Clima atmosférico e clima mental


O erratismo do clima parece ter-se entranhado nos espíritos das elites. E consequentemente no clima mental da coletividade


Portugal tem estado como o clima: um dia de sol envergonhado entre nuvens, um dia de nuvens e nevoeiro, outro de dilúvio, ventos e tempestade. O clima enlouqueceu – é que se é inverno que seja inverno: que faça frio, chuva, vento! Agora verões entrecortados por outonos, invernias que amanhecem primaveras, não se aguenta.

Logo que a maior dificuldade do vivente venha sendo saber se vale a pena arriscar sair de corpo bem feito, não vá regressar a casa encharcado que nem um pinto e com uma carraspana de constipação, ou se se aparelha de gabardine e galochas chegando húmido dos suores dos plastificados e cansado de acrescer o chapéu-de-chuva à indumentária!

Infelizmente o erratismo do clima parece ter-se entranhado nos espíritos das elites. E consequentemente no clima mental da coletividade.

Senão, atente o leitor:

a) A crise que nos assolou violentamente, qual tempestade, com os credores a devorarem-nos vivos, afinal não era tão grave assim… mas os credores continuam a fazer visitas regulares à presa quase morta, para assegurar que ainda sobrevive o suficiente para pagar o que deve;

b) As subvenções mensais vitalícias tinham acabado, mas afinal não acabaram todas, pois, que Diabos, há direitos adquiridos a tutelar… porém, as pensões já fixadas preteritamente, e consolidadas como direitos adquiridos muito antes de quaisquer troikas, puderam ser cortadas. Mais estranho ainda, as subvenções que, mercê da crise não eram para pagar, afinal devem ser pagas porque a crise passou… mas se passou, passou para o futuro, não para o passado, enquanto não foram pagas… Então vão ser pagas? Com efeitos a? E se a crise passou, que vêm cá fazer os credores? Controlar se são pagas mesmo? E as pensões cortadas e a CES cobrada? Também serão devolvidas por inconstitucionais em face da tutela da confiança?

c) Ainda não se volveram dois anos, e depois de se desfazer a totalidade do pavimento do Jardim do Príncipe Real para substituir o alcatrão por um tipo de “areão prensado”, a mesma Câmara Municipal, com as mesmas forças políticas no poder, decide destruir a obra feita, para substituir o mesmo pavimento por outra “coisa” qualquer. E lá temos o Príncipe Real todo esventrado novamente, aguardando os fregueses o que vai desta feita a edilidade fazer naquele espaço… seguramente numa operação que representará uma poupança não adivinhável à partida, ou uma benfeitoria autorizada pela inexistente crise.

d) por fim: milhões para repavimentar as ruas de Lisboa, nos próximos não sei quantos anos! Mas então quando estes quilómetros estiverem todos repavimentados, não terão de se repavimentar os que não estão neste lote e que entretanto o tempo, e uso diário, degradarão? É notícia que se anuncie o que nunca devia deixar de ser feito como gestão corrente? Até parece que nos anunciam uma mercê, um bodo. Mas não: é o anúncio do banal, que nunca devia ter deixado de ser feito, pois… não houve crise nenhuma!

Enquanto isso, duas mãos cheias de cidadãos digladiam-se numa campanha morna, vazia de conteúdo, totalmente inútil. Trata-se de escolher o símbolo máximo da Nação, da continuidade do Estado, da sua unidade, perpetuidade e constância. Da sua dignidade. É democrático. Mas será certo enxovalhar em campanha quem um dia cingirá a Banda das Três Ordens, esquecendo nessa futura bonança as vilanias a que agora foi sujeito?

Realmente há coisas “fáceis de entender”. Mas não serão estas…

Advogado, escreve à sexta-feira

Clima atmosférico e clima mental


O erratismo do clima parece ter-se entranhado nos espíritos das elites. E consequentemente no clima mental da coletividade


Portugal tem estado como o clima: um dia de sol envergonhado entre nuvens, um dia de nuvens e nevoeiro, outro de dilúvio, ventos e tempestade. O clima enlouqueceu – é que se é inverno que seja inverno: que faça frio, chuva, vento! Agora verões entrecortados por outonos, invernias que amanhecem primaveras, não se aguenta.

Logo que a maior dificuldade do vivente venha sendo saber se vale a pena arriscar sair de corpo bem feito, não vá regressar a casa encharcado que nem um pinto e com uma carraspana de constipação, ou se se aparelha de gabardine e galochas chegando húmido dos suores dos plastificados e cansado de acrescer o chapéu-de-chuva à indumentária!

Infelizmente o erratismo do clima parece ter-se entranhado nos espíritos das elites. E consequentemente no clima mental da coletividade.

Senão, atente o leitor:

a) A crise que nos assolou violentamente, qual tempestade, com os credores a devorarem-nos vivos, afinal não era tão grave assim… mas os credores continuam a fazer visitas regulares à presa quase morta, para assegurar que ainda sobrevive o suficiente para pagar o que deve;

b) As subvenções mensais vitalícias tinham acabado, mas afinal não acabaram todas, pois, que Diabos, há direitos adquiridos a tutelar… porém, as pensões já fixadas preteritamente, e consolidadas como direitos adquiridos muito antes de quaisquer troikas, puderam ser cortadas. Mais estranho ainda, as subvenções que, mercê da crise não eram para pagar, afinal devem ser pagas porque a crise passou… mas se passou, passou para o futuro, não para o passado, enquanto não foram pagas… Então vão ser pagas? Com efeitos a? E se a crise passou, que vêm cá fazer os credores? Controlar se são pagas mesmo? E as pensões cortadas e a CES cobrada? Também serão devolvidas por inconstitucionais em face da tutela da confiança?

c) Ainda não se volveram dois anos, e depois de se desfazer a totalidade do pavimento do Jardim do Príncipe Real para substituir o alcatrão por um tipo de “areão prensado”, a mesma Câmara Municipal, com as mesmas forças políticas no poder, decide destruir a obra feita, para substituir o mesmo pavimento por outra “coisa” qualquer. E lá temos o Príncipe Real todo esventrado novamente, aguardando os fregueses o que vai desta feita a edilidade fazer naquele espaço… seguramente numa operação que representará uma poupança não adivinhável à partida, ou uma benfeitoria autorizada pela inexistente crise.

d) por fim: milhões para repavimentar as ruas de Lisboa, nos próximos não sei quantos anos! Mas então quando estes quilómetros estiverem todos repavimentados, não terão de se repavimentar os que não estão neste lote e que entretanto o tempo, e uso diário, degradarão? É notícia que se anuncie o que nunca devia deixar de ser feito como gestão corrente? Até parece que nos anunciam uma mercê, um bodo. Mas não: é o anúncio do banal, que nunca devia ter deixado de ser feito, pois… não houve crise nenhuma!

Enquanto isso, duas mãos cheias de cidadãos digladiam-se numa campanha morna, vazia de conteúdo, totalmente inútil. Trata-se de escolher o símbolo máximo da Nação, da continuidade do Estado, da sua unidade, perpetuidade e constância. Da sua dignidade. É democrático. Mas será certo enxovalhar em campanha quem um dia cingirá a Banda das Três Ordens, esquecendo nessa futura bonança as vilanias a que agora foi sujeito?

Realmente há coisas “fáceis de entender”. Mas não serão estas…

Advogado, escreve à sexta-feira