O Futuro do planeamento urbano inteligente tem de ter visão e coragem.


O planeamento urbano inteligente raramente dá frutos eleitorais imediatos, mas garante sustentabilidade, coesão e progresso a médio e longo prazo


Nas nossas cidades, cenas que há não muito tempo pareciam saídas de filmes de ficção científica tornaram-se, discretamente, parte do quotidiano. Semáforos que adaptam o tempo consoante o fluxo de trânsito, contentores de lixo que avisam os serviços quando estão prestes a transbordar para fora das ilhas ecológicas que temos nos 308 concelhos do país, candeeiros que intensificam a luz quando um peão se aproxima — são mais do que inovação, são ferramentas ao serviço do bem-estar urbano. Mas esta transformação não pode ser lida apenas à luz do espanto tecnológico: ela exige pensamento estratégico, planeamento inteligente e liderança com visão.

A digitalização do planeamento urbano é muito mais do que um impulso para “modernizar” os serviços municipais. É, hoje, a melhor forma de responder — com eficiência e justiça — aos desafios concretos das nossas cidades, vilas e aldeias. Tecnologias como a Internet das Coisas (IoT), análise de big data e inteligência artificial permitem recolher e cruzar informação em tempo real sobre tráfego rodoviário, ruído, qualidade do ar, consumo energético ou ocupação do espaço público. Com base nesses dados, podem tomar-se decisões informadas: prevenir engarrafamentos, ajustar redes de transportes, evitar ruturas de água ou reduzir desperdícios. É disso que falamos quando falamos de cidades inteligentes — de governação e gestão baseada em evidência, não em improvisos ou intuições.

Lisboa, Porto, Guimarães, Aveiro ou Viseu têm já exemplos consistentes de aplicação deste modelo. A capital portuguesa foi distinguida como Capital Europeia da Inovação em 2023; o Porto aposta em mobilidade inteligente e sensores ambientais; Guimarães está entre as 100 cidades europeias com metas de neutralidade carbónica. Mas esta revolução não pode ficar circunscrita às grandes metrópoles. O desafio é alargar, escalar e adaptar. E é aqui que o Algarve, com a sua realidade territorial muito própria, tem uma oportunidade singular.

Numa região marcada pela reconhecida flutuação populacional, sazonalidade turística, escassez hídrica (hoje com folga de tanta depressão climatérica) e desafios de coesão, o planeamento urbano digital pode ser uma poderosa ferramenta de resposta e de antecipação. Ajustar os transportes à realidade do verão, gerir consumos de água em tempo real, otimizar a recolha de resíduos ou integrar dados de saúde pública no planeamento local são formas concretas de pôr a tecnologia ao serviço da vida comunitária.

É fundamental, no entanto, que esta transformação digital não seja confundida com mera aquisição de gadgets ou fabrico de App’s. Não se trata de encher os municípios com sensores e aplicações sem critério. O verdadeiro salto qualitativo acontece quando há uma visão estratégica por trás de cada passo: quando os dados recolhidos servem objetivos concretos, quando os investimentos são sustentados, quando as pessoas são o centro da equação.

A liderança política é, por isso, determinante. Presidentes de câmara, vereadores e equipas técnicas municipais que compreendem o potencial da inovação digital têm a responsabilidade de desenhar esta transição. São esses agentes políticos que podem mobilizar fundos europeus, estabelecer parcerias com universidades e empresas tecnológicas, formar os seus quadros e envolver os cidadãos no desenho das soluções. E são eles, sobretudo, que devem resistir à tentação política do curto-prazo. O planeamento urbano inteligente raramente dá frutos eleitorais imediatos, mas garante sustentabilidade, coesão e progresso a médio e longo prazo.

Uma cidade verdadeiramente inteligente não se mede pelo número de sensores instalados. Mede-se pela forma como planeia, pela justiça das suas políticas, pela inclusão digital que promove. É inteligente a cidade que protege os dados dos cidadãos, que garante conectividade para todos, que não exclui os menos tecnófilos. É inteligente a cidade que capacita os seus técnicos e que ouve os seus habitantes.

Portugal tem tudo para ser um laboratório vivo de boas práticas urbanas. Temos escala, temos talento e  temos autarquias dinâmicas. Falta, por vezes, maior articulação entre níveis de poder e mais ambição coletiva. O planeamento urbano digital deve ser prioridade nacional — não como modismo, mas como pilar de um novo ciclo de desenvolvimento territorial.

Não se trata de futurologia, trata-se de responsabilidade. A cidade do futuro será aquela que souber planear hoje com inteligência, com dados e com coragem. É esse o verdadeiro desafio — e também a nossa verdadeira oportunidade.

Agora, é com todos nós. O futuro constrói-se já.

Carlos Gouveia Martins

O Futuro do planeamento urbano inteligente tem de ter visão e coragem.


O planeamento urbano inteligente raramente dá frutos eleitorais imediatos, mas garante sustentabilidade, coesão e progresso a médio e longo prazo


Nas nossas cidades, cenas que há não muito tempo pareciam saídas de filmes de ficção científica tornaram-se, discretamente, parte do quotidiano. Semáforos que adaptam o tempo consoante o fluxo de trânsito, contentores de lixo que avisam os serviços quando estão prestes a transbordar para fora das ilhas ecológicas que temos nos 308 concelhos do país, candeeiros que intensificam a luz quando um peão se aproxima — são mais do que inovação, são ferramentas ao serviço do bem-estar urbano. Mas esta transformação não pode ser lida apenas à luz do espanto tecnológico: ela exige pensamento estratégico, planeamento inteligente e liderança com visão.

A digitalização do planeamento urbano é muito mais do que um impulso para “modernizar” os serviços municipais. É, hoje, a melhor forma de responder — com eficiência e justiça — aos desafios concretos das nossas cidades, vilas e aldeias. Tecnologias como a Internet das Coisas (IoT), análise de big data e inteligência artificial permitem recolher e cruzar informação em tempo real sobre tráfego rodoviário, ruído, qualidade do ar, consumo energético ou ocupação do espaço público. Com base nesses dados, podem tomar-se decisões informadas: prevenir engarrafamentos, ajustar redes de transportes, evitar ruturas de água ou reduzir desperdícios. É disso que falamos quando falamos de cidades inteligentes — de governação e gestão baseada em evidência, não em improvisos ou intuições.

Lisboa, Porto, Guimarães, Aveiro ou Viseu têm já exemplos consistentes de aplicação deste modelo. A capital portuguesa foi distinguida como Capital Europeia da Inovação em 2023; o Porto aposta em mobilidade inteligente e sensores ambientais; Guimarães está entre as 100 cidades europeias com metas de neutralidade carbónica. Mas esta revolução não pode ficar circunscrita às grandes metrópoles. O desafio é alargar, escalar e adaptar. E é aqui que o Algarve, com a sua realidade territorial muito própria, tem uma oportunidade singular.

Numa região marcada pela reconhecida flutuação populacional, sazonalidade turística, escassez hídrica (hoje com folga de tanta depressão climatérica) e desafios de coesão, o planeamento urbano digital pode ser uma poderosa ferramenta de resposta e de antecipação. Ajustar os transportes à realidade do verão, gerir consumos de água em tempo real, otimizar a recolha de resíduos ou integrar dados de saúde pública no planeamento local são formas concretas de pôr a tecnologia ao serviço da vida comunitária.

É fundamental, no entanto, que esta transformação digital não seja confundida com mera aquisição de gadgets ou fabrico de App’s. Não se trata de encher os municípios com sensores e aplicações sem critério. O verdadeiro salto qualitativo acontece quando há uma visão estratégica por trás de cada passo: quando os dados recolhidos servem objetivos concretos, quando os investimentos são sustentados, quando as pessoas são o centro da equação.

A liderança política é, por isso, determinante. Presidentes de câmara, vereadores e equipas técnicas municipais que compreendem o potencial da inovação digital têm a responsabilidade de desenhar esta transição. São esses agentes políticos que podem mobilizar fundos europeus, estabelecer parcerias com universidades e empresas tecnológicas, formar os seus quadros e envolver os cidadãos no desenho das soluções. E são eles, sobretudo, que devem resistir à tentação política do curto-prazo. O planeamento urbano inteligente raramente dá frutos eleitorais imediatos, mas garante sustentabilidade, coesão e progresso a médio e longo prazo.

Uma cidade verdadeiramente inteligente não se mede pelo número de sensores instalados. Mede-se pela forma como planeia, pela justiça das suas políticas, pela inclusão digital que promove. É inteligente a cidade que protege os dados dos cidadãos, que garante conectividade para todos, que não exclui os menos tecnófilos. É inteligente a cidade que capacita os seus técnicos e que ouve os seus habitantes.

Portugal tem tudo para ser um laboratório vivo de boas práticas urbanas. Temos escala, temos talento e  temos autarquias dinâmicas. Falta, por vezes, maior articulação entre níveis de poder e mais ambição coletiva. O planeamento urbano digital deve ser prioridade nacional — não como modismo, mas como pilar de um novo ciclo de desenvolvimento territorial.

Não se trata de futurologia, trata-se de responsabilidade. A cidade do futuro será aquela que souber planear hoje com inteligência, com dados e com coragem. É esse o verdadeiro desafio — e também a nossa verdadeira oportunidade.

Agora, é com todos nós. O futuro constrói-se já.

Carlos Gouveia Martins