A Comissão Europeia não tem hipótese de controlar as verbas que são atribuídas aos fundos europeus. Quem o diz é João César das Neves, depois de o Tribunal de Contas Europeu ter referido que os controlos das despesas por parte da Comissão Europeia e dos próprios Estados-membros são «fracos», uma acusação que imediatamente foi refutada por Bruxelas. «O Tribunal de Contas faz uma acusação sensata, que a Comissão e os Estados-membros não conseguem realmente refutar, por muito que o digam, até porque não têm a menor hipótese de realizar esse controle, não apenas por causa da dimensão, mas sobretudo pela sua pulverização ao longo de todos os países da Europa, muito diversificados», salienta.
Também ao nosso jornal, Paulo Monteiro Rosa, economista sénior do Banco Carregosa, lembra que «mais uma vez é clara a divergência entre várias instituições». Recorde-se que, de acordo com o relatório do Tribunal de Contas Europeu, «continuam a existir grandes erros nas despesas da política de coesão, cujo objetivo é reduzir as diferenças sociais e económicas» nos países da União Europeia (UE). E aponta o dedo:_«Por um lado, as autoridades dos Estados-membros podem detetar mais erros, e mesmo evitá-los. Por outro, a Comissão [Europeia] avalia por baixo a quantidade de erros nas despesas e não usa devidamente os meios que tem para encorajar os Estados-membros a melhorarem a sua gestão e os seus sistemas».
Críticas que não foram bem vistas pela Comissão Europeia, que assevera que «providencia garantias razoáveis nos seus relatórios anuais em linha com os requerimentos legais para a maioria dos programas». E acrescenta: «Quando o nível de erro é significativo, a Comissão realiza controlos e correções plurianuais para reduzir a taxa de erro abaixo de 2% no momento do encerrar os programas, com base nos requisitos regulamentares para a aplicação de correções financeiras. Assim, a taxa de erro final comunicada para todos os programas de coesão está, aproximadamente, entre 1,2% e 1,3%».
Estas críticas em torno da aplicação dos fundos de coesão surgem numa altura em que a execução em torno do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) por parte do Governo português recebe cartão vermelho. Paulo Monteiro Rosa afirma que, enquanto ao nível europeu existe esta divergência sobre os controlos das despesas dos fundos de coesão, em Portugal «há divergências quanto à cabal execução, sobretudo entre Estrutura de Missão Recuperar Portugal e o Conselho das Finanças Públicas». Ainda assim mostra-se otimista em relação ao futuro ao acreditar que «é provável que até 2026 todo o programa do PRR esteja executado, estando Portugal no pelotão da frente na execução entre os 27 países da União Europeia, de acordo com a Comissão Europeia».
Mais pessimista está João César das Neves, para quem a falha na execução do PRR «é natural num programa de uma dimensão irrealista». E as críticas não ficam por aqui. «Os anúncios de verbas gigantescas só animam os ignorantes e quem não percebe nada destes temas. Os anúncios criam logo grande impacto político, mas têm um efeito real muito menor. Não é nada fácil gastar bem essas verbas, mesmo se fossem muito inferiores. E o que estamos a falar é apenas do curto prazo, onde a despesa anima a procura. Nada sabemos do impacto estrutural de longo prazo sobre a economia, que é o que realmente interessa. Por tudo isso é que programas como o PRR são, em geral, fiascos históricos».
Já no início deste mês, o Fórum para a Competitividade revelou que os pagamentos a beneficiários diretos e finais do PRR subiram 258 milhões para 4.616 milhões de euros (21% do total), a maior subida dos últimos sete meses, ainda assim, admite que é «insuficiente para cumprir o calendário». O número de marcos e metas cumpridos subiu de 102 para 105, 23% do total, o que permitiu à Comissão Europeia autorizar o pagamento de 714 milhões de euros, que tinham sido retidos por incumprimento.