Não sendo possível prever quando Portugal enfrentará um sismo de magnitude semelhante ao de 1755, resta-nos fazer estimativas sobre os danos que um terramoto com aquelas dimensões provocaria hoje. E o cenário não podia ser mais preocupante, alerta Mário Lopes, investigador do Instituo Superior Técnico. Um tremor igual ao que aconteceu há 260 anos e arrasou sobretudo a região de Lisboa e do Algarve causaria ainda mais estragos porque o litoral está sobrecarregado de construção.
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Um sismo de grandes proporções provocaria entre 17 e 27 mil mortes, mais de 50 mil feridos e um número de desalojados que facilmente chegaria ao meio milhar. As contas estão feitas em diversos estudos, inclusivamente nos cálculos do Laboratório Nacional de Engenharia Civil.
É com o objectivo de testar o nível de resposta à eventualidade da ocorrência de um maremoto associado a um sismo que a Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC) está a desenvolver esta semana um simulacro à escala internacional no território continental. O exercício enquadra-se no projecto europeu EU WESTSUNAMI, coordenado pela Dirección General de Protección Civil y Emergencias de Espanha, e conta com a participação da Protecção Civil de Marrocos, além da de Portugal. Tudo “países ribeirinhos susceptíveis à ocorrência de sismos de grande magnitude”.
A ANPC justifica a escolha do terramoto de 1 de Novembro de 1755 – “um dos maiores de sempre” – para testar o socorro nos vários países envolvidos, por ser o exemplo do cenário mais gravoso alguma vez vivido na Europa. No âmbito nacional, a simulação, que contou também com a participação do Instituto Português do Mar e da Atmosfera e da Direcção-Geral da Autoridade Marítima, visou testar o plano especial de emergência para o risco sísmico e de maremotos da região do Algarve, a zona continental mais próxima do epicentro do sismo de há 260 anos.
A ANPC explica ainda que o simulacro, que termina hoje às 11 horas, foi feito numa modalidade de “postos de comando”, ou seja, tratou-se de um exercício que não envolveu “movimentação real de meios no terreno”.
Um dos comandos envolvidos é o de Carnaxide (Lisboa), onde é feita a gestão dos meios e a resposta aos pedidos de socorro que vão surgindo (conforme o tipo de ocorrências: desabamento de terras, de casas, destruição de hospitais, de estradas e pontes) e onde é feito um acompanhamento da situação através de imagens de satélite. Ao mesmo tempo, é a partir desta sala que, num cenário hipotético de terramoto, são feitos os comunicados à população, com a colaboração da comunicação social. No Algarve, o posto de operações está localizado na cidade de Faro, que é auxiliado por Lisboa quando esgotados os meios de resposta da região.
Os postos de comando de Madrid e de Rabat também fizeram parte do exercício, que, embora seja apenas isso, tem como objectivo preparar o país para o cenário mais gravoso. “Não nos podemos esquecer que é uma ficção com aderência à realidade”, ressalva a APNC, assegurando que a ideia é estar preparado para o pior, mesmo que tal não venha a acontecer.
Mas mais que actuar no socorro é necessário prevenir, defende Mário Lopes. É preciso diminuir o grau catastrófico de um terramoto através de reabilitação urbana. O especialista do Instituto Superior Técnico não tem dúvidas ao afirmar que “vivemos em cima de um barril de pólvora, prestes a explodir”. Só não sabemos quando. Para se ter uma noção da grandeza de um episódio desta dimensão, Mário Lopes explica que o “prejuízo material de um sismo igual ao de 1755 seria suficiente para fazer duplicar a nossa dívida pública, em apenas dois minutos”. O problema é a diversidade de construções no país, boa parte anterior a 1958, ano em que se regulamentou o sector da construção tendo em conta a segurança sísmica. Se por um lado existem edifícios preparados para um terramoto, por outro também há muitas casas que são “verdadeiros baralhos de cartas”. Pior que Portugal, na Europa, só mesmo a Turquia, onde um sismo de grande magnitude provocaria cerca de 100 mil mortes.