Manual para as presidenciais

Manual para as presidenciais


No próximo domingo, os portugueses vão escolher o quinto Presidente da República eleito. O i responde a dez perguntas essenciais sobre as eleições presidenciais. Foram nove atos eleitorais para escolher quatro presidentes. A segunda volta tão desejada pelos candidatos à esquerda de Marcelo Rebelo de Sousa só aconteceu uma vez.


É comum haver segunda volta nas eleições presidenciais?

Não. Só aconteceu uma vez na história da democracia, nas eleições de 1986. Foram à segunda volta Mário Soares e Freitas do Amaral. A primeira volta foi disputada entre Soares, Freitas, Salgado Zenha e Maria de Lourdes Pintasilgo. Com os socialistas divididos, Soares conseguiu pouco mais de 25% na primeira volta; Salgado Zenha, 20,8%; e Maria de Lourdes Pintassilgo, 7,3%. Freitas, com o apoio do PSD de Cavaco Silva, ficou à frente com mais de 46%. Mário Soares estava fragilizado pelas duras medidas de austeridade que o governo por si liderado aplicou entre 1983 e 1985, mas na segunda volta captou todos os votos à esquerda e venceu. Nas restantes sete eleições ficou tudo resolvido à primeira volta.

Já alguma vez houve tantos candidatos?

Não. Até esta eleição, o número máximo tinha sido seis candidato, o que aconteceu em 1980, 2006 e 2011. Mas em nenhuma destas eleições houve segunda volta. O menor número de candidatos a ir a votos nas presidenciais foi na eleição entre Jorge Sampaio e Cavaco Silva, em 1996. O agora Presidente da República foi derrotado, mas viria a suceder a Sampaio dez anos depois. As eleições do próximo domingo vão ficar marcadas por serem as primeiras com dez candidatos. Os mais surpreendentes são Vitorino Silva, conhecido como o Tino de Rans, Jorge Sequeira e Cândido Ferreira, que conseguiram reunir mais de 7500 assinaturas para entrarem neste combate eleitoral.

Quais foram as eleições em que os portugueses menos participaram?

As últimas eleições, em 2011, foram as menos participadas de sempre. Cavaco Silva foi eleito pela segunda vez Presidente da República e a abstenção bateu o recorde com 53,48%. A maior taxa de abstenção foi registada nos Açores, onde pouco mais de 30% dos eleitores participaram. Só no Porto e em Braga houve mais de 50% dos eleitores a participar neste ato eleitoral. Os votos brancos e nulos também bateram o recorde em 2011. O número de votos brancos ultrapassou os 190 mil (4,3% do total) e houve quase 86 mil votos nulos. Nas presidenciais, a abstenção só tinha ultrapassado os 50% em 2001, quando Jorge Sampaio se recandidatou ao cargo e venceu à primeira volta com 55% dos votos.

Qual foi o candidato com o pior resultado em 40 anos de democracia?

Foi Aires Rodrigues, com apenas 0,2% dos votos em 1980. Nessa eleição, mais de 95% dos votos foram para Ramalho Eanes e Soares Carneiro. Aires Rodrigues conseguiu apenas 12 745 votos. Candidataram-se ainda Pires Veloso, que conseguiu pouco mais de 45 mil votos, com 0,78%; Galvão de Melo, que obteve quase 48 500 votos, com 0,84%; e Otelo Saraiva de Carvalho com 85 mil votos, quase 1,5%. Segue-se entre os piores candidatos o advogado Garcia Pereira, com 0,4% dos votos em 2006. O conhecido advogado teve cerca de 23 mil votos. Garcia Pereira já se tinha candidatado cinco anos antes com um resultado melhor, apesar de só ter tido cerca de 69 mil votos, o que correspondeu a 1,59%.

Quem foi o Presidente eleito com mais votos?

Foi Mário Soares quando se candidatou pela segunda vez. Soares conseguiu 70,3% dos votos. Pela única vez na história da democracia, um militante socialista teve o apoio do PSD. A posição de Cavaco Silva não foi, porém, inocente. O ex–primeiro-ministro, na sua autobiografia política, explica que um confronto com Mário Soares seria “um confronto supérfluo que dificultaria a ação futura do governo”. Concorreram ainda nessa eleição Basílio Horta, Carlos Carvalhas e Carlos Marques da Silva. O único candidato de direita foi Basílio Horta, mas não chegou aos 15%, depois de uma campanha solitária. O candidato com o apoio dos comunistas, Carlos Carvalhas, teve apenas menos 5 mil votos do que o então dirigente do CDS, com quase 13% dos votos (o melhor resultado de sempre dos comunistas).

Qual foi o Presidente eleito com menos votos?

Foi Cavaco Silva em 2006, com 50,5% dos votos. Nessas eleições foram a votos seis candidatos e os outros cinco eram de esquerda. Manuel Alegre ficou em segundo, com 20,7%, e Soares em terceiro, com 14,3%. Os comunistas conseguiram 8,6% com o atual secretário-geral do partido, Jerónimo de Sousa, e os bloquistas 5,3%, com Francisco Louçã. Garcia Pereira ficou-se pelos 0,4%. Apesar disso, Cavaco Silva venceu as duas eleições à primeira volta e quando se recandidatou reforçou a votação, com quase 53%. O atual Presidente da República teve, porém, menos votos na segunda vez que foi eleito. Em 2006, Cavaco foi eleito com 2 milhões e 700 mil votos, e na segunda com menos meio milhão de votos – o que se explica pelo aumento significativo da abstenção.

Quantas mulheres se candidataram a Belém?

Maria de Lourdes Pintasilgo foi, até agora, a única mulher a ir a votos nas eleições presidenciais, em 1986. A engenheira química já tinha inovado ao ser a primeira mulher a chegar à chefia do governo, em 1979, num executivo de iniciativa presidencial. A candidatura de Pintasilgo arrancou com força mas sem apoios partidários, e acabou por ter apenas 7,3%. À sua frente ficaram Freitas do Amaral, com mais de 46%; Mário Soares, com 25%; e Salgado Zenha, com cerca de 20%. As eleições foram ganhas por Mário Soares, mas só à segunda volta. Pela primeira vez, nas eleições do próximo domingo há duas mulheres candidatas à Presidência da República: Maria de Belém Roseira e Marisa Matias.

Quantas pessoas já se candidataram à Presidência em 40 anos?

Desde a primeira eleição, em 1976, foram 28 os candidatos a ir a votos na eleição para a Presidência. Mário Soares e Cavaco Silva foram os que se candidataram mais vezes ao cargo. Cada um concorreu três vezes. Eanes, Sampaio, Otelo Saraiva de Carvalho, Manuel Alegre e Garcia Pereira protagonizaram duas candidaturas. Os restantes candidatos foram Pinheiro de Azevedo, Soares Carneiro, Galvão de Melo, Pires Veloso, Aires Rodrigues, Carlos Marques da Silva, Freitas do Amaral, Salgado Zenha, Ferreira do Amaral, Basílio Horta, José Manuel Coelho, Defensor Moura e Fernando Nobre. Os candidatos comunistas foram Octávio Pato, Carlos Carvalhas, António Abreu, Jerónimo de Sousa e Francisco Lopes. Louçã e Fernando Rosas candidataram-se com o apoio do BE. Maria de Lourdes Pintasilgo foi a única mulher.

Já tinha acontecido os socialistas aparecerem divididos?

Sim, e mais que uma vez. Em 1980, Mário Soares autossuspendeu-se de secretário-geral do PS quando o partido decidiu apoiar a recandidatura de Ramalho Eanes. Em 1986, o ambiente foi ainda mais dramático com a rutura entre Soares e Salgado Zenha, amigos de longa data e duas figuras centrais do PS. O partido voltaria a dividir-se dez anos depois e novamente Soares esteve no centro da polémica. O PS decidiu apoiar a terceira candidatura de Soares, mas o histórico Manuel Alegre avançou com uma candidatura independente e ficou à frente do ex-Presidente da República. A novidade nestas eleições é que, pela primeira vez, o PS não apoia oficialmente nenhum dos candidatos a Belém.

Qual foi a eleição com a menor abstenção em 40 anos de democracia?

Foi em 1980, quando Ramalho Eanes se candidatou pela segunda vez contra Soares Carneiro. Apenas 15,6% dos portugueses se abstiveram. A eleição foi ganha por Ramalho Eanes, que contava com o apoio dos socialistas, apesar de Mário Soares discordar e ter decidido autossuspender-se do cargo de secretário-geral. Soares reconheceu, porém, que “Eanes tinha força” e “beneficiava do prestígio que lhe conferia a função”. Soares Carneiro contava com o apoio do PSD de Sá Carneiro, do CDS e do PPM, que estavam coligados no governo. As eleições aconteceram três dias após a morte de Sá Carneiro mas, apesar do clima de emoção que atingiu o país, Eanes venceu com 56,4% dos votos.

luis.claro@ionline.pt