O Bloco de Esquerda (BE) está envolto em polémica depois da notícia avançada pela Sábado esta terça-feira de que o partido terá despedido, entre 2022 e 2024 cinco mulheres que tinham sido mães recentemente. Uma delas tinha um bebé de dois meses, duas estavam nos quadros e, para contornar a lei, o partido ter-lhes-ia dado contratos a prazo sem funções, para que o ‘salário’ servisse de indemnização. O caso ganhou especial relevância, tendo em conta a aparente contradição com os valores assumidos pelo partido de esquerda, conhecido pela defesa dos direitos das mulheres e da legislação laboral para grávidas, puérperas e lactantes.
O Bloco de Esquerda nega as acusações e já apresentou queixa à Entidade de Regulação da Comunicação Social. «O texto da Sábado sobre alegados despedimentos no Bloco de Esquerda é um ataque político que dispensou o jornalismo e a verificação de factos. Cita cinco ‘despedimentos’, um dos quais o de uma pessoa que – a própria notícia o reconhece – trabalha no Bloco de Esquerda até hoje. Outros dois casos são relativos a contratos cessados automaticamente pelo Parlamento Europeu no final dos mandatos de José Gusmão e Marisa Matias, como acontece com todos os contratos de todos os assistentes parlamentares europeus no final dos mandatos», lê-se na carta enviada à ERC.
Por outro lado, uma das trabalhadoras dispensadas utilizou a rede social X para defender a sua versão. Ao Nascer do Sol, Érica pede que o seu apelido não seja referido e que não quer «continuar a lavar roupa suja». «Tudo o que tenho para dizer disse-o aqui e mantenho-o por ser verdade», garante. Pouco tempo depois, apagou a conta nesta rede social.
«Sou a trabalhadora com uma filha de nove meses despedida pelo Bloco de Esquerda em 2022. Fui despedida por telefone enquanto estava a trabalhar na sede nacional», começa por contar, aproveitando para corrigir aquela que considera uma imprecisão do artigo da Sábado: «Não fomos substituídas pela namorada de nenhum dirigente».
Segundo Érica, das seis pessoas da «equipa de redes», ficaram apenas três. «Decidiram extinguir os postos de trabalho de um homem, uma mulher a amamentar a filha de nove meses e uma mulher em licença de maternidade com um filho de dois meses. Ficaram um homem e duas mulheres sem filhos, com toda a disponibilidade», desabafa.
«As recém-mães não podem viajar, não trabalham 60 horas por semana, não apagam fogos às 23h ou ao domingo, não respondem de imediato às mensagens e e-mails. As recém-mães têm limitações e é por isso que existem leis que as protegem, leis que o Bloco de Esquerda defende».
Refere que «todo o processo de despedimento coletivo foi mal gerido» e critica o silêncio das «feministas do Bloco».
Ex-deputado municipal alega ter sido despedido por videochamada
Com o caso dos despedimentos abre-se uma caixa de Pandora e surgem cada vez mais denúncias de ex-militantes bloquistas que alegam tratamentos abusivos por parte do partido.
Diego Garcia, antigo deputado municipal e, por duas vezes, cabeça de lista do Bloco de Esquerda à Assembleia Municipal de Carregal, foi um dos que utilizou a rede social X para trazer a público o despedimento de que foi alvo, após seis anos ao serviço do partido.
«Comecei a ser militante do Bloco em 2015/2016, por iniciativa própria. Um ano depois deixei os estudos na universidade porque eram incompatíveis com a cultura que certos colegas me tentavam impor: sempre disponíveis, sem tempo para férias, nem para estudar, nem para nada», começa por contar.
«Prontamente perceberam que não era manipulável e começou o meu afastamento propositado, as mentiras e as jogadas de bastidores. Basicamente, comecei a sentir que era descartável por não alinhar em certas coisas».
Diego alega que, em final de 2021, chegaram a “proibi-lo” de gozar umas férias já marcadas e pagas, para dois meses depois ser «descartado».
«Fui despedido através de uma videochamada de dois minutos e nunca tive contacto com ninguém, além de uma pessoa que trabalha para o Esquerda net», desabafa. «Sinto mesmo que me espremeram até não dar mais e, à mínima, rua».
«Infelizmente é um partido de amigos para amigos. Vivem entre o bolhismo e o caciquismo. Alinhas ou és colocado de lado. Os despedimentos que praticam é só o última respiração de um partido em declive», critica o ex-deputado municipal.
O Nascer do Sol entrou em contacto com o Bloco de Esquerda para pedir esclarecimentos sobre o caso, mas não foi possível obter qualquer resposta.