Sprays de laca a sustentar penteados pirosos, aparelhos de ar condicionado, frigoríficos ou extintores encheram de aerossóis a paisagem urbana dos anos 80. Marcas de um estilo de vida que provocou uma das maiores descobertas científicas de sempre e que foram fruto de sucessivos erros cometidos desde o início do século passado. Seria injusto culpar as poupas extravagantes que marcaram os penteados dos anos 80, mas tiveram a sua quota de responsabilidade quando em Maio de 1985 três investigadores lançaram o alerta: um buraco gigante em cima da Antárctida ameaçava a camada de ozono.
Jonathan Shanklin, Joe Farman e Brian Gardiner foram os primeiros investigadores a encontrar uma explicação para a especulação à volta dos gases lançados pelos electrodomésticos ou pelo jactos supersónicos – como o Concorde –, os principais suspeitos de destruíram a camada protectora da atmosfera terrestre. No início poucos acreditavam no potencial da descoberta dos três investigadores da então pequena British Antarctic Survey. Os dados que apresentaram ao mundo contudo não deixaram margem para dúvidas. Ao recolher informação sistematizada sobre a camada do ozono, não foi preciso muito para se aperceberem de modificações relevantes. Tão relevantes que julgaram estar perante um erro nos instrumentos de medição. Só depois de repetir o processo durante anos conseguiram provar, de forma ainda aleatória, que a camada de ozono estava a encolher.
Num esforço de equipa, os investigadores uniram conhecimentos e distribuíram tarefas. Jonathan ocupou-se da calibragem do aparelho de medição, Joe investigou o efeito dos chamados clorofluorcarbonetos – vulgo gases CFC – e os três concluíram que aumento do buraco na camada do ozono seguia um padrão: a cada Primavera surgia um novo buraco e os existentes iam ficando maiores todos os anos.
E depois? Os três cientistas conseguiram calar as vozes mais cépticas e o artigo foi publicado na revista “Nature”, iniciando uma nova era que uniu boa parte do planeta à volta de uma causa. As pesquisas posteriores vieram comprovar a teoria de que os CFC são os prováveis culpados pela diminuição rápida da camada, o que levou à assinatura do Acordo de Montreal por 150 países, que se comprometeram a substituir o uso de CFC e outras substâncias que contribuem para aumentar o buraco de ozono. Kofi Annan, o então secretário–geral da ONU, descreveu o processo como “o acordo internacional de maior sucesso até à data”. Apesar da vontade geral de proteger o planeta, os CFC enviados até 1989 (ano de entrada em vigor do acordo) já estavam na atmosfera e as suas características fazem deles gases de longa duração. Daí que, apesar dos esforços globais, o buraco não esteja controlado e as previsões dos especialistas não sejam animadoras.
Jonathan Shanklin não dá menos de 50 anos para conseguirmos voltar a suspirar de alívio. “O rápido crescimento do buraco mostra a forma acelerada como a atmosfera se transforma”, conta ao i o especialista. Apesar de perceber o esforço global e de reconhecer as consequências positivas que vieram do Acordo de Montreal, Jonathan lembra que, “tendo em conta a quantidade de gases com efeito de estufa que continuam a ser enviados para a atmosfera”, esta lição parece estar a ser ignorada.
Buraco a diminuir Os representantes dos países signatários do Protocolo de Montreal concluíram este ano que as acções postas em prática conduziram a uma redução das substâncias destruidoras da camada de ozono. Este reconhecimento, apoiado em dados revelados no final do ano passado, dava conta de que, depois de 30 anos de declínio, a espessura da camada de ozono está a aumentar. Os cientistas afirmam que a proibição dos compostos perigosos está agora a ter efeito e, se a tendência continuar, em 2050 a camada de ozono deve atingir a espessura medida no início da década de 1980.
As notícias são positivas, mas uma vida dedicada ao estudo de algo tão imprevisível como a atmosfera afasta Jonathan Shanklin das grandes certezas. “Não sabemos tudo sobre o ozono: conhecemos a química básica, mas tenho a convicção de que há sempre mais para descobrir.”