Sabemos o quão difícil, senão mesmo impossível, é cruzarmo-nos, pessoal ou profissionalmente, com um verdadeiro psicopata.
No entanto, desenganem-se os mais otimistas e até os mais crentes, pois tal pode mesmo acontecer. Deste modo, à cautela, recomendo a todos que estejam preparados e devidamente capacitados, pois quando esse derradeiro momento chegar (se é que já não chegou), será mais fácil sobreviverem.
Na escola dos nossos filhos, no emprego em que passamos grande parte da nossa vida, no ginásio onde vamos perder os quilos que já não suportamos, no nosso grupo de tertúlia onde discutimos as últimas das eleições americanas, ou mesmo nas reuniões de administração do nosso condomínio marcadas tantas vezes a desoras, esses psicopatas podem aparecer quando menos se espera e serem destrutivos ao ponto de nos esmagarem, sem apelo nem agravo, e nos deixarem, assim, numa situação de grande fragilidade, para mais quando se exibem investidos em posições de autoridade.
É, aliás, essa particular circunstância, que torna o psicopata ainda mais perigoso e merecedor de uma maior atenção e vigilância por parte de todos aqueles que por ele sejam (ou possam vir a ser) potencialmente afetados.
Neste plano, um dos mais interessantes estudos que até hoje se produziram sobre o tema, da autoria de Paulhus e Williams do Departamento de Psicologia da Universidade de Columbia, encontramos a designada “tríade negra”, integrando três importantes características.
Assim, o primeiro elemento, seguindo os melhores ensinamentos de Nicolau Maquiavel, é o que se liga à ideia de que os fins justificam os meios, tudo valendo, desde manipulações, maquinações interpessoais e, sobretudo, uma elevada indiferença moral e ética relativamente aos que o rodeiam.
A esse maquiavelismo soma-se uma segunda dimensão, não menos preocupante, de narcisismo que, como todos sabemos, deve a sua origem à intrigante personagem da mitologia grega, Narciso de seu nome, que morre porque, pasme-se, se apaixona profundamente por si próprio, trazendo o pior que em si se encerra, desde uma insuportável arrogância, passando por uma aguda mania de grandeza e culminando num egocentrismo doentio que procura obter, exasperada e incessantemente, o reconhecimento dos que o rodeiam.
Por fim, e talvez a mais obscura de todas as características da tríade negra, é a que traz para a equação uma certa dose de psicopatia, a qual se revela em coisas tão triviais, como não sentir qualquer empatia pelo outro, antes pelo contrário, atuando num quadro de elevada impulsividade, manipulação e de inusitada e desproporcionada agressividade.
Se é verdade que todos e cada um de nós até pode ter um bocadinho de cada uma dessas coisas, tal não constituirá qualquer motivo de preocupação, contanto, note-se, que em doses moderadas.
Porém, como em tudo na vida, se essas características existirem em doses elevadas, então é caso para redobramos a atenção, dado que nesse caso estaremos, sem dúvida, diante de pessoas que se movem pelo mal, que não só infligem às organizações que lideram (ou que supostamente deveriam liderar), como a todos aqueles que se atravessam no seu caminho. Nesse caso, os psicopatas, sobretudo quando em posições de poder e de autoridade, utilizam uma espécie de charme superficial, conversando e seduzindo e conseguindo até o mais improvável: que as pessoas gostem deles e, mais grave ainda, que neles confiem.
Creiam-me, tudo pura ilusão.
São maniqueístas profissionais, verdadeiros mestres do disfarce e da arte do engodo, qual aranha formiga de patas negras, que como sabemos, mais parece uma formiga, precisamente para evitar ser comida por aranhas e para poder, ela própria, comer outras aranhas. Quem se cruza com estes psicopatas, para mais quando estes se encontram investidos em posições de poder e de autoridade, fica aparentemente deslumbrado, tal a simpatia e cordialidade com que eles se apresentam e se relacionam com os que os rodeiam.
A sua mais letal e eficaz arma passa por desenvolver autênticas estratégias de manipulação e de chantagem com todos os que com eles se relacionam, sobretudo sobre os níveis hierarquicamente inferiores e, como tal, expostos a um quadro de maior vulnerabilidade, o que leva estes últimos, na maior da parte das vezes, a desguarnecer ou a baixar a guarda, abrindo espaço ao ataque sem possibilidade de qualquer defesa.
Seria útil, nesta medida, ponderar e repensar os procedimentos de recrutamento e seleção dos altos cargos da nossa administração, introduzindo, com caráter obrigatório e eliminatório, para lá dos métodos já legalmente previstos, uma espécie de fase psicológica, que poderia passar, com as devidas adaptações, por um questionário como aquele que se conhece das «Doze Infames» (Dirty Dozen) no que poderia, sem dúvida, constituir um modo expedito, cientificamente seguro e de relativa confiabilidade, de medir se a mente de uma pessoa candidata a um cargo de alta direção encerra, em si mesma, sinais de tríade negra.
Talvez pudéssemos, por essa via e de forma absolutamente confiável e transparente, mitigar o risco de escolha de lideranças tóxicas que, como todos bem sabemos e não podemos ignorar, em lugar de servirem as organizações para que são designados, se servem das organizações para seu próprio benefício.