A versão de marco
“Tudo não terá passado de um descontrolo da sua parte. Estando alcoolizado, dirigiu-se à residência do pais da ofendida, onde sabia que esta habitava com o filho menor de ambos, sentando-se à sua porta. Ao retirar mais uma cerveja da mochila, surpreendeu-se com a presença, no seu interior, de uma garrafa contendo gasolina, tudo se tendo precipitado. Incendiou três pedaços de T-shirt que também trazia na mochila e estes fizeram uma bola de fogo, que de imediato largou. Parte da bola de fogo caiu perto de si, à porta da residência dos pais da ofendida, e o outro pedaço caiu para baixo (interior do prédio). Tentou apagar o fogo, mas não conseguiu, tendo abandonado o local e ligado às autoridades.”
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A versão do tribunal
“Ao regar com gasolina e acender com o isqueiro os pedaços de pano que colocou junto da porta da residência dos pais da ofendida e do ciclomotor que se encontrava junto da entrada do prédio, zonas de passagem e acesso ao exterior do prédio, o arguido agiu com o propósito de atear fogo ao prédio, bem sabendo que as chamas se poderiam propagar, conforme sucedeu. As chamas só não atingiram maior proporção em virtude da rápida intervenção dos moradores e dos bombeiros.”
“O arguido, por não aceitar a separação, não se coibiu de deitar fogo ao apartamento onde Regina (…) residia com o seu filho menor, demonstrando completa indiferença pela sua presença no apartamento, colocando assim em risco pelo menos a vida do menor, por que Regina ainda não tinha regressado a casa aquando do incêndio.”
A personalidade
“Não obstante ter tido apoio pedopsiquiátrico durante um período de tempo considerável, Marco (…) denota ser um indivíduo com uma estrutura emocional fragilmente construída, destacando-se a existência de sentimentos de abandono, revolta e frustração. Com o irmão mais novo, também institucionalizado, manteve sempre uma postura cuidadora e protectora.”
O percurso
“Concluiu o 9.o ano de escolaridade através de um curso profissionalizante de cozinha e pastelaria. Contava 17 anos quando começou a passar metade dos dias da semana junto de familiares, integrando, devido à emigração da mãe para a Bélgica, o agregado do padrinho. Todavia, o confronto com um quotidiano desestruturado, ausente de regras/limites e manifestamente distinto do que estava habituado no colégio [Casa Pia] favoreceu a sua integração em grupos de pares anti-sociais, onde era banalizado quer o consumo de haxixe e de bebidas alcoólicas quer a ociosidade e adopção de condutas delinquentes. Em 2008 integrou o agregado da mãe, mas o seu quotidiano manteve-se inalterado, na medida em que esta não se conseguiu impor como figura de autoridade, revelando-se permissiva e com diminuta ascendência sobre os seus comportamentos. Neste contexto de total desestruturação, passou a subsistir exclusivamente a expensas da mãe e de apoios sociais – Rendimento Social de Inserção. A gravidez inesperada da namorada acabou por acelerar a vida marital do casal. A partir de então, começou a fazer trabalhos ocasionais, sem grande expressividade.”
O abandono
“Quer o contexto de separação da companheira, quer o afastamento do filho parece ter espoletado no arguido o confronto com conflitos internos decorrentes da sua história de vida, da qual se destacam sentimentos de abandono e rejeição, bem como a privação de afectos mais profundos. (…) Conta que atenta a desorganização emocional que se encontrava a viver pela perda de controlo da situação e confronto com emoções que não soube gerir, começou a recorrer ao consumo de bebidas alcoólicas para manter algum alheamento, o que o levou a adoptar comportamentos-limite.”