Neil DeGrasse Tyson. Conversas fora de órbita, gravidade zero

Neil DeGrasse Tyson. Conversas fora de órbita, gravidade zero


O apresentador do remake de “Cosmos” é o astrofísico americano mais popular do momento. 


Ao conhecimento científico junta uma capacidade rara para comunicar. Primeiro foi podcast, agora “Star Talk” é o novo programa de televisão de NeilDeGrasse Tyson, um talk show sobre as estrelas no particular e a matemática no geral, com uns quantos famosos à conversa. Estreia hoje no National Geographic mas antes estivemos ao telefone com o apresentador e cientista.

A lógica manda que fiquemos nervosos se está em causa uma conversa com Neil DeGrasse Tyson. É uma questão de bom senso: trata-se do mais famoso astrofísico do mundo, um tipo que ainda não mudou o pensamento científico, que não fez nenhuma descoberta revolucionária, mas que sabe tudo sobre o que se passa entre este planeta que é o nosso e tudo o resto, que não sabemos bem a quem pertence. Percebe tanto de lei da gravidade como de matéria negra – e alguém que sabe tudo isto sobre uma coisa que ninguém vê merece o nosso respeito. A conversa aconteceu pelo telefone, com mais três jornalistas de outros tantos países europeus. Cada um fazia as suas perguntas à vez, tudo muito democrático, e do outro lado da linha estava DeGrasse Tyson, tal qual o costumamos ver na televisão: um génio simpático, um pedagogo cativante, um cientista que nasceu para comprovar as maravilhas das matemáticas na televisão. Hoje chega a Portugal o seu novo programa, “Star Talk”, e é a própria da celebridade que dá início à conversa, com a categoria de sempre: “Então, vamos falar de estrelas?” 

Falemos pois. A primeira curiosidade a esclarecer é a mais óbvia: Neil, que programa é este? “É um programa em que convido pessoas que não pertencem necessariamente ao circuito científico para falar de coisas da ciência. Claro que a conversa depois não se fica por aí, mas a piada é essa. Porque a ciência faz parte da nossa vida normal, a matemática faz parte da nossa vida normal, está em tudo. Falar do dia-a-dia com átomos pelo meio não tem nada de especial, não deveria ter.” É ele, é DeGrasse Tyson que nos diz isto. Se duvidávamos que o homem teria tempo para este telefonema, estamos agora esclarecidos.É que mais ninguém poria a questão desta maneira, Neil faz questão de guardar boa parte do seu tempo público para desfazer o mito do investigador que só pensa nas fórmulas, raramente nas pessoas. “Foi por isso que vim aqui parar, porque visitei um dia o Planetário de Nova Iorque e vi as estrelas num passeio. No meio do meu dia o universo estava ali à minha mão. Não podia escapar a isso.”

Não escapou e tornou-se presidente do mesmo planetário – se é para resolver os assuntos então que se resolvam em grande estilo. “‘Star Talk’ é mais ou menos como um planetário”, conta. “Não se vêem as estrelas mas a conversa dá-nos visões de coisas que nunca experimentámos, pontos de vista diferentes. Não é um Hubble, não é uma sonda Voyager, mas faz parte da mesma missão final.”

Como cientista ou como apresentador, esta coisa da missão está-lhe sempre na ideia. Quando apresentou a versão actualizada de “Cosmos” não quis ser um novo Carl Sagan – “como é que poderia alguma vez ser um dos heróis que me fizeram vir aqui parar?”, pergunta.Antes, procurou dar bom uso ao que de melhor temos para tornar sedutora a divulgação científica: “A tecnologia faz milagres. E por fazer milagres temos de ter consciência de que mesmo quem não está à primeira vista interessado nestes temas, ou em quaisquer outros, vai querer sempre ver imagens fantásticas, efeitos especiais, vai querer viajar sem sair do lugar. A ciência faz isso só que às vezes é preciso um empurrão para que tal maravilha se perceba.”

Conversas “Star Talk” vai convidar celebridades para uma espécie de sala de estar num estúdio de televisão. Um dos visitantes mais célebres, logo ao segundo episódio, é Christopher Nolan, realizador de “Interstellar”. “O Christopher é um visionário, que deu às teorias dos buracos negros e da relatividade um corpo que nunca tínhamos visto”, conta DeGrasse Tyson. “Claro que há ali fantasia, é um filme, nunca vou esperar ver uma obra de ficção como espero ver um documentário. Mas ‘Interstellar’ fez melhor que muitos documentários.”

Estas conversas, contudo, não terão como objectivo nenhum trabalho de evangelização científica. Neil, ainda e sempre entusiasmado neste telefonema a cinco, diz-nos que não quer “impor nenhum tipo de verdade a ninguém”. Questionado sobre os negacionistas que, sobretudo nos EUA, o têm contestado como porta-voz de falsidades, De Grasse Tyson é simples na resposta: “Percebe que cada pessoa acredite no que quiser, que cada um de nós escolha um caminho. O que não me parece correcto é que tomemos tais escolhas como verdades universais. É o que não fazemos com o método científico. Nunca sabemos se o que pensamos hoje vamos ter por certo amanhã.” Já agora, um última pergunta: e isso não é uma angústia, caro Neil? “Nada disso. É um desafio.”

TV
Star Talk estreia hoje no NationalGeographic às 23h45