Solução de Trump para Gaza gera polémica

Solução de Trump para Gaza gera polémica


As declarações do Presidente americano vêm quebrar um consenso generalizado de que a solução passaria pelo estabelecimento de dois estados na região.


Os ataques ocorridos a 7 de outubro de 2023 contra Israel, bem como a resposta do Estado judaico, mergulharam, mais uma vez, o sempre instável Médio Oriente num complexo conflito. O emaranhado de interesses subjacentes ao confronto entre Israel e o Hamas faz com que seja difícil vislumbrar uma solução a curto prazo para o território de Gaza e da Cisjordânia, criando um impasse que teima em ser quebrado.
Contudo, nos últimos tempos, e principalmente desde a nova eleição de Donald Trump, o xadrez geopolítico no Levante dá sinais de mudanças de fundo. Primeiro, o enviado especial do Presidente americano foi fundamental para que o acordo de cessar-fogo, proposto pela administração Biden no ano passado, entrasse em vigor. Com isto, vários reféns já voltaram a casa e o plano, até ao momento, parece estar a ser cumprido, independentemente da sua inerente fragilidade.

Uma nova solução
Durante esta semana, o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, esteve em Washington, D.C., para uma jornada de negociações que culminou na conferência de imprensa conjunta com Donald Trump. E foi precisamente durante a estada do líder do executivo israelita em solo americano que Trump anunciou uma nova solução para os palestinianos e para o território de Gaza. Como seria de esperar, as declarações do quadragésimo sétimo Presidente americano estão a ser alvo de duras críticas e a incerteza quanto ao “dia seguinte” aumenta.
A surpresa no discurso de Donald Trump deve-se principalmente à declaração de que os Estados Unidos poderiam ficar responsáveis pelo território de Gaza, numa operação que classifica importante «a longo prazo». «Seremos proprietários e responsáveis pelo desmantelamento de todas as bombas perigosas não deflagradas e de outras armas existentes no local», disse Trump aos jornalistas, garantindo que os EUA serão responsáveis ainda por criar «um desenvolvimento económico que proporcionará um número ilimitado de empregos e habitações para a população da região».
A solução de dois estados parece estar fora de questão para Trump, referindo que os países árabes da região, principalmente a Jordânia e o Egito, deveriam acolher a população de Gaza porque, segundo o líder americano, os habitantes do enclave «nunca tiveram uma oportunidade de vida porque a Faixa de Gaza tem sido um inferno para as pessoas que lá vivem. Tem sido horrível».

A nova Riviera?
A criação de condições favoráveis para o estabelecimento de um Estado palestiniano na Faixa de Gaza e na Cisjordânia tem sido a principal dificuldade da comunidade internacional e um dos grandes motivos, mas existe claramente uma convergência quanto à solução de dois estados, havendo divergências apenas nos meios para atingir esse fim. Trump tem uma visão diferente: «Não tem nada que ver com dois Estados, um Estado ou qualquer outro Estado. Significa que queremos dar às pessoas uma oportunidade de vida», disse também na conferência de imprensa, onde frisou ainda a oportunidade de tornar Gaza na «Riviera do Médio Oriente» que possa ser habitada «pelas pessoas do mundo».
Naturalmente, as reações não têm sido favoráveis, com muitos a acusarem o líder americano de limpeza étnica. Contudo, Donald Trump garante que não foi «uma decisão tomada de ânimo leve» e que reuniu várias opiniões favoráveis. «Toda a gente com quem falei adora a ideia de os Estados Unidos serem donos daquele pedaço de terra» porque seria uma forma de proporcionar uma «grande estabilidade a essa parte do Médio Oriente». O envio de tropas americanas para o território não foi descartado, com o líder da Casa Branca a garantir que fará «o que for necessário».

Confiança restabelecida
As tensões entre Netanyahu e o ex-Presidente Joe Biden eram cada vez mais nítidas. Se é certo que Israel nunca deixou de contar com o apoio americano, também é verdade que ambas as lideranças divergiam quanto à conduta do Estado judaico. Agora, com Donald Trump, a relação parece ter ganho uma nova vida, superando o desgaste anterior. O líder do gabinete de guerra israelita afirmou que Trump é «o melhor amigo que Israel alguma vez teve na Casa Branca» e agradeceu pelas ideias «fora da caixa» e pela demonstração de «vontade de perfurar o pensamento convencional». Quanto à ideia do presidente americano para o futuro de Gaza, Netanyahu acredita que é algo que «pode mudar a história».
Trump planeia visitar Gaza, a Cisjordânia e a Arábia Saudita, mesmo que o executivo saudita já tenha deixado claro que rejeita a solução de expulsar os palestinianos «da sua terra». Quanto à rejeição do plano de Trump, juntaram-se à Arábia Saudita países como a Turquia, Reino Unido, Alemanha, França, Espanha, Irlanda, Austrália, Brasil, Rússia e China, para além dos principais visados Jordânia e Egito.
Desta forma, a incerteza sobre o futuro da região acentua-se a cada dia, e as ideias de Trump, apoiadas por Netanyahu, quebram o consenso generalizado da solução de dois estados. Assim, resta aguardar por mais desenvolvimentos nesta zona do globo constantemente marcada por conflitos sangrentos ao longo da história.