O repto é de Maria de Belém, ex-ministra da Saúde socialista que esta manhã moderou a apresentação do Relatório da Primavera do Observatório Português dos Sistemas de Saúde. Da próxima vez que um qualquer ministro da saúde for pressionado pelo ministro das Finanças a cortar no sector, porque é sempre dele a última palavra, pode resumir o argumento de que o desinvestimento em saúde gera ineficiência financeira em três palavras: “custa mais dinheiro. Qual delas é que é que não entende?”
Apesar de os autores do relatório terem tido mais mão no tempero do que nos últimos anos, a constatação de que há dificuldades no acesso com a diminuição de consultas de proximidade, uma rede de cuidados continuados insuficiente ou lacunas na saúde mental que se não forem colmatadas vão gerar mais despesas com uma população mais doente motivou uma resposta encalorada por parte do Secretário Adjunto do Ministro da Saúde, que deixou clara a sua ideia de que a história julgará com mais imparcialidade que os actuais analistas o legado do governo.
Há dois anos que o ministério da saúde recusava participar na apresentação do documento e esta manhã Leal da Costa compareceu, reconheceu o “esforço” da equipa ao não ter expresso “impressões e recortes dos jornais” como nas edições anteriores mas sublinhou que o trabalho “peca por omissão” de todas as coisas boas feitas pelo governo. E disse que as recomendações que incluem uma organização mais inteligente do SNS para dar resposta a uma população cada vez mais velha e com doenças crónicas, a começar por mais apoio domiciliário, são “chover no molhado.”
Porque o impasse tem sido este em quase todos os debates sobre política de saúde nos últimos anos, o repto de Maria de Belém, a quem Leal da Costa agradeceu ter “assumido as dores bem violentas que perpassam a governação da saúde”, acaba por ser dos mais úteis da sessão da manhã. Depois do resgaste e do memorando, há aspectos em que o SNS melhorou e outros em que piorou. Não há entendimento sobre que prato da balança pesa mais mas é consensual que falta investir nas mudanças de paradigma que todos os relatórios que se focam sobre o SNS dizem ser necessárias, e nesse sentido de facto as recomendações do observatório não são novas: mais prevenção, mais cuidados aos idosos, mais cuidados de proximidade e um sistema menos “hospitalocêntrico”, mais psicólogos nos centros de saúde e reforço da saúde mental, mais estruturas de resposta comunitária. O governo diz que o SNS estava falido e agora está na rota sustentável, algo que muitos duvidam e faltam dados que confirmem. Mas dizer que basta de chuva não significa que ela já tenha feito efeito e que o SNS dos estudos, dos grupos de trabalho e dos relatórios já seja uma realidade. “Qualquer tentativa de melhorar a acessibilidade sem investimento real é cosmética”, resumiu o médico de família Armando Brito e Sá na apresentação desta manhã na Gulbenkian.