Manuel Pereira
72 anos
Reformou-se em 2004, terminando o seu percurso profissional como administrador de uma empresa. Tal como Helena Santos, frequenta o curso de História, algo que “já tinha em mente”, mas só concretizou em 2012, quando pôs “os pés ao caminho para a faculdade”. Os outros desejos foi alterando por circunstâncias da própria vida. “Tinha alguns sonhos, como toda a gente, mas foram um pouco alterados pela morte da minha mulher. O meu sonho, agora, é acabar o curso e gozar os anos de vida que ainda tiver.” Ou seja, uma velhice com alguma tranquilidade, ainda que as dificuldades trazidas pelos cortes nas pensões o tornem mais difícil, continua a ser um plano que Manuel Pereira tenta seguir. Todos os anos faz, por norma, uma “viagenzinha” ao estrangeiro, por vezes com a filha de 37 anos, professora durante 12 e actualmente “tele-operadora a ganhar o ordenado mínimo”.
A rotina diária de Manuel Pereira divide-se entre a faculdade e a “lida doméstica”, embora não saiba cozinhar. Admite, comparando-se com outros reformados, que é “um bocado privilegiado”. “Tenho uma casa, um sistema de saúde, que é o sistema dos bancários. Isso dá-me alguma tranquilidade.” Sobretudo face a uma sociedade que diz não estar a preparar-se para os idosos, embora acredite que isso pode ser reversível. “Talvez não nas próximas décadas, mas as coisas não são imutáveis. A História movimenta-se.”
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Helena Santos
61 anos
Reformou-se há 12 anos, quando o banco onde trabalhava foi comprado por outro. “Abriram as portas a quem quisesse reformar-se e eu aproveitei e fui gozar a vida”, diz a antiga gerente. Isso significa realizar sonhos, como a licenciatura em História ou mudar-se de Lisboa para Azeitão, onde faz jardinagem e cuida de uma horta. A essas somam-se actividades para as quais faltava tempo: ler, passear, fazer voluntariado ou conviver mais com os amigos.Usa o Facebook e o email, mas não é refém das tecnologias. A reforma trouxe algum sedentarismo e às tantas sentiu necessidade de se mexer. “Nos três primeiros meses até me soube bem, mas depois comecei a sentir falta do frenesim.” No ginásio faz aulas de zumba e piloxing e, ao ar livre, caminhadas. Apesar de conseguir aproveitar os anos da reforma para concretizar desejos antigos, Helena Santos reconhece que isso não acontece à maioria e quando a idade avança e os problemas de saúde aparecem a situação complica-se para muitos. “Tenho um subsistema de saúde muito bom, mas a maioria dos idosos nem tem condições para comprar os medicamentos.” Se tiverem de ir para um lar, onde a mensalidade ultrapassa muitas vezes os 1000 euros, também não conseguem pagar. Situações que a assustam e fazem temer pelo futuro do filho. “Possivelmente há-de ser pior, porque a reforma dele não há-de ser como a minha.”
Irene Marcelino
62 anos
O isolamento dos mais velhos é o que mais entristece a antiga funcionária pública. Aposentada desde Dezembro, considera que, apesar de algumas mudanças e estruturas criadas, a mentalidade é a de que os idosos devem ficar em casa. “As pessoas, a partir de determinada idade, não interessam. Quando alguém mais velho está com pessoas de uma faixa etária mais nova é visto como o cota que vai tomar um copo à noite. Até na geração a seguir à minha há cada vez mais pessoas sozinhas e isoladas, se não derem elas o passo para fazer alguma coisa.” No seu caso, deu vários, desde inscrever-se em duas universidades sénior a ir quatro dias por semana ao ginásio, onde se esquece das fronteiras etárias. “Para mim, não é fácil fazer amizades com pessoas da minha idade, talvez por ter trabalhado sempre com gente muito jovem.” Irene, que optou por se aposentar com penalização para gozar com qualidade os anos de reforma, diz que devem ser criados meios para promover um envelhecimento activo. “Há pessoas que são obrigadas a ficar em casa porque não têm a capacidade de sair ou porque sozinhas não têm coragem. A primeira vez que fui ao cinema sozinha, foi um desafio.” Viúva e com duas filhas, preocupa-a o futuro delas. Não só pensa que as suas pensões serão inferiores como teme que essa situação seja agravada “porque a família e os laços familiares deixaram quase de existir”.