Caso de David Sánchez envolve anterior Governo português

Caso de David Sánchez envolve anterior Governo português


O círculo íntimo de Pedro Sánchez volta a estar na ordem do dia em Espanha, Desta vez, um caso com o irmão que tem a sua atividade laboral, possível fuga ao fisco e tráfico de influências sob investigação. No meio de todo o enredo, nem o antigo Governo de Costa escapa


O Governo socialista espanhol, liderado por Pedro Sánchez, tem estado debaixo de fogo após vários escândalos. Trata-se de um executivo sustentado por uma maioria contranatura no Parlamento, dependendo de votos de partidos separatistas catalães, os quais consegue em troca de concessões como a amnistia aos responsáveis pelo processo ilegal de independência em 2017. Para além disto, vários casos de corrupção têm abalado os alicerces dos socialistas, sendo que dois envolvem diretamente a família do Presidente do Governo.
O “Caso Koldo”, que carrega o nome de Koldo García, ex-assessor do ex-ministro dos Transportes, Mobilidade e Agenda Urbana, José Luis Ábalos, caiu como uma bomba na política espanhola, com o próprio Sánchez a ser forçado a emitir um pedido de desculpas, sem mais consequências. «É um caso de corrupção que lamento e peço desculpas», disse, à data, o chefe do executivo. Na mesma semana, o diário espanhol ABC noticiou que o procurador-geral espanhol, Álvaro García Ortiz, foi o «primeiro da democracia a ser acusado de pelo Supremo Tribunal por alegada divulgação de segredos no caso do namorado de Ayuso». Isabel Díaz Ayuso é a Presidente da Comunidade Autónoma de Madrid e uma das grandes caras do Partido Popular, o vencedor das últimas eleições legislativas que não conseguiu apoio parlamentar para formar governo.
Também o caso de Begoña Gómez, esposa do primeiro-ministro, em maio do ano passado, fez correr tinta, deixando o Governo periclitante, com o próprio Sánchez a anunciar um período de reflexão de cinco dias, não tendo sido descartada a demissão. Gómez foi alvo de investigações por casos de corrupção, tráfico de influências e apropriação indevida, tendo sido acusada por uma alegada angariação de fundos públicos que seriam canalizados para empresas privadas. Begoña continua sob investigação.

Um gabinete fantasma
O mais recente caso envolve também a família próxima de Sánchez, desta feita o irmão. David Sánchez, músico, detinha o cargo de Coordenador de Atividades Musicais dos Conservatórios na Diputación de Badajoz, passando, posteriormente a ostentar a posição de Chefe de Gabinete de Artes Cénicas. A questão do salário, que ronda os 54 mil euros e é «superior ao de outros cargos similares que também foram aprovados no mesmo dia, como o de Chefe de Gabinete de Avaliação de e Processos de Políticas Públicas e o de Chefe de Gabinete de Promoção Turística, ambos com [salários] de 49831 euros», noticiou o OkDiario, é, por si, suspeita. Ainda assim, foi precisamente a alteração de posto que colocou David Sánchez na mira da Justiça espanhola, tendo sido alvo de investigações e acusado de «várias infrações contra a Administração Pública e o Tesouro», avançou o mesmo jornal.
Mas o escândalo não fica por aqui. Numa audiência recente, o músico apresentou claras dificuldades em explicar a sua atividade laboral, a localização do gabinete e até em identificar as pessoas com quem trabalha, alimentando ainda mais as dúvidas que sobre ele recaíam. «Vejamos», respondeu David Sánchez à magistrada Beatriz Biedma, que perguntou no que consistia o Gabinete, «eu entendo que é o gabinete responsável pelas… não sei, pelas artes do espetáculo». «Onde se situa, quem é o responsável, o que faz?», continuou a Biedma, ao que Sánchez respondeu, de forma hesitante, «Bem, é o espaço onde continuo com a atividade que tenho vindo a desenvolver desde que entrei para a Diputación em 2017». Mas a resposta mais caricata vem quando a magistrada perguntou onde se situa o gabinete: «Bem, não lhe sei dizer, vá lá, imagino que seja no gabinete onde estou agora», disse o músico, que é alvo de investigação por tráfico de influência, peculato e prevaricação.
Todo este processo vem na sequência de um ano de ausência do irmão de Pedro Sánchez, que voltou com as regalias já descritas, podendo ainda acumular outras funções com o cargo de empregado público.
«Verificou-se que em nenhum momento se menciona a necessidade de criar um posto para desempenhar funções de coordenação dos conservatórios da Diputación», conclui uma investigação levada a cabo pela Unidade Central Operativa da Guarda Civil espanhola. «A Guardia Civil salienta em especial», reportou o OkDiario, «o facto de ter autorizado a criação do posto para o irmão do Presidente do Governo apenas seis dias depois de o Presidente da Diputación ter afirmado que estava a ser solicitado “muito pessoal”, em referência a outros pedidos de reforço dos efetivos. Os funcionários salientam igualmente a urgência sem precedentes da criação do lugar».

O envolvimento português
Mesmo sendo um caso que afeta diretamente o Governo de Pedro Sánchez, o escândalo não é exclusivo ao país vizinho. O anterior Governo português, liderado por António Costa, também está envolvido no enredo que remonta a 2022. O irmão de Sánchez estava a cargo de um projeto, relacionado com a ópera, que teria um orçamento de três milhões de euros. Por se tratar de um programa que seria levado a cabo na zona transfronteiriça, entre Elvas e Badajoz, seria necessária a colaboração portuguesa, tendo o músico espanhol recorrido ao então Chefe de Gabinete do primeiro-ministro português, Vítor Escária, avançou a Sic Notícias. Escária terá indicado a OPART, uma empresa pública portuguesa que detém a tutela da Companhia Nacional de Bailado, estando também o Ministério da Cultura envolvido, segundo e-mails conseguidos pela imprensa espanhola.
As investigações de fuga ao fisco passam também por território português, com o irmão de Sánchez a apresentar residência fiscal em Elvas. Já a suspeita de enriquecimento ilícito vem na sequência de um aumento de 550% no património líquido do músico em apenas três anos.
Assim, o Governo de Sánchez está a braços com mais um escândalo no círculo íntimo do primeiro-ministro, contando ainda com a presença do anterior Governo português, cujo intermediário, Vítor Escária, foi alvo de uma investigação que levou à queda do Governo de António Costa, agora Presidente do Conselho Europeu.