O PRR de D. Afonso Henriques


D. Afonso Henriques definiu objectivos e modelos de gestão que assegurassem realizações perenes, penhor da salvação da sua alma na eternidade, enquanto António Costa foi distribuindo dotações pelos organismos estatais que melhor servissem a sua clientela política…


O título pode merecer algum sorriso, mas facto é que, conquistada a independência e estabilizadas as fronteiras a Sul, D. Afonso Henriques começou a pensar em políticas que servissem as necessidades da população e diga-se, pudessem vir em “benefício da minha alma depois da minha morte”, como estabelece no seu testamento. Para tal, decidiu “repartir certa parte da minha fortuna”, uma dotação equivalente a mais de 500 quilos de ouro, segundo alguns historiadores. Servindo de aval à sua salvação eterna, tem toda a razão José Hermano Saraiva quando diz que o nosso primeiro rei assim criou o primeiro plano de investimentos, no século XII, como adiante se verá.

Rezam as crónicas que D. Afonso Henriques era muito rico. Confundindo-se com o tesouro do Estado, a sua fortuna ia aumentando com os fartos “lucros líquidos” das conquistas, em que o recrutamento e custos das “hostes” eram no geral suportados pela nobreza, fidalgos e ordens militares. Por isso, pôde pagar o seu resgate de Badajoz, onde ficou prisioneiro em 1169, entregando ao Rei de Leão 2680 quilos de ouro, e dotar uma filha no seu casamento com o Conde de Flandres com um navio cheio de ouro, bordados e panos de seda. Ao contrário de agora, o rei não precisava de esquemas ínvios para esconder a utilização dos dinheiros públicos…

Mas indo ao que interessa, mais que um plano de investimentos, o testamento de D. Afonso Henriques assume a natureza de um verdadeiro PRR, aliás mais avançado de que o de António Costa. Em ambos os casos, os fundos provieram do exterior, agora, da União Europeia e, nesse tempo, dos despojos das conquistas e das periódicas incursões em povoações e cidades mouras, traduzidos em cereais, gados e ouro. Mas um PRR mais inovador nos seus propósitos, para além de dispensar qualquer componente a cargo dos contribuintes.

É que D. Afonso Henriques definiu objectivos e modelos de gestão que assegurassem realizações perenes, penhor da salvação da sua alma na eternidade, enquanto António Costa foi distribuindo dotações pelos organismos estatais que melhor servissem a sua clientela política, tornando-a a maior beneficiária dos fundos, visando primordialmente a salvação do seu ciclo de poder terreno e esquecendo o futuro.

Ao contrário, D. Afonso Henriques definiu com precisão os fins a atingir, defesa do território, fixação de populações nas áreas conquistadas, apoio a obras públicas e até assistência social, valendo-se, não da nobreza ou do funcionalismo que servia a coroa, mas das mais credíveis instituições da sociedade civil e religiosa à altura existentes, as Ordens Militares, os Mosteiros e os Bispados, com vista a melhor realizar esses objectivos.

Para defesa do território e obras de consolidação de fortalezas, envolvendo o fornecimento de equipamentos, bens e serviços por parte de artífices e camponeses, foram destinados 17000 maravedis, a ser administrados pelas Ordens Militares do Hospitalários, de Calatrava e de Avis, esta exclusivamente para defesa da cidade de Évora.

Para acções de desenvolvimento, cultivo das terras conquistadas, promoção de povoamento e fixação de populações, assistência, beneficência e cuidados e saúde através das boticas conventuais, foram destinados 3210 maravedis aos Mosteiros de Alcobaça e de Santa Cruz em Coimbra e a este também todos os prisioneiros, cavalos e azémolas que tiver à minha morte…

Para obras públicas foram destinados 7500 maravedis, dos quais 3000 para uma ponte sobre o Douro, a cargo do Convento de S. João de Tarouca, e o restante para financiar os trabalhos no nascente Mosteiro de Alcobaça e em igrejas de Lisboa, Évora, Coimbra, Porto, Braga, Viseu e Lamego.

Também a construção de novos hospitais (abrigos para viajantes com alguma assistência) em Guimarães, Santarém e Lisboa foi dotada com 260 maravedis.

Para apoio aos pobres e acção social, fixando populações, foram destinados 5000 maravedis, a cargo dos Bispados de Lisboa, Porto, Santarém, Braga e Tui, que o Rei dizia pertencer-lhe.

O PRR real beneficiou muitos estratos sociais, burgueses, agricultores e artífices das mais diversas profissões, com óbvia influência no bem-estar das populações. Mas, para além do benefício imediato, as realizações do PRR de D. Afonso Henriques tornaram-se perenes. Alcobaça, Santa Cruz de Coimbra, Tomar, as fortalezas conservadas atraem visitantes e dão vida e riqueza às localidades. S. Vicente de Fora não existiria porventura sem a igreja que lhe deu origem.

Quanto ao PRR de António Costa, repleto de custos correntes e vazio de futuro, o resultado será tão efémero como a duração dos consumíveis em que se traduziu. Nada ficará para recordar. Mas é óbvio que o seu autêntico PRR foi outro, o de presidente do Conselho Europeu, em Bruxelas, e aí foi eficaz.

Nota: Que D. Afonso Henriques me perdoe se não interpretei bem o seu PRR.


O PRR de D. Afonso Henriques


D. Afonso Henriques definiu objectivos e modelos de gestão que assegurassem realizações perenes, penhor da salvação da sua alma na eternidade, enquanto António Costa foi distribuindo dotações pelos organismos estatais que melhor servissem a sua clientela política...


O título pode merecer algum sorriso, mas facto é que, conquistada a independência e estabilizadas as fronteiras a Sul, D. Afonso Henriques começou a pensar em políticas que servissem as necessidades da população e diga-se, pudessem vir em “benefício da minha alma depois da minha morte”, como estabelece no seu testamento. Para tal, decidiu “repartir certa parte da minha fortuna”, uma dotação equivalente a mais de 500 quilos de ouro, segundo alguns historiadores. Servindo de aval à sua salvação eterna, tem toda a razão José Hermano Saraiva quando diz que o nosso primeiro rei assim criou o primeiro plano de investimentos, no século XII, como adiante se verá.

Rezam as crónicas que D. Afonso Henriques era muito rico. Confundindo-se com o tesouro do Estado, a sua fortuna ia aumentando com os fartos “lucros líquidos” das conquistas, em que o recrutamento e custos das “hostes” eram no geral suportados pela nobreza, fidalgos e ordens militares. Por isso, pôde pagar o seu resgate de Badajoz, onde ficou prisioneiro em 1169, entregando ao Rei de Leão 2680 quilos de ouro, e dotar uma filha no seu casamento com o Conde de Flandres com um navio cheio de ouro, bordados e panos de seda. Ao contrário de agora, o rei não precisava de esquemas ínvios para esconder a utilização dos dinheiros públicos…

Mas indo ao que interessa, mais que um plano de investimentos, o testamento de D. Afonso Henriques assume a natureza de um verdadeiro PRR, aliás mais avançado de que o de António Costa. Em ambos os casos, os fundos provieram do exterior, agora, da União Europeia e, nesse tempo, dos despojos das conquistas e das periódicas incursões em povoações e cidades mouras, traduzidos em cereais, gados e ouro. Mas um PRR mais inovador nos seus propósitos, para além de dispensar qualquer componente a cargo dos contribuintes.

É que D. Afonso Henriques definiu objectivos e modelos de gestão que assegurassem realizações perenes, penhor da salvação da sua alma na eternidade, enquanto António Costa foi distribuindo dotações pelos organismos estatais que melhor servissem a sua clientela política, tornando-a a maior beneficiária dos fundos, visando primordialmente a salvação do seu ciclo de poder terreno e esquecendo o futuro.

Ao contrário, D. Afonso Henriques definiu com precisão os fins a atingir, defesa do território, fixação de populações nas áreas conquistadas, apoio a obras públicas e até assistência social, valendo-se, não da nobreza ou do funcionalismo que servia a coroa, mas das mais credíveis instituições da sociedade civil e religiosa à altura existentes, as Ordens Militares, os Mosteiros e os Bispados, com vista a melhor realizar esses objectivos.

Para defesa do território e obras de consolidação de fortalezas, envolvendo o fornecimento de equipamentos, bens e serviços por parte de artífices e camponeses, foram destinados 17000 maravedis, a ser administrados pelas Ordens Militares do Hospitalários, de Calatrava e de Avis, esta exclusivamente para defesa da cidade de Évora.

Para acções de desenvolvimento, cultivo das terras conquistadas, promoção de povoamento e fixação de populações, assistência, beneficência e cuidados e saúde através das boticas conventuais, foram destinados 3210 maravedis aos Mosteiros de Alcobaça e de Santa Cruz em Coimbra e a este também todos os prisioneiros, cavalos e azémolas que tiver à minha morte…

Para obras públicas foram destinados 7500 maravedis, dos quais 3000 para uma ponte sobre o Douro, a cargo do Convento de S. João de Tarouca, e o restante para financiar os trabalhos no nascente Mosteiro de Alcobaça e em igrejas de Lisboa, Évora, Coimbra, Porto, Braga, Viseu e Lamego.

Também a construção de novos hospitais (abrigos para viajantes com alguma assistência) em Guimarães, Santarém e Lisboa foi dotada com 260 maravedis.

Para apoio aos pobres e acção social, fixando populações, foram destinados 5000 maravedis, a cargo dos Bispados de Lisboa, Porto, Santarém, Braga e Tui, que o Rei dizia pertencer-lhe.

O PRR real beneficiou muitos estratos sociais, burgueses, agricultores e artífices das mais diversas profissões, com óbvia influência no bem-estar das populações. Mas, para além do benefício imediato, as realizações do PRR de D. Afonso Henriques tornaram-se perenes. Alcobaça, Santa Cruz de Coimbra, Tomar, as fortalezas conservadas atraem visitantes e dão vida e riqueza às localidades. S. Vicente de Fora não existiria porventura sem a igreja que lhe deu origem.

Quanto ao PRR de António Costa, repleto de custos correntes e vazio de futuro, o resultado será tão efémero como a duração dos consumíveis em que se traduziu. Nada ficará para recordar. Mas é óbvio que o seu autêntico PRR foi outro, o de presidente do Conselho Europeu, em Bruxelas, e aí foi eficaz.

Nota: Que D. Afonso Henriques me perdoe se não interpretei bem o seu PRR.