© Delfim Machado/Lusa
Sempre gostei de futebol e sou do Sporting Clube de Portugal desde que me conheço. Gosto de sentir a adrenalina de um jogo, gosto da alegria e do sofrimento que pode provocar cada jogada, cada golo. Uma coisa é gostar de futebol e ser-se adepto ferrenho, outra muito diferente é o que se viu no passado fim-de-semana de Guimarães a Lisboa. Adeptos enraivecidos e forças da ordem a criarem desordem é tudo quanto não se deve permitir, é tudo quanto merece castigo exemplar.
Futebol é paixão irracional. Nisso se aproxima do amor. Ambos têm razões que a razão desconhece. Mas se a violência doméstica é combatida, a violência no desporto também o deverá ser. O respeito pelo outro tem de estar acima do irracional da paixão. O irracional da paixão só é saudável até ao momento em que não põe em causa o outro. Quer seja um objecto de paixão amorosa, quer seja um objecto de paixão clubista.
Serenamente, depois da hora e meia da paixão, há que reflectir. Por exemplo: este ano, o Benfica é um justo vencedor do campeonato. Foi beneficiado aqui e ali? Foi. Alguns outros clubes foram prejudicados pelas arbitragens? Foram. Mas, no final, o Benfica ganhou porque o Porto e o Sporting não foram melhores. Cometeram erros infantis, para lá de terem ou não sido, aqui e ali, prejudicados.
O Benfica foi mais constante. Sem ter a melhor equipa, pareceu sê-lo por vezes. E disfarçou muito bem noutras ocasiões. O Benfica ganhou. Honra aos vencedores. Fez a festa com todo o direito a isso. Fazê-la no centro de Lisboa, fechando as ruas à população, terá sido correcto? Acho que não.
A festa de cada clube deverá ser no seu estádio. Não se trata do Benfica, aqui. Mas de qualquer clube. Do Sporting, do Porto, do Braga ou do Amora. Até porque não se deve impor a outros a festa que eles não querem. Mas, sendo a festa na rua, é imperdoável verem-se cenas como as que se viram no Marquês de Pombal e adjacentes. Adeptos contra adeptos, adeptos contra a polícia. A ordem tem de ser respeitada como valor comum. Esta deve ser uma regra para qualquer cidadão. Mas ver-se o que se viu em Guimarães, com as forças da ordem a investir selvaticamente contra um cidadão, continua a ser imperdoável.
É imperdoável o facto em si. É imperdoável o facto de um outro cidadão aparecer (julga-se, pai do primeiro) a pôr água na fervura e levar dois socos. É imperdoável o facto de isso tudo acontecer na presença de um miúdo, filho e neto dos agredidos. Que mundo é este? Que mundo é este em que um polícia tem de tapar os olhos de uma criança para esta não ver o pai ser agredido por um outro polícia?
Escreve à sexta-feira