A inesperada corbynização pode evitar a pasokização
O PS e o PSD sempre foram, em termos de programa, demasiado parecidos. No PSD, Cavaco Silva ajudou a cimentar uma coisa que uniu a direita chamada “cavaquismo”, que em termos económicos não se distinguia muito do PS, tirando umas privatizações a mais. O conservadorismo de Cavaco, o autoritarismo e mais uns pós, conseguiram criar um movimento que não era seguramente ideológico mas deu vitórias à direita e duas maiorias absolutas ao PSD.
No PS houve Guterres, outro centrista católico – e contra a despenalização do aborto, aliás –, que era genericamente “bonzinho” e fazia um excelente contraste com a figura de Cavaco Silva. Depois apareceu Sócrates, mais um centrista, que não conseguia – como no filme “Palombella Rossa” – dizer “qualquer coisinha de esquerda”.
Como o PS de Mário Soares se tinha consolidado na luta contra o PCP, é natural que boa parte do PS ainda se sinta catatónico ao imaginar que o partido se prepara para formar governo “com os comunistas”. Francisco Assis está a dar a voz a uma corrente que não é assim tão frágil dentro do PS – e basta ouvir António Vitorino ou as intervenções de Jorge Coelho para se perceber até que ponto. A “blairização” do PS vem de muito longe e a crise financeira de 2008 tornou-o, em termos europeus, igual à direita. Basta ver como os socialistas europeus e os conservadores estiveram unidos para transformar a zona euro naquilo que é.
É por isso que a experiência de um governo PS com o apoio do PCP e do Bloco de Esquerda vai ser difícil, mas todos os envolvidos têm de ter a perfeita consciência de que é obrigatório que corra bem. Se correr mal, vai levar o PS de volta ao caminho que está a tornar o movimento social--democrata irrelevante na Europa.
A inusitada “corbynização” do PS de Costa pode ser o antídoto contra a “pasokização” que se vê aqui ao lado no PSOE. Mas não se faz com uma perna às costas – e, como dizia Churchill, PSD e CDS são apenas adversários.