Jacques Roubaud. O poeta que morreu a desenhar o círculo

Jacques Roubaud. O poeta que morreu a desenhar o círculo


1932-2024. O poeta francês morreu no dia em que completou 92 anos.


Poeta e matemático, assim se definia Jacques Roubaud, que morreu esta quinta-feira, no exato dia em que cumpriu 92 anos. E esta coincidência das datas parece um último gracejo, o fechar de um círculo, como se fosse possível apanhar a morte como um comboio. Representante do coletivo literário l’OuLiPo, sempre fez questão de assinalar como os seus teoremas e os seus axiomas constituíram a base de uma obra poética simultaneamente erudita e lúdica, comovente e límpida.

Autor prolífico, traduzido em várias línguas, recebeu o Prémio Goncourt de Poesia de 2021 pelo conjunto da sua obra, e combinando o sentimento e a razão, foi sempre explorando a forma, tendo inventado o ‘tridente’, uma forma poética de três linhas ainda mais concisa do que o haiku, ou que o ‘joséfine’, o ‘mongine’, formas particulares de permutações matemáticas.

«A morte é a pluralidade obrigatória», escreveu Jacques Roubaud em Alguma Coisa Negro, livro com que assinala uma perda decisiva, a segunda, depois de duas décadas antes ter chorado a morte de um irmão. Neste caso, regista todo o processo que lhe permitiu ir saindo literal e retoricamente da afasia que o engoliu depois da morte de Alix Cléo Roubaud, com apenas 31 anos, 20 anos mais nova, fotógrafa de origem canadiana, asmática, vítima de embolia pulmonar. Foi uma maneira de dizer o luto, de reinventar no luto uma possibilidade de poesia, ainda que o tenha feito a partir da sua negação. «O registo rítmico da palavra causa-me horror./ Não consigo abrir um só livro que contenha poesia./ As horas do entardecer devem ser aniquiladas./ Quando acordo faz escuro: sempre./ Refugiei-me nas centenas de manhãs negras./ Leio prosa que seja inofensiva./ As assoalhadas ficaram na mesma: as cadeiras, as paredes,/ as persianas, as roupas, as portas./ Fecho as portas como se.»

Nascido a 5 de dezembro de 1932 em Caluire, perto de Lyon, o seu pai era filósofo e a sua mãe anglicista, ambos comunistas, ambos membros da Resistência. No final da II Guerra, deixam Carcassonne e vão para Paris, onde o pai é chamado a participar na Assembleia Consultiva Provisória de 1944. Nesse mesmo ano, com apenas 12, Roubaud estreia-se com Poésies juvéniles, que testemunha a sua paixão precoce pela leitura, pela poesia e pelos números: o verso contado e rimado satisfazia então estas três paixões.