi tão meiguinho para o governo das esquerdas, sustentado pelos seus camaradas do comité central, que até teve de justificar a mobilização deste ano como um ataque ao governo anterior. Malhar num governo que já não existe há meses é, no mínimo, caricato. É a prova, se mais fossem precisas, de que a coligação das esquerdas não se esgota no parlamento. Ela é mais abrangente e une PS, BE, PCP e CGTP. A central sindical é conivente com este governo. Não vale a pena disfarçar. Até os slogans mudaram: onde em 2015 se lia, rijo, “governo para a rua, a luta continua”, está agora inscrito o mansinho “a luta continua, nas empresas e na rua”.

Eu bem sei que Arménio Carlos prometeu umas jornadas de luta aqui e ali – é natural: por via da ancoragem do PCP ao PS, a CGTP deve estar a ressacar por não ter um governo em que bater. Mas tudo isto não passa de encenação para trabalhador ver. A coligação das esquerdas está sólida porque os custos do seu colapso seriam imensos para todos os envolvidos, ao ponto de concordarem até nos pontos em que discordam. O objetivo é manter as bases despertas e o eleitorado seguro. Portanto, na hora da verdade, ou muito me engano ou a montanha de protestos prometidos pela CGTP vai parir um rato. E isto encerra um problema tremendo no futuro do movimento sindical.

Ao suavizar drasticamente os problemas do país, e especialmente os dramas dos trabalhadores, como se tivéssemos passado do inferno ao paraíso em seis meses só porque mudámos de governo, a CGTP colou-se definitiva e descaradamente a António Costa. E será corresponsável pelos resultados que ela vier a produzir. É ventríloqua da coligação das esquerdas em vez de ser porta-voz dos trabalhadores e do povo.

A colagem retira-lhe legitimidade essencial no combate político futuro, qualquer que seja a orientação política que outra eventual solução governativa venha a ter. E bem que o país vai precisar dela. Começa a cheirar a 2011. Número após número, relatório após relatório, instituição atrás de instituição, não há nada nem ninguém que não reveja em baixa as previsões para a economia portuguesa. Só o governo e os seus parceiros não parecem estar minimamente preocupados com o assunto. Afinal de contas, há prioridades e conduzir uma campanha eleitoral é muito mais importante do que governar um país. António Costa é um candidato permanente que tem como hobby ser primeiro-ministro.

Mas a marcha para o abismo não é nada que incomode as esquerdas. “Avante, camaradas” dizem eles a cada passo em frente. É preciso continuar a “luta” pelo povo, por todos, nem que ela se tenha transformado apenas na “luta” pela sobrevivência política de alguns.


Avante, camaradas!


Temos Arménio Carlos em versão sindicalista suave. Foi tão meiguinho para o governo das esquerdas, sustentado pelos seus camaradas do comité central, que até teve de justificar a mobilização deste ano como um ataque ao governo anterior


Há já algum tempo que vinha sustentando a suspeita de que uma parte substancial do meio sindical deixou de representar o povo e os trabalhadores portugueses. Isso é evidente no caso da FENPROF, liderada por um professor (?) que, da última vez que deu uma aula, o Pacto de Varsóvia ainda era vivo. Julgo que ninguém levará a mal que se pergunte como é que um docente que não leciona há quase 25 anos pode representar efetivamente os professores.

Mas o fosso entre sindicalistas profissionais, ou sindicalistas políticos, e trabalhadores não se cinge à FENPROF. Ele está cada vez mais aberto. Contaminou toda a CGTP. Tomemos como exemplos as duas últimas celebrações do 1.o de Maio. Em 2015, Arménio Carlos pedia aos trabalhadores que transformassem “as eleições legislativas no momento alto da luta (…) pondo um ponto final na política de direita e no governo PSD/CDS” que, dizia, tinha “destruído 500 mil postos de trabalho” e “centenas de milhares foram obrigados a emigrar”. Era o Arménio Carlos na versão sindicalista musculado.

Em 2016, o líder da CGTP tirou o meio milhão de desempregados do discurso e esqueceu os 20 mil postos de trabalho que se perderam no primeiro trimestre. Temos Arménio Carlos em versão sindicalista suave. Foi tão meiguinho para o governo das esquerdas, sustentado pelos seus camaradas do comité central, que até teve de justificar a mobilização deste ano como um ataque ao governo anterior. Malhar num governo que já não existe há meses é, no mínimo, caricato. É a prova, se mais fossem precisas, de que a coligação das esquerdas não se esgota no parlamento. Ela é mais abrangente e une PS, BE, PCP e CGTP. A central sindical é conivente com este governo. Não vale a pena disfarçar. Até os slogans mudaram: onde em 2015 se lia, rijo, “governo para a rua, a luta continua”, está agora inscrito o mansinho “a luta continua, nas empresas e na rua”.

Eu bem sei que Arménio Carlos prometeu umas jornadas de luta aqui e ali – é natural: por via da ancoragem do PCP ao PS, a CGTP deve estar a ressacar por não ter um governo em que bater. Mas tudo isto não passa de encenação para trabalhador ver. A coligação das esquerdas está sólida porque os custos do seu colapso seriam imensos para todos os envolvidos, ao ponto de concordarem até nos pontos em que discordam. O objetivo é manter as bases despertas e o eleitorado seguro. Portanto, na hora da verdade, ou muito me engano ou a montanha de protestos prometidos pela CGTP vai parir um rato. E isto encerra um problema tremendo no futuro do movimento sindical.

Ao suavizar drasticamente os problemas do país, e especialmente os dramas dos trabalhadores, como se tivéssemos passado do inferno ao paraíso em seis meses só porque mudámos de governo, a CGTP colou-se definitiva e descaradamente a António Costa. E será corresponsável pelos resultados que ela vier a produzir. É ventríloqua da coligação das esquerdas em vez de ser porta-voz dos trabalhadores e do povo.

A colagem retira-lhe legitimidade essencial no combate político futuro, qualquer que seja a orientação política que outra eventual solução governativa venha a ter. E bem que o país vai precisar dela. Começa a cheirar a 2011. Número após número, relatório após relatório, instituição atrás de instituição, não há nada nem ninguém que não reveja em baixa as previsões para a economia portuguesa. Só o governo e os seus parceiros não parecem estar minimamente preocupados com o assunto. Afinal de contas, há prioridades e conduzir uma campanha eleitoral é muito mais importante do que governar um país. António Costa é um candidato permanente que tem como hobby ser primeiro-ministro.

Mas a marcha para o abismo não é nada que incomode as esquerdas. “Avante, camaradas” dizem eles a cada passo em frente. É preciso continuar a “luta” pelo povo, por todos, nem que ela se tenha transformado apenas na “luta” pela sobrevivência política de alguns.