Primeiro-ministro tenta tudo para resistir a orçamento retificativo

Primeiro-ministro tenta tudo para resistir a orçamento retificativo


A apresentação de um orçamento retificativo está, para já, fora dos planos. Luís Montenegro quer começar a governar sem mais questões parlamentares


A decisão já estará tomada, Luís Montenegro quer entrar a matar na governação e evitar discussões sobre quem aprova o quê num orçamento retificativo. O primeiro- ministro está convencido de que o mais importante neste momento é dar sinais à sociedade de que está a fazer mudanças e a cumprir o que prometeu e esses sinais não necessitam de um orçamento retificativo. Dos nove compromissos que Montenegro apresentou esta quinta-feira no Parlamento, nenhum deles exige uma alteração ao Orçamento deixado pelo Governo de António Costa.

A opção de iniciar a baixa de impostos com «uma descida das taxas de IRS sobre os rendimentos até ao oitavo escalão, que vai perfazer uma diminuição global de cerca de 1500 milhões de euros nos impostos do trabalho dos portugueses face ao ano passado, especialmente sentida na classe média» não necessita de alterações orçamentais por não mexerem nos tetos da despesa. A consequência dessa mexida nos impostos, que implica reduções na receita prevista, pode ter, isso sim, impacto no défice que só se apurará no final do ano.

O outro compromisso que irá pesar  nas contas públicas passa pelos aumentos prometidos a professores e forças de segurança, embora, neste caso, a ideia de haver um compromisso faseado ao longo da legislatura diminua os impactos orçamentais no imediato. Isso mesmo fará parte das negociações anunciadas por Montenegro na abertura do debate do Programa do Governo:  «Iniciar-se-ão nos próximos 10 dias as conversações com os representantes dos professores e das forças de segurança, com vista a tratar de assuntos relacionados com as carreiras e estatuto remuneratório».

Ao que apurou o Nascer do SOL, estas negociações serão feitas no horizonte da legislatura, «não dá para ser tudo ao mesmo tempo».

Iniciativas legislativas em vez de retificativo

O primeiro sinal de que o primeiro-ministro não tem intenção de apresentar um orçamento retificativo pode ler-se na carta que enviou ao líder socialista. Na resposta ao repto lançado por Pedro Nuno Santos para negociar com o Governo um orçamento retificativo que permita resolver os problemas de professores, forças de segurança e outras carreiras da administração pública, Luís Montenegro saúda a abertura dos socialistas para consensualizarem «iniciativas legislativas» que possam resolver os problemas mais urgentes.

A verdade é que nos últimos dias o núcleo duro do Governo fez contas e garantiu que o orçamento retificativo não é indispensável, pelo menos para já, não estando afastada a hipótese de ele surgir em Outubro. A prioridade é começar a governar e guardar o grosso das propostas para o Orçamento de 2025, tentando assim comprometer Chega e PS com um orçamento carregado de boas notícias para os portugueses.

Os próximos meses são cruciais para verificar se a estratégia funciona ou não e, para que funcione, diz-nos uma fonte da AD, «é fundamental que haja vontade de dialogar e negociar no Parlamento, e não pode ser só nas matérias como a corrupção, tem que ser em várias áreas, para que socialistas e Chega não acumulem capital de queixa e argumentos para dizer que o Governo é arrogante apesar de minoritário». A mesma fonte adianta que, «agora que já mostrou ao que vem, o Governo tem mesmo que pôr o diálogo em prática».

Governo prepara-se para governar em duodécimos

A frase já foi dita e repetida por Luís Montenegro: «O Governo vai governar quatro anos e meio ou até ser aprovada uma moção de censura». Com isto o chefe do Governo quer sinalizar que pretende continuar a governar mesmo que o orçamento de 2025 venha a ser chumbado no Parlamento.

Caso o Orçamento de 2025 não passe, o cenário mais provável é que a AD governe em duodécimos nos dois anos seguintes. A partir de junho de 2025 Marcelo Rebelo de Sousa está impedido de dissolver o Parlamento, por estar a seis meses do final do mandato, e o próximo Presidente só tem poder de dissolução seis meses depois da sua eleição, em janeiro de 2026. 

E governar em duodécimos é bom ou mau para o Governo? Responde um observador atento da vida política nacional: «Depende da perspetiva: num cenário em que os indicadores económicos não correspondam à visão mais otimista do cenário macro-económico da AD, até facilita a missão do primeiro-ministro e do ministro das Finanças, para justifcara impossibilidade de cumprir as promessas mais generosas». O mesmo analista diz que, «assim sendo, o PS também fica amarrado ao Orçamento que deixou em herança à AD, podendo Montenegro argumentar que as coisas não estão melhores porque o PS não deixou».

Os primeiros sinais não deixam margem para dúvidas de que, ao contrário do que Pedro Nuno Santos anunciou na noite eleitoral, o tempo da tática política está instalado no país, e está para durar. Montenegro, Pedro Nuno e André Ventura vão estar atentos a todos os pormenores e vão estar sempre prontos para aproveitar qualquer erro dos adversários.

Agora, passado o debate do Programa do Governo, o foco volta-se para as eleições europeias de junho. PS e AD guardam os nomes dos cabeças de lista para os próximos dias, conscientes de que os resultados destas eleições serão determinantes para o que se pode passar no país até ao momento de aprovação do Orçamento, depois do verão.