O Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP) usado pela polícia, pelos bombeiros e por outras autoridades nacionais tem sido notícia nos últimos anos pelas falhas graves e gastos dispendiosos com a sua manutenção. A instalação do sistema foi abordada ainda pelo governo de Guterres, mas acabou por revelar-se uma aposta de António Costa.
O então ministro da Administração Interna de José Sócrates era pouco adepto do modelo do SIRESP que herdou – pelo menos, quando assumiu a pasta. António Costa chegou, inclusivamente, a manifestar a intenção de rever as negociações iniciadas por executivos anteriores, decretando que fosse anulada a adjudicação do contrato, tendo por base um parecer da Procuradoria-geral da República. Mas, de seguida, o então ministro voltou a bater à porta dos parceiros de negócio – um grupo liderado pela Sociedade Lusa de Negócios (SLN), holding do BPN de Oliveira e Costa –, fechando o contrato por 485,5 milhões de euros em maio de 2016 (52,5 milhões abaixo do valor adjudicado em fevereiro desse ano pelo ministro social-democrata Daniel Sanches).
Ao i, o ministério da Administração Interna (MAI) refere que, desde a assinatura do acordo, no início de 2006, e até ao final de 2014, este sistema de comunicação nacional custou aos cofres do Estado 270 milhões de euros (IVA excluído).
Agora, e quando ainda faltam cumprir cinco dos 15 anos de contrato do acordo original, o governo de António Costa concluiu um período de longas negociações (que se arrastavam ainda do executivo de Pedro Passos Coelho) com vista à renegociação do contrato com o consórcio. Esse processo ficou fechado no final do mês de janeiro, traduzindo-se numa poupança de 21,7 milhões de euros (valor também sem IVA) para os próximos cinco anos. “A poupança representa 10% do total dos pagamentos do Estado previstos desde a data do início do processo negocial até ao fim de vida do contrato, isto é, de 2014 em diante”, tinha já referido ao “Dinheiro Vivo” o ministério das Finanças.
Apesar de já haver um acordo inicial conseguido em abril do ano passado, durante o anterior governo essa renegociação não ficou concluída. “Aquando da tomada de posse do atual governo”, em novembro de 2015, “o acordo entre a comissão de negociação e a concessionária não estava aprovado por todos os membros do governo competentes”, refere ao i o MAI. As alterações ao contrato precisavam, também, da assinatura do Conselho de Ministros, que nunca chegou a concretizar-se no tempo de vida do anterior executivo.
Mais barato e com mais serviços Mas, em dois meses, António Costa conseguiu que todos os elementos da sua equipa envolvidos no processo rubricassem o aditamento ao contrato. A 29 de janeiro, o Estado e o consórcio selaram o acordo e, no dia seguinte, o documento dava entrada no Tribunal de Contas, de onde deverá sair nas próximas semanas um visto, “expresso ou tácito, da confirmação de que as alterações introduzidas não se encontram sujeitas a procedimento de fiscalização prévia”, referia o mesmo jornal digital.
Do consórcio liderado pela SLN – atual Galilei, a braços com um Plano Especial de Revitalização (PER) para tentar evitar a falência do grupo – faziam ainda parte a Motorola, a PT Venture e a Esegur. A partir do momento em que o aditamento ao contrato entre em vigor, e até 2021, quando termina o primeiro contrato, a gestão e manutenção do SIRESP custará ao erário público 194 milhões de euros, também sem IVA, segundo os dados disponibilizados pelo MAI e contando já com o reacerto de contas da renegociação.
Neste processo, o governo garante ter conseguido juntar o melhor dos dois mundos: renegociou em baixa o valor da renda a pagar aos privados e, ao mesmo tempo, garantiu que o serviço (recorrentemente noticiado pelas falhas registadas, como pode ler-se no texto ao lado) não só não é reduzido como até sai reforçado. “Desde o início” das negociações, foi “transmitido à operadora que nenhuma redução de encargos [poderia] diminuir a qualidade de serviço prestada pela rede aos seus utilizadores”, refere o ministério de Constança Urbano de Sousa, sendo que “o aditamento contratual garante inclusive um incremento dos níveis de serviço de disponibilidade e de cobertura da rede SIRESP”, acrescenta o MAI.
Consórcio em risco Num futuro não muito distante, o SIRESP pode vir a chocar de frente com outra pedra na engrenagem: a morte da Galilei. O grupo sobreviveu ao definhar da Sociedade Lusa de Negócios, depois da nacionalização do banco. Mas avançou com o pedido de revitalização numa tentativa de garantir o pagamento das dívidas aos credores, entre os quais o próprio Estado.
Se o processo não resultar, o consórcio a que foi entregue a gestão e manutenção do sistema perderá um dos elementos centrais.