Ao longo de milhares de anos, as execuções públicas foram usadas como uma forma de intimidação: “Isto é o que acontece a quem desobedece à lei.”
Em Roma, após a revolta dos escravos liderada por Espártaco, 6 mil rebeldes foram crucificados ao longo de 200 km da Via Ápia. Em Marraquexe, a emblemática Praça Djemaa el-Fna deve o seu nome às cabeças de criminosos que eram espetadas no cimo das muralhas. Em Portugal, os autos-da-fé inquisitoriais obedeciam a uma coreografia complexa. E no Irão certos crimes graves continuam a ser punidos com o enforcamento em guindastes. O cadáver suspenso do condenado fica a balançar à vista de toda a gente.
Porém, aos poucos o mundo civilizado foi abolindo estes hábitos. Nos estados ocidentais que a mantiveram, a pena capital (de caput, “cabeça” em latim) deixou de ser aplicada na praça pública. Houve no entanto quem percebesse o enorme potencial destas práticas e o usasse em seu proveito. Refiro-me aos ilusionistas.
No final do século XIX e primeira metade do século XX multiplicaram–se nas salas de espectáculos europeias os números de magia que simulavam um tipo particular de pena capital: a decapitação. Servais Le Roi, que se autointitulava o “monarca da magia”, prometia surpreender o seu público com “o grande mistério da decapitação”. Outro mago, o italiano Benevol (que apesar do nome nada tinha de benevolente), apresentava-se como “reencarnação do carrasco de Paris” e “cortador de cabeças”.
“Poucas imagens transmitem um sentido de poder e horror tão eficazmente como uma decapitação”, li há tempos no magnífico livro “Magic. 1400’s-1950’s”, de 2009. Mal sonhavam os autores que, poucos anos depois de escreverem estas linhas, os fanáticos do Estado Islâmico iriam recorrer às decapitações para impressionar o mundo. Tal como os ilusionistas de antigamente, perceberam o tremendo potencial deste espectáculo grotesco. A diferença é que têm na televisão o seu palco e cada vez que o número se repete há mais uma vítima inocente.