Um ano depois da última edição do seu grandioso espetáculo que percorre não só Portugal como o mundo, Luís de Matos deseja continuar a desafiar-se e a surpreender aqueles que se sentam nas cadeiras dos teatros para assistirem ao resultado de meses de trabalho. Luís de Matos IMPOSSÍVEL Ao Vivo regressa às grandes salas, com um novo elenco e novas ilusões, e volta a acontecer, ao longo de seis semanas, nos próximos dois meses, em quatro cidades: Figueira da Foz, Lisboa, Porto e Faro.
“Nós começámos isto em 2018, um bocadinho sem saber o que aí vinha. Ficámos muito surpreendidos porque tivemos 25 mil espetadores. Ficámos mesmo surpreendidos e altamente entusiasmados, com vontade de fazer mais e melhor no ano seguinte”, começou por explicar ao i. Em 2019, tiveram 30 mil espetadores, “uma coisa possível de prever”. “Estávamos preparadíssimos para voltar em 2020, mas todos nós sabemos o que aconteceu nesse ano. O que é certo é que entre dezembro de 2019 e dezembro de 2022 – quando acabámos por voltar –, corríamos o risco de em três anos, as pessoas terem esquecido aquilo que é o Impossível ao Vivo. Voltámos a dizer: ‘Bom, se calhar vamos ter de começar isto de novo, as pessoas já não se lembram!’. Obviamente que mudamos o elenco todos os anos, trazemos novas ilusões… O que é certo é que 2022 correu lindamente. Tivemos 35 mil espetadores. Ficámos super contentes”, lembra. E, este ano, o ilusionista acredita que a equipa voltará a bater recordes. “Uma vez mais, queremos elevar a fasquia em termos do número de pessoas às quais conseguimos levar um espetáculo em que acreditamos”, admitiu, acrescentando que será “o espelho do que melhor se faz à escala global”. “Trazemos sempre o melhor da contemporaneidade nesta área. Este ano, somos cinco (como sempre) e nada me pode conter de dizer que os outros quatro são incríveis”, continuou. O espetáculo vai estrear na Figueira da Foz, onde estará uma semana, depois em Lisboa, durante três semanas; segue-se o Porto, mais uma semana, terminando com a sexta e última semana em Faro.
“Estamos altamente expectantes”, frisa Luís de Matos. “A sensação que dá é que as pessoas que vêm, voltam todos os anos e trazem um amigo! Por isso é que vamos sempre tendo mais público. E da nossa parte há o compromisso de que vamos de tudo fazer para continuar a merecer esta continuada e reforçada confiança, relembrando que é um espetáculo para toda a família, um espetáculo em que as pessoas podem vir independentemente da sua faixa etária, do grau sociocultural, independentemente se gostam ou não de magia. Porque é uma coisa fixe! Todos os anos temos pessoas que nos dizem: ‘Só vim porque o meu filho me obrigou, mas gostei imenso e volto para o ano!’. Depois, percebemos que não é tanga! Voltam mesmo”, conta o mágico.
Atrás de cada ilusão Interrogado sobre o processo criativo por trás de cada espetáculo, o artista fala de dois caminhos. “Um, tem a ver com os momentos que eu protagonizo com a Joana Almeida e com os Momentum Crew e que, às vezes, são ideias que já existiam há 20 anos. Outras, são ideias que surgiram no último momento”, revela. Uma coisa é certa, independentemente das alturas em que está em palco, ou atrás de uma câmara de televisão, seja em Portugal ou no estrangeiro, a equipa vai todos os dias trabalhar. “Eu trabalho todos os dias com esta equipa que me acompanha há 28 anos, das 9h às 18h. O que é que a gente faz? Tentar encontrar sempre este equilíbrio entre ambição e humildade”, acrescenta. Ou seja, “termos a ambição de, no próximo espetáculo, fazer o que nunca antes foi feito, fazer a melhor ilusão de sempre e, ao mesmo tempo, termos a humildade de passado uns meses, ou um ano, dizer: ‘Isto não vale o entusiasmo que nós lhe tínhamos colocado’”, reforça. “Diria que de 20 coisas que a malta acha que vão mudar o mundo, ou pelo menos o nosso mundo, há duas que acabam de ver a luz do dia”, conta. Por isso, tem de se estar sempre a reinventar. “É um bocadinho o que eu faço todos os dias. Uma vez li: ‘Escolhes fazer na vida aquilo que amas e nunca trabalharás um único dia!’. Eu não quero ser assim muito poeta, mas é a verdade. Eu curto imenso aquilo que faço, por isso, acabo por não contabilizar as frustrações, os sacrifícios. Acabo sempre por aprender coisas, sobretudo nas peças que correm menos bem. Depois, é um prazer imenso trabalhar em coisas novas”, acrescenta.
Depois disso, há que pensar no elenco para cada ano. Quanto a isso, Luís de Matos admite que tem tido sorte, já que tem visto as suas solicitações sempre aceites. Relativamente aos critérios na escolha dos artistas, a qualidade, a criatividade e a contemporaneidade, são os fatores mais importantes. “Mas depois também temos de pensar no seguinte: eu posso jantar o melhor peixe e a melhor carne, mas, se calhar, as duas coisas ao mesmo tempo, não faz muito sentido. Procuramos ter os melhores ingredientes, melhores criativos e também que essa escolha possa ser sempre consciente da mistura que o espetáculo vai constituir. Acreditamos que a mistura deste ano seja absolutamente expulsiva, complementar e extraordinária”, garante.
Novo elenco Este ano, o mágico português terá ao seu lado Winston Fuenmayor, venezuelano, particularmente jovem, de um país que não tem a tradição de oferecer ao mundo grandes artistas desta área. “No entanto, é um vulcão, quer criativamente, quer em termos performativos no palco. Conheci-o porque fui assistir ao Campeonato do Mundo de Magia, onde ele participava e onde para grande repúdio meu, não ganhou nenhum prémio… Mas ganhou uma coisa incrível: a unanimidade de todos os que estavam a assistir”. Segundo Luís de Matos, este faz “o inesperado”. “Posso dizer que num dos números ele fala em deixar de fumar, mas é uma mensagem subliminar, porque tudo o resto é muito plástico, muito surpreendente em termos de manipulação e estéticos”, adianta.
Já Raymond Crowe, vem da Austrália e já participou no ‘Impossível ao Vivo’ em 2019. “Cai dentro de uma regra que nós, de uma forma não muito premeditada, fomos estabelecendo para cada novo elenco do Impossível: em cada ano, tem de haver um membro, além de mim, que já fez o espetáculo no passado e que já tem números novos”, explica o ilusionista, acrescentando que Raymond Crowe é um mestre do Teatro Físico, um Marcel Marceau da contemporaneidade, “mistura imensas artes em cada um dos seus números”. “É, de facto, multidisciplinar”, frisa.
Léa Kyle, francesa, é a primeira mulher a integrar o elenco neste espetáculo. “Dá resposta a um anseio antigo que é ter uma mulher protagonista. Nunca tivemos no passado uma mulher, porque nunca encaramos a necessidade de cumprir quotas. Sabíamos que quando elas aparecessem e integrassem o elenco, não seria em consequência dessa necessidade contemporânea de inclusão, mas sim por total mérito”, esclarece. “Ela é a rainha de uma área que se chama quick change, que tem imensa tradição precisamente nos artistas do sexo masculino e já foi reconhecida por todos. Já foi aplaudida nos mais diversos palcos”, explica.
Finalmente, Laurent Piron, da Bélgica, que, segundo Luís de Matos, representa um bocadinho a tradição também “não uma condição”, de ter um campeão do mundo. “O campeão do mundo é aquele que não só ganha o primeiro lugar na sua modalidade, como depois vai a um concurso entre vencedores e a ele é atribuído esse cobiçado galardão chamado O Grande Prémio. Este ano foi ele. Não está entre nós por isso, mas sim porque o número dele é altamente demolidor”, garante. Laurent Piron não interpreta o mágico pleno de superpoderes que faz aparecer e desaparecer coisas, ele anima um pedaço de papel que na verdade acaba por ser o sonho dele enquanto artista. “Há um duelo que termina com êxito, mas que tão animado é o ser humano que está em palco, como esse pedaço de papel que tem emoções, movimentos, quase que fala. É um verdadeiro ator em cima do palco. Acabam por ser dois seres vivos, sendo que um deles é um pedaço de papel”, adianta.
De acordo com Luís de Matos, além da partilha do palco, os artistas acabam sempre por deixar-lhe outras coisas. “Primeiro porque eu acho que sou um Luís diferente todos os dias, porque aprendo com os meus erros, aprendo com os meus fracassos, aprendo com a minha equipa que sabe o ritmo a que eu respiro, o que é que eu gosto e desgosto, onde é que eu preciso de ser desafiado… Isso é brutal. Um processo de aprendizagem diário e constante. Depois, passar a trabalhar de perto com estas pessoas que pensam diferente, mas que pensam de forma espetacular e desafiante, é para mim altamente extraordinário”, garante, explicando que por natureza todos eles pedem conselhos uns aos outros. “Portanto, seja porque tenho a hipótese de pedir conselhos, seja porque me pedem a mim e dessa forma eu sou convidado a refletir, a opinar, solucionar, tomar como meus os problemas dos outros, isso dá um músculo criativo fantástico”, afirma. Como se isso não chegasse, chega este tempo “tenso”. “Para as pessoas que vão ver o Impossível ao Vivo, são duas horas de espetáculo. Mas nós estamos todos, entre equipas, um mês e meio. Passamos por desafios, temos de solucionar problemas, temos vitórias partilhadas, problemas e imprevistos. É quase como uma família à força”, brinca.
Maiores desafios Interrogado sobre os maiores desafios que enfrentou este ano, Luís de Matos afirma que quando se tem 10 ou 12 criações que são mais ou menos boas de forma garantida, podia-se estar “quietinho”. “Sempre que tu pegas numa coisa nova, há um risco imenso. No ano passado andei seis meses a trabalhar num momento novo para o espetáculo, já ninguém podia ver aquilo à frente. Foi altamente desgastante, mas também muito motivador, porque todos tínhamos a certeza que aquilo ia ser demolidor. Não havia hipótese. Fizemos a noite de estreia em Coimbra, no dia seguinte, como sempre fazemos, reunimos para avaliar pequenas alterações, etc. A reunião começou comigo a dizer: ‘Amigos, é para vos dizer que este momento já não vai integrar o espetáculo. Tem de ser cortado. Não está lá a fazer nada!’. Toda a gente ficou surpreendida, mas acabaram por concordar”, revela. O mágico acabou por deixar esse momento para outros espetáculos, onde tem resultado muito bem “Portanto, essa é uma ansiedade grande que tenho relativamente ao que vamos fazer. Sobretudo porque há uma peça em que eu e a Joana Almeida nos desafiamos. Vamos fazer uma coisa completamente diferente do que fizemos até hoje, mas que há muitos anos queríamos fazer. Sabemos que vai funcionar, mas não sabemos como é que vai ser recebido”, remata.
Além disso, no próximo ano e com o elenco da última edição do seu espetáculo, Luís de Matos, estará durante um mês – de 7 de novembro a 1 de dezembro –, na casa francesa Folies Bergère, com Aaron Crow (Bélgica),Dan Sperry (EUA), Norbert Ferré (França), Yu Hojin (Coreia do Sul). Um grande marco na sua carreira que aguarda expectante, já que esta é considerada uma das mais emblemáticas salas de espetáculos de Paris.