O PSsó vai divulgar o acordo de governo com os partidos à sua esquerda em cima do debate parlamentar do programa do governo PSD/CDS. O calendário exacto ainda não está decidido, mas os socialistas dão por certo que o compromisso não será tornado público antes do debate parlamentar. A explicação avançada ao i é simples: não deixar que o acordo à esquerda passe para o centro da discussão pública antes de o programa de governo do PSD e CDS ser escrutinado.
Uma possível solução, que o “Diário de Notícias” avançava este fim-de-semana, será a apresentação de uma moção de rejeição conjunta dos três partidos da esquerda ao programa de governo, um texto comum que especificará já os termos da alternativa política da esquerda. O acordo propriamente dito seria divulgado posteriormente.
Por agora, depois de Cavaco Silva ter indigitado Pedro Passos Coelho para formar governo, a esquerda não tem urgência em fechar o acordo. Desde quinta-feira que não há reuniões – os três partidos passaram os últimos dias a fazer contas e preparam-se para retomar as conversas no início desta semana. E poderão durar enquanto Pedro Passos Coelho escolhe o governo e prepara, depois, o programa (que terá de ser levado ao parlamento até dez dias depois da nomeação do executivo).
Energia a 13%? PS faz contas
Nas negociações entre os três partidos o valor do aumento do salário mínimo, actualmente nos 505 euros, é a grande questão ainda em aberto. Mas há outras. Depois de ter rejeitado a descida do IVA sobre a electricidade da taxa máxima de 23% para a taxa mínima de 6%, alegando que a perda de receitas seria incomportável, o PS está agora a fazer contas a uma descida para a taxa intermédia, de 13%.
Em aberto estão também medidas de carácter legislativo. São cerca de duas dezenas de propostas que estão a ser analisadas uma a uma, e que abrangem cinco grandes áreas: precariedade, saúde, educação, finanças e habitação. Este último ponto uniu várias vezes os partidos da esquerda na última legislatura, nomeadamente em duas questões: evitar as penhoras das casas que constituam primeira habitação de um agregado familiar; e extinção da dívida nos casos em que o imóvel seja entregue ao banco (dação em pagamento).
Discurso DO PR foi pressão As negociações à esquerda já estão a decorrer na convicção de que António Costa será o primeiro-ministro de um governo socialista apoiado por PCP e BE. As palavras de Cavaco Silva na passada semana são vistas à esquerda como uma forma de pressão. A possibilidade de o Presidente da República deixar o governo de Passos em gestão é pura e simplesmente rejeitada – seria o caos político. À esquerda lembra-se que o governo pode ficar em gestão, mas a Assembleia da República estará na plena posse das suas funções – e com uma maioria de esquerda. Ou seja, pode travar qualquer iniciativa do executivo. E legislar à revelia do governo e das bancadas dos partidos que o apoiam. É certo que o Presidente da República poderia depois vetar os diplomas oriundos do parlamento (que pode votá-los novamente, bastando uma maioria absoluta para obrigar Cavaco a promulgar), mas esta seria uma situação política incomportável.
A convicção generalizada à esquerda de que Cavaco não deixará o governo em gestão apoia–se, aliás, em dois nomes à direita – Pedro Passos Coelho e Marcelo Rebelo de Sousa. Com o argumento de que o primeiro não aceitará ficar à frente de um governo sem qualquer margem de acção. E que Cavaco, a optar por esse cenário, passaria os últimos meses do seu mandato a ser criticado pelo candidato da sua área política, que, sendo eleito, teria como primeira decisão reverter a escolha do antecessor.
O conselheiro de Estado Luís Marques Mendes também acredita que o Presidente da República vai dar posse a um governo de esquerda. “Cavaco Silva vai dar posse, no futuro, a um governo de António Costa, se lhe for apresentado o acordo […] Parece-me óbvio que é isso que vai acontecer”, disse, no seu comentário na SIC, o ex-líder do PSD. Mendes descarta a hipótese de o Presidente deixar o executivo em gestão, se a moção de rejeição ao programa de governo for aprovada na Assembleia da República. O ex-ministro de Cavaco Silva considera que um governo de gestão seria “um descalabro”, porque “só teríamos Orçamento do Estado em Novembro de 2016”. A hipótese de um governo de iniciativa presidencial também é recusada por Marques Mendes, porque não passaria no parlamento.