Façam atas, bolas! O governo atual diz que o anterior negociou certas medidas com Bruxelas como sendo permanentes, enquanto cá assegurou que eram provisórias. PSD/CDS negam, mas não explicam em detalhe. Resultado: ninguém percebe a matéria. Dá jeito a ambos os lados. O governo também assegura não ser o responsável pela resolução do Banif, já que a decisão foi do Banco de Portugal. Logo aparece a oposição a dizer o contrário. Para evitar este espetáculo indecente, deveria ser obrigatório fazerem-se atas públicas de todas as reuniões, mantendo apenas reserva de pontos que envolvam segredo de Estado ou de justiça. A transparência assim o exige, mas a politiquice foge disso como o diabo da cruz.
Funambulismo político. Mário Centeno não conseguiu fazer nada do que se propunha no Orçamento do Estado. O chumbo radical do documento foi evitado com cedências e a habilidade funambulista de António Costa, que negociou lá fora e cá dentro. A carga fiscal sobe e passa dos cortes de ordenados para impostos sobre o consumo. A banca foi penalizada e vai repercutir isso nos clientes. A estratégia geral do OE é mais justa, porquanto já não ataca sem apelo nem agravo os rendimentos. Trata-se, no entanto, de uma política de alto risco porque, se o dinheiro que voltar aos bolsos de alguns não for para consumo interno, aquecendo a economia, haverá riscos de uma gigantesca derrapagem. Além disso, estamos pendurados na bondade do rating de uma agência canadiana que pode descer-nos a nota e boicotar o nosso financiamento nos mercados.
Missing in action. O ministro da Economia, Caldeira Cabral, esteve desaparecido e melhor seria não ter vindo à tona. Quando emergiu foi para explanar a doutrina inovadora segundo a qual, para o investimento estrangeiro, a fiscalidade não é assim tão importante. Qualquer dia dirá o mesmo do preço dos combustíveis, das portagens ou do IVA. E ainda falávamos do Álvaro, que sempre tinha a desculpa de ter vindo diretamente do Canadá para o governo.
Não TAP os olhos. Aparentemente, Costa cumpriu a promessa no caso TAP. Resta saber duas coisas: se a solução permite ao Estado injetar dinheiro na empresa com o aval de Bruxelas; e se o anúncio da suspensão de voos essenciais a partir do Porto vai ser anulada. É que se não se conseguir isso, então mais valia ter ficado quieto.
Inutilidade para lamentar ou parlamentar. Para que serviu a comissão de inquérito ao BPN? Para revelar ao país a existência de Nuno Melo. Para que serviu a comissão ao BES? Para revelar a brilhante Mariana Mortágua. Agora veremos quem será a estrela da comissão de inquérito ao Banif. Quanto àquilo para que as comissões não serviram, é fácil. A do BPN não evitou a queda do BES. A do BES não evitou a queda do Banif. É, portanto, certo que não é por existir a do Banif que a história não se repetirá.
Os bancos e os enganos. Para perceber um pouco como é possível um banco falir, é preciso conhecer pequenas coisas essenciais. Quando um cidadão deposita dinheiro num banco não está a guardá-lo lá. Está a emprestá-lo.
A partir daí, o banco fica a dever-lhe essa quantia e é assim que ela é contabilizada. Uma vez na posse do dinheiro que acha seu, o banco deveria aplicá-lo só de forma segura. Mas isso nem sempre acontece, como se tem visto. Dada a voracidade das gestões e dos acionistas, os bancos pegam no dinheiro de cada um e desatam a especular, alimentando negócios muitas vezes assentes em áreas especulativas. Criam–se bolhas que, de repente, estoiram. Surgem assim as chamadas imparidades e vai-se o dinheirinho do depositante se não estiver meramente à ordem ou a prazo e desde que não ultrapasse os 100 mil euros. Perante isto, é bom que cada um se defenda e obtenha informação sobre a solvabilidade de cada banco como eles fazem em relação às pessoas comuns (que não aos amigos) sempre que elas querem um empréstimo, mesmo pequeno. Num país e numa Europa sérios, as entidades fiscalizadoras – o governo, o BCE, o Banco de Portugal e a CMVM – seriam obrigadas a dar notas simples e claras relativamente à confiabilidade de cada banco. Mas isso acabaria com muita festança.
Mais do mesmo na justiça? Os últimos dias foram um fartote de detenções mediáticas, uma das quais se transformou em prisão preventiva. Ocorreram em Braga e em Lisboa. Foram acompanhadas das habituais violações do segredo de justiça. Surgiram notícias de que, além dos detidos, haverá mais notáveis envolvidos. Em Braga há um nome único na boca do mundo. Em Cascais fala-se de dois ou três bem conhecidos. O noticiário à volta do caso foi organizado ao jeito daquele treinador que, além de citar um tal Big Laden, nunca acusava ninguém, mas dizia aos jornalistas que eles sabiam bem de quem estava a falar. Está entretanto para se ver se estes processos serão do tipo Operação Marquês e caso BES, em que o pai não morre, mas a malta almoça muito.
Jornalista