Luís Montenegro vai entregar à Procuradoria-Geral da República (PGR) toda a documentação relativa à contabilidade, e-mails, lista de clientes e atividade comercial da Spinumviva, a empresa que fundou em janeiro de 2021, juntamente com a mulher e os filhos, apurou o Nascer do SOL. O primeiro-ministro antecipa-se assim a qualquer pedido feito pela PGR no âmbito da averiguação preventiva que esta abriu, conforme o procurador-geral da República, Amadeu Guerra, anunciou na passada quarta-feira.
Recorde-se que a PGR anunciou ter aberto «uma averiguação preventiva aos dados, para recolher elementos adicionais relativamente a entidades terceiras». O procurador-geral explicou que a averiguação não irá recorrer a «meios intrusivos» – como escutas ou quebra de sigilo bancário ou fiscal, que só poderiam ser autorizados por um juiz no âmbito de um inquérito-crime – mas sim a recolha de dados em «fonte aberta e pedidos a entidades terceiras que podem ou não fornecer a informação» pedida pelo Ministério Público.
Ou seja, tendo em conta as suspeitas participadas, a averiguação preventiva destina-se a reunir a contabilidade de todas as sociedades relacionadas com o universo da Spinumviva, incluindo a empresa do próprio chefe do Executivo, para o MP poder avaliar se há factos que indiciam ter sido cometido algum crime.
Em causa estão, essencialmente, duas suspeitas em relação à empresa familiar de Montenegro.
Recebimento de ‘luvas’
Das suspeitas levantadas, a mais grave seria mesmo um alegado esquema de corrupção, tese levantada principalmente pelo líder do PS, Pedro Nuno Santos. Segundo este, a empresa familiar de Montenegro poderia estar a receber elevados montantes por serviços fictícios.
Uma hipótese negada por juristas especializados consultados pelo jornal Observador, que teve acesso a mais de mil páginas de documentação interna da Spinumviva, produzidas entre 2022 e fevereiro de 2025, altura em que o chefe do Executivo chega à liderança do PSD e abandona a empresa.
De acordo com o trabalho de investigação publicado ontem por este órgão de comunicação, «os serviços de consultoria na área de proteção de dados foram efetivamente prestados» e foi comprovado o envio de uma parte dos relatórios aos clientes.
Questionado pelo Observador, o líder do PSD terá explicado detalhadamente como angariou as contas da Solverde, Rádio Popular, Ferpinta, Sofarma (Lopes Barata, Consultoria e Gestão, Lda) e CLIP — Colégio Luso Internacional do Porto. Mas continua sem revelar a identidade dos clientes ocasionais da Spinumviva, nem o valor específico de faturação de cada cliente.
Valores acima do preço de mercado?
Em relação à suspeita de cobrança de preços alegadamente excessivos pelos serviços prestados, os mesmos juristas garantiram ao Observador não estar surpreendidos com os valores praticados pela Spinumviva e que estão «em linha com os valores de mercado».
Num comunicado publicado a 28 de fevereiro, a Spinumviva garantia que «os preços cobrados e pagos pelos serviços prestados atendem à dimensão e complexidade dos trabalhos com cada cliente e oscilam entre os mil e os 4.500 euros mensais». A avença da Solverde foi estipulada no valor máximo – 4.500 euros –, o que, segundo os advogados consultados pelo Observador, «não choca», nem destoa dos valores de mercado, dado que envolve o «acompanhamento quase diário da atividade» da empresa.
200 a 300 interações anuais com Solverde
Outro dado relevante avançado pelo jornal Observador diz respeito ao trabalho levado a cabo pelos colaboradores da Spinumviva, que passaria por gerir as caixas de correio eletrónico do encarregado de proteção de dados da Solverde, Rádio Popular, Ferpinta, Sofarma e CLIP, nomeadamente as interações com os clientes destas sociedades.
A Solverde era o cliente com mais interações com os titulares dos dados, a par da Rádio Popular, que variavam entre as 200 e as 300 por ano.
«Para uma empresa com esse perfil, com essa exposição, haver utilizadores a fazer esse tipo de pedidos, diria que é normal», explica o jurista, citado pelo Observador.