Miomas uterinos. Novo tratamento permite evitar cirurgias

Miomas uterinos. Novo tratamento permite evitar cirurgias


Dois milhões de mulheres em Portugal sofrem com estes tumores benignos. Investigadores apresentam tratamento que dispensa cirurgia e reduz miomas e hemorragias


Miomas uterinos podem parecer, à primeira vista, algo de estranho para a maioria dos portugueses. O certo é que, só em Portugal, há dois milhões de mulheres que vivem ou já viveram com estes tumores que, embora benignos, provocam sintomas como pressão abdominal ou hemorragias abundantes. Para elas – e também para 24 milhões de mulheres na Europa – há agora um tratamento por comprimidos de acetato de ulipristal que substitui a cirurgia.

Apesar dos sintomas e do desconforto, um quarto desta população demora, em média, mais de um ano a procurar ajuda. A vergonha é o principal obstáculo. “Precisamos de reduzir o estigma do sangramento porque isso tem um enorme impacto na qualidade de vida”, explica Helena Kopp Kalner, consultora sénior de ginecologia e obstetrícia do Karolinska Institutet, em Estocolmo.

Jacques Donnez, médico responsável pelo estudo PEARL IV, na área do tratamento dos miomas uterinos por acetato de ulipristal, apresentou na passada sexta-feira, em Budapeste, as conclusões desta recente investigação da farmacêutica Gedeon Richter. De acordo com os resultados obtidos num estudo que incluiu quatro ciclos de tratamento – de 12 semanas de toma diária de 5 mg de acetato de ulipristal, a dose recomendada –, o sangramento abundante foi controlado no final de cada etapa em aproximadamente 93% das mulheres. Já cerca de 76% estavam em estado de amenorreia – ausência de menstruação – no final de cada ciclo. 

No estudo PEARL IV, que envolveu 451 mulheres de 11 países europeus, 98% das histerectomias – cirurgia que consiste na retirada do útero – foram evitadas através do tratamento por acetato de ulipristal. Esta opção através da medicação, além de evitar uma operação invasiva de retirada do útero ou dos miomas, evita a carga psicológica associada e preserva a fertilidade da mulher, defendem os investigadores.

Os médicos destacam assim o potencial do acetato de ulipristal, não apenas como um recurso pré-cirurgia para reduzir as hemorragias e o tamanho dos miomas, mas também como terapêutica para ser feita a longo prazo. Com o tratamento intermitente houve uma redução significativa dos sintomas associados a esta condição, como a pressão abdominal, a frequência urinária e a fadiga. O sangramento anormal parou, deu-se a redução do tamanho do mioma ou mesmo o seu de-saparecimento e houve ainda uma “melhoria na qualidade de vida”, conta Donnez. Os efeitos secundários mais reportados foram dores de cabeça e ruborização. 

IMPACTO Para Kalner, “manter a fertilidade é muito importante, assim como evitar a histerectomia”. Também Deborah Lancastle destaca o papel que os miomas uterinos têm na vida das mulheres: “Esta condição tem impacto na saúde psicológica, física e social”, alerta a psicóloga da saúde, acrescentando que os miomas e todos os sintomas que lhes estão associados podem ainda comprometer a carreira de uma mulher. 

A vida social é também constantemente afectada por esta condição. Até a escolha do vestuário passa a obedecer a critérios que minimizem os sintomas dos miomas uterinos: “As mulheres têm sempre tendência a vestir roupas mais escuras. Nós somos engenhosas a encontrar soluções para tudo, mas neste caso essa não é uma boa característica: significa que não estamos a procurar ajuda”, desmistifica Lancastle. Mais de 80% das mulheres indicam que esta condição afecta a intimidade e a capacidade para estabelecer uma nova relação. 

Em Portugal, segundo dados da Administração Central do Sistema de Saúde, realizaram-se 3325 histerectomias nos hospitais do Sistema Nacional de Saúde em 2014. Cada acto teve o valor de cerca de 2600 euros, a que acrescem custos de baixas médicas, Segurança Social e consultas. 

Questionado pelos jornalistas sobre o que se segue neste campo de investigação, Jacques Donnez é peremptório: “Estamos no final da evolução.”