Nota prévia: Morreu Jorge Nuno Pinto da Costa. Tanto como o enorme presidente que projetou e deu títulos mundiais ao FC do Porto e a Portugal, Pinto da Costa foi um agitador e construtor de uma nova realidade nacional que mobilizou, fez crescer o Porto e o Norte, dando-lhes a primazia política e económica que hoje têm, apesar de por lá ainda acharem que não. Esteve 42 anos à frente do clube e na hora da sua partida há que relembrar também José Maria Pedroto, que o inspirou.
1. Luís Montenegro limitou-se a retocar o gGoverno em vez de o remodelar. Aproveitando a necessidade óbvia de substituir o demissionário Hernâni Dias, mexeu apenas em outros cinco secretários de Estado, provavelmente por desentendimentos naturais entre estes “ajudantes” (como Cavaco os imortalizou) e os seus ministros. Nada de estranho, sabendo-se que alguns nem se conheciam. Enganou-se quem admitia que pelo menos as ministras da Administração Interna e da Saúde poderiam ter guia de marcha. Percebe-se a opção de Montenegro. No caso do MAI, Margarida Blasco tem recuperado a sua imagem pública e o seu trabalho invisível foi relativamente eficaz. Conseguiu até uma pacificação, ao atender parte das legítimas reivindicações policiais. É certo que não se vê nela uma vocação reformista. Mas, aí, vale a circunstância de não haver condições políticas para reformas, só possíveis com uma maioria absoluta e estável. Na Saúde, a situação é diferente. Ana Paula Martins é um cataclismo destruidor e não acerta uma. O setor está em pé de guerra, gasta cada vez mais e o caos alastra. Mesmo assim, a ministra ficou. A decisão do primeiro-ministro só pode ser interpretada como a desistência de encetar mudanças de fundo e de procurar um consenso à volta da Saúde, nomeadamente do SNS. Confrontado com os antecedentes de vários governos, cujos ministros da Saúde foram triturados sem terem apresentado resultados, levando a remodelações sucessivas, a opção possível para Montenegro é manter a fraca ministra, a sua desastrada equipa e ir gerindo os solavancos. Seria mais um problema ir ao mercado buscar outro governante destinado ao sacrifício. Há muito que não há à frente da Saúde alguém com visão, competência e coragem política. Concretamente, desde Paulo Macedo, agora instalado na cadeira de sonho do banco público.
2. Apesar do burburinho e da celeuma levantados pela existência de uma empresa imobiliária da família de Montenegro, é improvável que o caso tenha efeitos significativos. Desde logo porque Montenegro deixou de ser sócio assim que foi eleito líder do PSD. Tão pouco é de admitir que a nomeação de Silvério Regalado para o lugar de Hernâni Dias possa ter consequências, apesar de o novo secretário de Estado ter sido um dos dois únicos presidentes de câmara que contratou várias vezes o escritório de Montenegro num total de 200 mil euros. Regalado era o edil de Vagos e o outro era o de Espinho, que está a ser julgado num processo de corrupção quando dirigia a autarquia. Claro que as duas situações serão exploradas ao máximo, política e mediaticamente. E teria sido prudente ter convidado outra figura para ajudar o ministro Castro Almeida. Se é verdade que quem não deve não teme, também é certo que “não havia necessidade”. Já o caso da empresa familiar só será um problema sério se ela vier a intervir ou a beneficiar com a nova lei dos solos, o que seria um verdadeiro haraquíri político. Já basta assim.
3. Como era evidente o “casinho” da empresa da família Montenegro foi o pretexto para André Ventura saltar para arena. Ameaçou com uma moção de censura, se o primeiro ministro não desse explicações nesta segunda-feira, o que não aconteceu até à hora de mandar esta crónica. Para Ventura tudo serve para desviar as atenções da pedofilia, dos insultos a uma deputada deficiente, do ladrão de malas que agora põe a nu o que se passa no partido, do deputado açoriano agarrado bêbedo ao volante e de uma agressão com ameaça de morte entre dois dirigentes do partido. Isto para não falar da autarca trânsfuga do PSD que contratava a empresa do filho. Ventura sabe que esta avalanche de casos mina a sua credibilidade. Ao ponto de muitos elementos da nossa direita “neo-salazarista” já se mostrarem incomodados
4. Numa altura em que os assuntos de corrupção são cada vez mais mediatizados e que aumenta a perceção desse tipo de práticas, o PSD não arranjou mais nada do que tentar desastradamente encontrar forma de os políticos serem obrigatoriamente informados quanto à identidade de quem, pessoa ou instituição, consultou os dados patrimoniais que têm de declarar. De notar que os jornalistas são, e muito bem, os grandes escrutinadores desses elementos. As alterações desejadas preveem também que esses políticos e outros altos detentores de cargos públicos passem a dar ou não autorização para que os seus dados sejam automaticamente confirmados no fisco e notariado. A iniciativa é um retrocesso na transparência e um magnífico tiro no pé no caminho da credibilização da política. Quem opta por essa vida tem de sujeitar-se a um escrutínio, tanto do seu património pessoal, como das suas relações familiares e das suas opções de vida. Hoje, já nem a vida íntima é preservável para um simples cidadão, uma celebridade mediática ou desportiva, quanto mais um político. Há um mundo de oportunidades mais discretas fora dessa atividade altruísta. Por isso, não podemos andar a falar em seriedade e transparência e depois limitarmos acessos, como está à vista.
5. Alguns especialistas consideram que a Comissão Política Nacional do PSD ultrapassou as suas competências ao avocar as escolhas dos próximos candidatos autárquicos a Lisboa, na sequência do caso Tutti-Frutti. Recordam que no tempo de Rio o Conselho de Jurisdição do PSD rejeitou idêntico procedimento. Na altura, reafirmou que a elaboração das listas compete exclusivamente à comissão política de secção, cabendo à comissão política distrital a aprovação, enquanto a comissão política nacional apenas tem o poder de não homologar o nome do cabeça de lista à Câmara Municipal. Este entendimento foi confirmado pelo Tribunal Constitucional ao considerar que, a não ser assim, qualquer cidadão pode impugnar a avocação. Para evitar eventuais confusões e contestações futuras, o PSD deveria simplesmente convocar de imediato eleições para a concelhia de Lisboa. Há mais do que tempo para isso, visto que até há para mexer no mapa de freguesias.
6. Uma das piores práticas da política e das instituições públicas (e mesmo privadas) tem a ver com as chamadas portas giratórias, quando alguém sai de um lugar para logo ser colocado ou procurar outro. Fernando Gomes deixou a presidência da Federação de Futebol por limite de mandatos ou de idade. Para o substituir foi eleito Pedro Proença do qual pouco ou nada se espera, apesar do ordenado astronómico que a coisa proporciona e da instituição ser de utilidade pública. Quanto a Gomes está a tratar de se acoitar na presidência do Comité Olímpico Português onde não há limites para a permanência. O problema é que Fernando Gomes nunca mostrou a menor sensibilidade pelo futebol olímpico, o que talvez venha a beneficiar Laurentino Dias, um socialista ex-secretário de Estado do Desporto também interessado na função.
7. Não é só o modelo de gestão e de financiamento da RTP que causam perplexidade. Há também coisas estranhas na gestão editorial. Durante meses o canal público teve o posto de delegado nos Estados Unidos vago, embora se soubesse quem iria para lá. No caso, a jornalista Cândida Pinto que, entretanto, estava em trabalho na Ucrânia. Essa circunstância obrigou a deslocar pontualmente repórteres à América, impedindo os telespetadores habituais de acompanharem em continuidade o fenómeno de crescimento do MAGA, que reelegeu Trump. Se tudo isto já era estranho, o que dizer agora da decisão de enviar a correspondente em Washington à Ucrânia, a fim de acompanhar o terceiro aniversário da invasão russa? Essa opção deixa para trás a cobertura no local das delirantes e bélicas decisões de Trump, que podem até visar a deportação de portugueses. Provavelmente, quem ganha com isso é a TVI/CNN, servida pelo brilhante profissional Luís Costa Ribas.