Gouveia e Melo Baralha contas para Belém

Gouveia e Melo Baralha contas para Belém


Presidenciais já ‘mexem’ nos partidos e não só. Rui Moreira e Carlos Carreiras admitem que ‘almirante das vacinas’ pode ‘baralhar as contas’ de outros potenciais candidatos.


Gouveia e Melo termina em dezembro o seu mandato como chefe do Estado Maior da Armada (CEMA), o Governo de Luís Montenegro pode decidir prorrogar o mandato por mais dois anos, mas resta saber se essa é mesmo a vontade do almirante das vacinas.

Gouveia e Melo, que assumiu a chefia da Marinha em dezembro de 2021, tem vindo a ser insistentemente falado como potencial candidato à Presidência da República. A sua popularidade, conquistada durante a pandemia, ao coordenar a vacinação dos portugueses, catapultou este, até então, desconhecido militar, numa das personalidades mais populares entre os portugueses.

Agora que se aproxima o fim do mandato de Marcelo Rebelo de Sousa, avolumam-se os comentários sobre uma possível candidatura. O próprio nunca a desmentiu, e, à medida que a data para uma tomada de decisão se aproxima, Gouveia e Melo prefere deixar tudo em aberto.

Em entrevista ao Nascer do SOL em abril passado, o almirante afirmou: «Um militar, fora do ativo, tem tanto direito a concorrer a um cargo político como um pescador ou um jurista», para sublinhar que não abdica dos seus direitos cívicos e políticos.

Esta semana, em entrevista ao Portugal Amanhã – publicação da Newsplex distribuída com o Nascer do SOL –, volta a reafirmá-lo.

À pergunta sobre se admite ter um outro papel como cidadão na sociedade portuguesa, Gouveia e Melo responde: «Não sei o que é que vai ser o meu futuro». Na mesma entrevista, o almirante deixa tudo em aberto quanto a uma possível participação política, reiterando que não abdica dos seus direitos civis e políticos: «Os militares, quando entram nas Forças Armadas, têm algum contrato que diz que quando passam à reforma ou à reserva não podem fazer mais nada da vida? Em que outra profissão é exigido isso? Ou temos um sinal na testa, que nos metem um ferro na testa, a dizer ‘impróprio para consumo’? Não. O militar, quando acaba a sua atividade, naturalmente tem a liberdade toda que não tem enquanto militar no ativo. (…) Eu não disse nada sobre o que quero ou deixo de querer no futuro. Só estou a dizer o óbvio. Porquê? Porque tentou-se criar a ideia de que os militares não podem participar no espectro político. Não, não podem participar enquanto estiverem no ativo. Depois de saírem do ativo são cidadãos como outros cidadãos quaisquer, sem restrições. Não podemos aceitar ficar com uma marca na testa a dizer impróprio para consumo. Porque isso é uma menorização e isso é que é verdadeiramente antidemocrático».

São muitos os que informalmente têm insistido junto de Gouveia e Melo para que arrisque uma candidatura a Belém.

Algumas destas personalidades são políticos e têm-se disponibilizado para ajudar a dar corpo à candidatura. É, aliás, entre estes que mais se discute a estratégia a adotar e a maioria inclina-se para um anúncio de candidatura mais perto das eleições que se realizam em janeiro de 2026. Ao que foi dito ao Nascer do SOL, «ele não precisa de anunciar a candidatura com muita antecedência, nesse aspeto assemelha-se a Marcelo quando se candidatou pela primeira vez, era muito popular na rua, não precisava de estar no terreno com muita antecedência». O mesmo apoiante de uma candidatura de Gouveia e Melo garante-nos que o almirante é muito popular onde quer que vá e, para quem o acompanha, é frequente ver e ouvir muitas pessoas que se aproximam do homem que coordenou o processo de vacinação durante a pandemia, agradecendo-lhe o que fez pelos portugueses e incentivando-o a avançar para a presidência.

O problema é que a maior parte da classe política, incluindo Marcelo Rebelo de Sousa, não vê com bons olhos que a chefia de Estado volte a ficar nas mãos de um militar e encara essa possibilidade como um retrocesso na democracia portuguesa. Será também por isso que o Governo admite seriamente convidar o almirante para prorrogar o mandato por mais dois anos, inviabilizando assim a possibilidade de uma candidatura.

Entre os apoiantes de Gouveia e Melo a opção é clara: o almirante deve mostrar que não está disponível para mais dois anos à frente da Armada e isso precipitará o anúncio de uma candidatura mais cedo do que estava previsto.

Gouveia e Melo baralha contas

O tema das presidenciais é um dos assuntos fortes do próximo ano político. Apesar de as eleições estarem marcadas para janeiro do ano seguinte, os candidatos começam a posicionar-se logo a partir do início de 2025. Direita e esquerda já discutem sobre nomes para Belém, mas, nas várias discussões, há sempre uma incerteza: vai ou não Gouveia e Melo candidatar-se? É uma informação crucial para a tomada de decisão dos vários setores políticos e até dos próprios candidatos.

Na opinião de Rui Moreira, presidente da Câmara do Porto ouvido pelo Nascer do SOL, a entrada de Gouveia e Melo na corrida presidencial pode ‘baralhar as contas’: «Acho que pode vir a baralhar os cenários que os partidos estão a pensar, porque ele não é verdadeiramente identificado pelo eleitorado e pode introduzir aqui uma variação curiosa, vamos ver, é no fundo um joker eleitoral».

O caráter apartidário do almirante e a sua popularidade junto dos portugueses pela forma como levou a bom porto a tarefa de vacinar a população, permitindo assim o regresso à vida normal depois de longos confinamentos, conferiu-lhe uma imagem difícil de combater por outros candidatos. Se em sondagens anteriores Gouveia e Melo surgia como candidato preferido, agora, os estudos mais recentes mostram menores índices de popularidade, mas os defensores desta candidatura argumentam que tal facto se deve à hipótese de uma candidatura ser neste momento mais longínqua: «Gouveia e Melo tem grandes hipóteses de crescimento e consegue congregar votos à esquerda e à direita».

Carlos Carreiras, presidente da Câmara de Cascais, tende a concordar com esta ideia: «Se eu tivesse de meter as fichas, podemos ter aqui uma regressão histórica e voltar a ter aqui um militar. Se for Gouveia e Melo contra Centeno, aí o Gouveia e Melo tem uma passadeira estendida, o Gouveia e Melo a meu ver entre muito à esquerda também à direita».