Na ressaca das eleições presidenciais, que serviram uma indigesta derrota ao PCP, Jerónimo de Sousa lá disse que não trocava o seu Edgar por “uma candidata assim mais engraçadinha” só para ter mais votos. Toda a gente percebeu a destinatária da nada subtil indireta sexista. Caiu tudo em cima de Jerónimo. A crítica do líder comunista, o futuro veio a prová-lo, só pecou por defeito. O BE está a mostrar que não passa de um bloco de engraçadinhos. É que só uma insensata prepotência pode justificar a estúpida campanha de cartazes dos dois pais. Os cartazes sumiram-se com a mesma rapidez com que apareceram. O partido assumiu o erro. Mas nem pingo de arrependimento, nem vestígios de desculpas. A arrogância do preconceito radical mata as manifestações de bondade. Este caso até pode ter ficado encerrado. Mas outros se levantarão no futuro. Por duas razões. A primeira é que a imbecilidade do Bloco ressuscita de tempos a tempos. Tal como os adolescentes gostam de esfregar a rebeldia na cara dos pais, exceto no momento em que embolsam a mesada, também o Bloco adora estas manifestações pseudoantissistémicas. A segunda razão que me leva a acreditar que campanhas manhosas como esta vão continuar prende-se com o programa político da elite dirigente do BE. Esse programa não desaparece tão facilmente como os cartazes. É um programa desenhado em Oxford pelo pós-marxista argentino Ernesto Laclau e que sustenta a ultrapassagem da luta de classes pela federação dos descontentes (ambientalistas, comunidade LGBT, desempregados, etc.) rumo à construção de uma “democracia radical”. Isto tem de ser combatido no campo das ideias políticas.
O ataque à Igreja Católica, a principal visada nos cartazes idiotas, não é um detalhe. O anticlericalismo é um dos frutos mais comuns da árvore genealógica à qual o BE está ligado. Este grupo pós-moderno despreza qualquer manifestação de ordem ou poder tradicional em que assente a sociedade. Como a Igreja. O mais curioso é que o Bloco não despreza todas as instituições religiosas com a mesma violência. Num partido sempre tão dado a internacionalismos, nunca se ouviu uma palavra do BE condenando as desprezíveis perseguições às comunidades LGBT na maior parte do mundo islâmico. Porque é que o BE não denuncia a total inexistência de direitos dos homossexuais no Irão? Será porque Teerão financia partidos irmãos do Bloco, como o Podemos?
Mais: do Bloco, esse bastião das liberdades ilimitadas, nunca se ouviu uma palavra que condenasse os abusos da Rússia sobre os seus próprios cidadãos. É esse mesmo Bloco que se envergonha e se esconde com a presença em Lisboa de um dos líderes da resistência cubana – Guillermo Fariñas, um Prémio Sakharov. Porquê?
Porque todos os inimigos da democracia como a conhecemos são amigos do Bloco, do Podemos, do Syriza, dos Varoufakis e dessa comandita de extremistas. De “leninistas 3.0”, como bem os catalogou o insuspeito Felipe González.
Esta duplicidade do Bloco, temperada com um populismo enjoativo e cheio de preconceitos morais, está patente em todas as suas expressões políticas. As pessoas do Bloco e a liderança do Bloco dissertam sobre os assuntos do mundo e sobre as suas verdades universais. É gente cheia de si mesma. Mas na verdade, na verdade, eles representam os maiores e mais duradouros movimentos de profissionais da política portuguesa.
Só a Europa concorre com a Igreja no topo dos ódios bloquistas. Também não é por acaso. O fim da Europa, da nossa Europa construída no consenso das famílias social-democrata, socialista e democrata cristã, será terreno fértil para o regresso de todos os extremismos e da única ordem adorada pelo BE, a do Estado total.
Se a aproximação ao poder é uma medida do sucesso do BE na prossecução do seu objetivo radical, é a António Costa que o país tem de pedir explicações. Sabe–se que a sobrevivência partidária de Costa implicava arregimentar o BE. Ao contrário do que aconteceu na Câmara de Lisboa, o BE não quis apenas ser figurante na governação. Também lidera, para mal do país.
O que tem o PS a ver com este Bloco de Esquerda? Essa é a pergunta a que o tempo e António Costa vão dar resposta.