“O mercado nacional continua a ser o principal no Algarve”

“O mercado nacional continua a ser o principal no Algarve”


André Gomes reconhece que este verão há menos portugueses na região e diz que ‘é reflexo da situação económica do país’. Uma questão a que tem de ser dada atenção, mas recusa alarmismos e lembra que ‘o Algarve está logo ali’.


Para o novo presidente do Turismo do Algarve deveria haver um compromisso sério por parte do Governo para a realização de grandes eventos no Algarve, como o MotoGP, tendo em conta o seu retorno financeiro. De acordo com André Gomes não faz sentido andar todos os anos nesta incerteza e diz que se todos os concelhos aplicassem a taxa turística estariam menos dependentes do Estado central. Reconhece que o Algarve é um dos mais afetados pela seca e pede ação, lembrando que «infelizmente, nenhum destes investimentos, mesmo que os que já estão concluídos e que estão em funcionamento, são soluções que nos resolvem o problema de falta de água no imediato». O responsável admite que há um problema de falta de habitação na região, mas garante que não é resolvido com restrições ao alojamento local e não hesita: «Não acho que seja positivo o veto nem deste [Mais Habitação] nem de qualquer diploma».

De acordo com os indicadores que têm sido divulgados, o Algarve está a sofrer uma quebra este verão de turistas nacionais. Os dados são demasiado alarmistas?

Julgo que são um pouco alarmistas e esta análise que é divulgada mês a mês vale o que vale. O mercado nacional continua a ser o principal mercado e vamos continuar a ter muitos portugueses no Algarve como queremos sempre e como continuaremos a ter. De facto, verificou-se um decréscimo de 3% a 4% nos últimos dois meses, mas ao contrário da ideia que estes números transmitem, em particular em relação ao mercado nacional, estamos com mais gente na região. Terminámos o primeiro semestre com mais de cerca de 13% de dormidas e estamos com mais de 20% de passageiros no aeroporto de Faro relativamente ao ano passado. Nos proveitos globais também registámos uma subida na ordem dos 20% no final do primeiro semestre face a igual período do ano passado. Em relação à questão dos portugueses julgo que é reflexo da situação económica, que têm menos dinheiro disponível para as suas atividades de lazer, para as suas férias e isso reflete-se nas suas escolhas e nas opções que fazem, nomeadamente no maior período de férias que têm. Mas como costumo dizer, ‘o Algarve está logo ali’ e isso faz com que os portugueses possam, a qualquer altura do ano, usufruir da nossa oferta turística diversificada. Por exemplo, relativamente ao ano passado verificámos um número muito grande de portugueses na região ao longo de todo o ano, o que quer dizer que vieram maioritariamente para o Algarve e vieram mais do que uma vez por ano, daí existir agora esta diferença em relação à presença de portugueses na região. Além disso, no ano passado ainda existia o receio de visitar alguns destinos, este ano, havendo liberdade de circulação, talvez tenham escolhido alguns desses destinos tendo em conta o preço – depois ao longo do ano têm muitas oportunidades de visitar o Algarve. Em qualquer fim de semana vemos sempre muitos portugueses rumarem a sul, não só na época alta, mas principalmente nas denominadas épocas baixas. 

Os preços que estão a ser cobrados também ditam essa escolha…

Sim, o que nos faz augurar com expectativa positiva o que serão os resultados no final do ano e acredito que irão refletir o crescimento que tivemos durante a época baixa no início do ano. Entre janeiro e maio tivemos subidas relativamente ao ano passado de 10% a 12%. Em relação às taxas de ocupação tivemos subidas de 34%. Isso faz com que, no cômputo geral, no final dos primeiros seis meses do ano estejamos com mais dormidas, com mais hóspedes e com mais turistas na região. Claro que esta questão de termos menos portugueses no verão é para termos atenção, mas não é obviamente de todo alarmante. 

Marques Mendes no seu comentário semanal disse que havia cada vez mais portugueses a irem para o sul de Espanha por ser mais barato… 

Acho natural, esses destinos não têm nem de longe nem de perto a pujança e a força da marca Algarve, naquilo que é o seu reconhecimento como destino turístico a nível internacional e trabalham neste período de recuperação pós-pandemia muito pelo preço. O Algarve fez bem em não o fazer porque o serviço que prestamos é de qualidade, mas é de referir que as taxas de ocupação que registámos neste período de época alta, ou seja, nos meses de junho até agosto, estão acima dos 90 e dos 95%. Não podemos crescer mais em capacidade, mas podemos crescer em valor. É isso que se está a verificar e os resultados que temos nos proveitos globais mostram isso mesmo. Estamos a crescer em valor, numa altura em que não podemos crescer mais em capacidade e estamos a crescer em ocupação nos períodos de época baixa, onde claramente podemos crescer ainda mais. 

Uma das preocupações que o setor tem tido nos últimos anos, não só o Algarve, mas todo o país, é crescer em valor. Agora que o objetivo começa a ser alcançado surgem vozes críticas a dizer que os preços estão demasiado altos? 

Independentemente das circunstâncias ou do que façamos, haverá sempre vozes críticas e opiniões diferentes. Por exemplo, no ano passado, todos se ‘queixavam’ que o Algarve estava cheio, que não havia espaço para pôr uma toalha, que devíamos oferecer um serviço de maior qualidade e é isso que estamos a registar este ano. 

Era inevitável este aumento dos preços?

No período pós-pandemia verificou-se – além da escassez de recursos humanos e que não afeta apenas o setor do turismo – também um aumento dos custos de produção por parte das empresas, que teve de ter reflexos nos preços, a par do aumento da inflação. Quero crer que o aumento que se verifica nos preços no Algarve refletem isso mesmo. Quanto aos recursos humanos e perante aquilo que é a escassez, os nossos empresários tiveram de pagar melhor e ainda bem que o fazem. Temos de continuar com essa política. 

Até por haver um problema de falta de mão-de-obra…

Exatamente. A mão-de-obra tem de ser mais valorizada para conseguirmos captar os bons profissionais e para oferecermos o tal serviço de qualidade que pretendemos. 

Em relação à falta de mão-de-obra e que não afeta apenas o turismo acha que a solução passa por uma aposta forte na imigração e numa maior agilização dos processos? 

Esse é um dos caminhos, assim como aumentar a nossa oferta formativa turística na região, assente nas escolas de hotelaria e de turismo e na Universidade do Algarve para podermos pagar melhor com vista a captar os melhores recursos humanos. Por outro lado, através da imigração, mas de uma imigração que, como temos defendido, seja feita de forma ética e responsável. Não queremos trazer trabalhadores a todo o custo para virem trabalhar em condições não adequadas. Tudo isto é um desafio que tem sido objeto de trabalho nos últimos anos, quer por parte do setor público, quer por parte do setor privado. Nós próprios, por exemplo, temos estado envolvidos em missões no sentido de tentar fazer acordos com alguns países que possam ter mão-de-obra que possam dispensar e que estejam interessados em trabalhar para a nossa região, mas com condições adequadas para o fazerem. É um trabalho moroso, muito burocrático e que, muitas vezes, não surte os efeitos imediatos que a região necessita no que diz respeito à necessidade de mão-de-obra. 

Até há pouco tempo, o Algarve era conhecido por necessitar de mão-de-obra sazonal. Essas diferenças em relação a outras regiões do país já estão mais atenuadas?

Felizmente já estão um bocadinho mais atenuadas. Verificou-se um crescimento, em termos de taxas de ocupação, de dormidas, de hóspedes na época baixa, mas é claro que regista sempre um pico mais alto nestes dois meses de verão. A pensar no combate à sazonalidade, e à necessidade de termos um nível de recursos humanos elevado durante grande parte do ano, também houve uma aposta por parte dos empresários e que tive oportunidade de verificar, nos contactos com os mesmos e com as associações representativas do setor, em assegurar as equipas de ano para ano, não se verificando tanto aquele esforço de salvaguardar apenas o período de verão. No entanto, continuamos a verificar uma escassez muito grande de recursos humanos qualificados para trabalhar ao nível médio. Mas a solução também passa muito pela qualificação dos nossos trabalhadores, com a nossa oferta formativa e, nesse sentido, temos trabalho a devolver. 

E contrariar a ideia que as pessoas iam para o Algarve para trabalhar apenas no verão, havendo muita rotatividade e pouca experiência…

Exato e não almejamos essa qualidade de serviço, queremos prestar outro tipo de serviços a quem nos visita. Isso era um fator que não contribuía em nada para este objetivo. 

Até ao final do ano, o que espera em termos de crescimento? 

A informação que disponho através de contactos com empresários e com associações representativas do setor é que estamos com muito boas perspetivas em relação àquilo que será esta segunda parte da época baixa, ou seja, a partir de setembro. Ao nível de reservas está muito bom e a restauração está com marcações, até porque começa a época do golfe. É provável que venhamos a registar níveis de crescimento semelhantes aos que registámos na primeira parte de época baixa entre janeiro e maio. 

O Algarve é conhecido por ser um destino de sol e praia e agora também pelo golfe. É preciso apostar em outro tipo de oferta? 

O golfe tem sido uma aposta da última década, que está a ter resultados e que impacta naquilo que tem sido o nosso crescimento na época baixa. O turismo de natureza, de oferta cultural, de oferta gastronómica e náutica são segmentos diferentes, diferenciadores e complementares daquilo que é e continuará a ser sempre o nosso principal investimento a nível internacional, que é a nossa oferta de sol/praia e golfe. Estes dois produtos a nível internacional são os que dão força à marca Algarve que me apraz muito ver quando estou fora ou quando vamos fazer a promoção da região externamente. Tenho pena que, muitas vezes, dentro do nosso país e mesmo dentro da nossa própria região não haja esse reconhecimento da marca Algarve e da força que a região tem lá fora. Vejo muitas vezes mais esse reconhecimento internacional do que a nível interno. Mas isso também é próprio do nosso país e tem muito a ver com o tal fado e saudade.

Daí também a importância das ligações aéreas…

É bastante preponderante para a nossa promoção internacional. E ter comigo na direção o diretor do aeroporto irá contribuir para uma melhor promoção internacional e para conseguirmos atrair novas rotas para a região com voos diretos, o que é muito importante para todo o setor turístico. 

E ao contrário de Lisboa, o aeroporto de Faro não tem problemas de constrangimento…

Não temos de todo. Às vezes temos alguns constrangimentos com o SEF, com as justificações de passaportes, mas o aeroporto está a trabalhar para melhorar cada vez mais esses serviços. E também tem muito a ver com o nosso principal mercado emissor que é o britânico por ter saído da União Europeia. Pontualmente, perante um fluxo muito grande de voos num determinado período curto, numa manhã, por exemplo, podem ocorrer alguns constrangimentos, mas como disse o aeroporto está a trabalhar em soluções para resolver esse problema. 

Mais rotas significam mais turistas e maior facilidade em chegar ao nosso país… 

É daquelas coisas que aprendemos logo quando começamos a trabalhar em turismo: é muito difícil trabalhar determinados mercados emissores se não tivermos ligações diretas à região. É um trabalho que estamos a fazer e esperamos bons resultados em breve. 

Em relação a aeroporto como vê a polémica em torno da nova infraestrutura em Lisboa. Este impasse é prejudicial para todo o país ou apenas para a zona da Grande Lisboa? 

Claramente que é prejudicial para todo o país. Temos um problema em Portugal que é levarmos 50 anos a decidir sobre projetos estruturantes para a economia e para o país. O aeroporto é um desses exemplos, mas também poderia falar no Hospital Central do Algarve. São investimentos fulcrais para responder às necessidades que o país tem e levamos muitos anos a discutir só a localização, nem sequer estamos a falar do tempo que leva depois para a contratualização, construção e entrada em funcionamento. A esse nível, o país tem de ter uma resposta mais eficaz e mais eficiente. 

A ferrovia é outro exemplo…

Infelizmente, Lisboa continua a ser a única capital europeia que ainda não está ligada ao resto da Europa por alta velocidade. Também aí há necessidade de um investimento grande, não só na alta velocidade, mas falando na região do Algarve, por exemplo, na eletrificação da linha que há tanto tempo esperamos e que se encontra neste momento em desenvolvimento. Mais uma vez são projetos estruturantes, necessários, mas que levam muitos anos para se concretizarem e para que possam ser usufruídos pelos cidadãos que vivem e que visitam a região. No outro dia perguntaram-me o que é que achava de uma ligação de alta velocidade do Algarve a Espanha, respondi que achava muito bem. Muitas vezes acabam por utilizar soluções de transporte, por exemplo, que existem em Sevilha, quer ao nível do aeroporto, quer da alta velocidade porque está muito próximo. Os benefícios, quer para o país, quer para a região, de termos uma ligação direta, fosse ela a Lisboa, fosse ela ao Algarve com a nossa vizinha Espanha através da alta velocidade só poderia trazer benefícios para o turismo, mas até para a própria economia das empresas ao nível das exportações e das importações. 

No lançamento da sua candidatura prometeu levar mais alto e mais longe o Algarve como principal destino turístico português. Que obstáculos espera enfrentar? 

Este reconhecimento do potencial turístico da nossa região permite-nos almejar isso mesmo: levar ainda mais alto e mais longe o nosso destino. Não obstante todo o reconhecimento internacional que teve nos últimos anos, nomeadamente ao nível de prémios internacionais – como o melhor destino de praia da Europa, do mundo, melhor destino de golfe – permite-nos ambicionar ainda mais e de uma forma positiva. E quando queremos mais também temos de valorizar mais o nosso destino, queremos que seja conhecido por mais mercados emissores, daí também a importância que tem o nosso trabalho de diversificação. A história diz-nos que há muitos anos vivíamos quase única e exclusivamente no mercado britânico. Hoje em dia temos mercados emissores com crescimentos na ordem dos 25% como a Irlanda. Temos o mercado norte-americano a crescer 89% entre os Estados Unidos e Canadá. Isto permite precisamente continuar a almejar levar mais longe o que é a marca Algarve e o potencial da nossa região. Quanto aos desafios acredito que sejam muitos, nenhum trabalho é fácil. Mas a principal dificuldade que identifiquei desde que apresentei a minha candidatura é o sub-financiamento que as entidades regionais do turismo têm praticamente desde 2015. Desde 2015 que a verba atribuída pelo Orçamento do Estado às entidades regionais do turismo não muda. Estamos a falar de 16 milhões por ano, não há um incremento ou uma atualização desta dotação. Defendo, por exemplo, que a atualização fosse feita com base no índice de preços no consumidor. 

Aí estaríamos a falar de 5,5 milhões de euros só para a região… 

Este ano, o Orçamento de Estado deu-nos 4,1 milhões, mas se tivesse havido uma atualização com base no índice de preços no consumidor teríamos recebido uma dotação de 5,5 milhões. Estamos agora a tratar do Orçamento do Estado para o próximo ano e as entidades públicas estão a apresentar as suas necessidades orçamentais para o exercício da atividade em 2024 para que, em setembro/outubro, se inicie o processo de aprovação do Orçamento, em sede da Assembleia da República. Esta semana, a Entidade do Turismo do Algarve, cumprindo os prazos e as diretivas emanadas por parte da Lei do Orçamento de Estado apresentou o seu orçamento. E não tendo informação oficial e atempada – porque são prazos muito curtos e tomei posse recentemente, o que dificulta ainda mais o processo – pedimos cerca de 5,5 milhões porque entendemos que é o valor que necessitamos para desenvolver a nossa atividade e para atingir os objetivos que partilhámos com toda a estrutura do Turismo de Portugal e com quem consensualizamos estratégias para desenvolver a nossa atividade, mantendo-me fiel às minhas intervenções.

Na semana passada, em entrevista ao nosso jornal, o presidente do Turismo Norte e Centro falou na necessidade de atualizar as verbas destinadas à promoção já que o turismo é o principal motor da economia e um dos maiores criadores de postos de trabalho… 

É inconcebível que esta verba não seja atualizada desde 2015 para a principal atividade e motor da economia do país. Não consigo entender a justificação, considerando os proveitos que o setor do turismo traz ao país e que são reconhecidos todos os dias. 

O secretário de Estado anunciou uma verba extraordinária de mais três milhões para a promoção turística e eventos para o Algarve… 

Foi um reforço extraordinário apresentado pelo secretário de Estado, mas já tinha sido anunciado alguns meses antes, em reunião de conselho estratégico. É muito benéfico, mas destina-se às associações de promoção turística. 

E eventos, como o MotoGP são importantes para atrair mais turistas para a região? 

Esse reforço de verba não será para esses eventos. É uma ‘batalha’ que vamos continuar a travar e digo batalha porque precisamos de um compromisso sério e concreto por parte do Governo no reconhecimento da importância da realização desses eventos na região e no país. Precisamos que haja um reconhecimento por parte do Estado central em relação à importância que estes eventos trazem para que invistam nessas iniciativas. Estamos a falar de investimentos completamente desproporcionais face ao retorno que trazem. Fiz a minha tomada de posse no Autódromo Internacional do Algarve e tive a oportunidade de referir que só os eventos que acontecem neste local durante este ano – os que já aconteceram até agora e os que estão calendarizados e vão ocorrer até ao final do ano – têm um retorno previsto direto na região na ordem dos 150 milhões de euros. Estamos a falar de um investimento público que face ao retorno é claramente vantajoso em muitas centenas de percentagem e é com alguma dificuldade que vejo esta falta de reconhecimento, esta falta de investimento direto e concreto na atração de grandes eventos como, o MotoGP, o Masters de Golfe ou a Volta ao Algarve em bicicleta. São três exemplos de eventos que vamos continuar a trabalhar com o Turismo de Portugal e com os privados envolvidos nestas provas para continuarmos a garantir a manutenção destas provas na região. 

Também a Jornada Mundial da Juventude foi alvo de críticas por causa do investimento que implicou…. 

Já me questionaram sobre o seu impacto para Lisboa e para o país e respondi que estava de acordo. Teve um impacto fantástico para todo o país. Foi extraordinário ver a dinâmica que as diferentes regiões e cidades deste país conheceram à conta dos peregrinos e a vivência que trouxeram para essas cidades já que eram muitos jovens e provenientes de imensas nacionalidades. Pode-se questionar um investimento ou outro, como muitas vezes questionamos outros investimentos em áreas públicas, mas neste caso até temos métricas que nos permitem aferir quase no imediato qual foi o impacto direto. Não é uma história, é um facto comprovado. Há um investimento público, no entanto, existe quase sempre um retorno muito superior. Esses investimentos que passam pelo Algarve são muito importantes para a região e são muito importantes para as entidades públicas e para as entidades privadas. Mas para que as pessoas venham para esses eventos, sejam eles participantes, equipas, visitantes, turistas é necessário ter um serviço de qualidade. E para nos prepararmos condignamente temos de ter um compromisso de uma forma firme, concreta e até com um prazo alargado. Não podemos estar todos os anos nesta luta de arranjar financiamento para garantir a presença de um MotoGP, por exemplo. Não podemos estar todos os anos a pressionar e andar nesta incerteza se vamos receber a prova ou não. É importante haver um compromisso por parte do Estado, no sentido de garantir que vamos ter este tipo de provas durante dois, três anos para que todos, entidades públicas, privadas, empresas, câmaras municipais, toda a infraestrutura turística e não turística da região esteja preparada para receber este tipo de eventos.

Voltando ao financiamento. Faz sentido a taxa turística na região? 

Sem dúvida. Tenho defendido a importância da diversificação das fontes de financiamento do turismo ao nível regional e a taxa turística é uma delas. Sou um defensor da taxa turística e praticamente todos os destinos turísticos da Europa e do mundo cobram. Então se sempre que vamos lá fora em promoção ou em férias pagamos taxa turística não vejo porque é que um destino como Portugal, que é um destino turístico por excelência, não faça essa cobrança. Claro que é importante que a sua aplicação seja regulada e seja explicada a forma como será investida. No ano passado, salvo erro, em sede da AMAL [Comunidade Intermunicipal do Algarve] foi consensualizado uma base de regulamento de aplicação das taxas turísticas por parte dos diferentes municípios da região. Temos três concelhos que neste momento estão a aplicar a taxa: Vila Real de Santo António, que já aplica há muitos anos, Faro e Olhão. Mas tenho desafiado todos os outros presidentes de câmara a prosseguirem esse caminho, uma vez que muitos deles já têm trabalho realizado a este nível, já têm regulamentos em consulta pública e estão a proceder às contratualizações necessárias para a aquisição de software para fazer a gestão da sua cobrança. Aliás, ficou previsto que 10% desta taxa cobrada na região seja afeta à promoção internacional para estarmos menos dependentes do Estado central. Se calhar se já tivéssemos toda a região a cobrar taxa turística e se destinássemos esses tais 10% à promoção externa eventualmente já poderíamos ter garantido estes grandes eventos por um período de um ou de dois ou de três anos. 

Só há três concelhos que aplicam. Tem havido resistência por parte dos outros que não aplicam? 

Acredito que tenha sido resultado da pandemia, porque até 2019, tanto quanto tomei conhecimento, havia mais três ou quatro concelhos que tinham trabalho feito no desenvolvimento dos respetivos regulamentos de aplicação, com as consultas públicas. E já havia mais dois ou três municípios que tinham avançado com estes passos que foram interrompidos durante a pandemia. Mesmo durante a covid, aqueles municípios que já cobravam acabaram por suspender essa cobrança e retomaram no período pós-pandemia. Gostaria que de uma forma generalizada todos os municípios começassem a aplicar a taxa até porque não deve ser um fator diferenciador por parte dos turistas quando optam por um alojamento na região. Não faz sentido terem em conta se o concelho cobra ou não a taxa turística. 

Vila Real de Santo António cobra e Castro Marim não e são concelhos que estão ao lado um do outro… 

A região vale como um todo e a aplicação da taxa turística não deve ser um critério diferenciador ou que seja de motivação por parte de quem nos visita optar por este ou por aquele concelho, em função de cobrar ou não taxa.

Outras das preocupações da região diz respeito à sua sustentabilidade. O Algarve é um dos mais penalizados pela seca. É preciso um olhar mais atento para este problema? 

Sem dúvida e, acima de tudo, ação. Se tivesse havido ação há uns anos não estaríamos se calhar agora com o problema que temos, muito em particular ao nível da sustentabilidade e no que diz respeito a água para consumo. O setor turístico da região, quer público, quer privado, está a fazer o seu trabalho e ressalvo o Pacto Regional da Água, que inclui um conjunto de investimentos com financiamento já garantido, grande parte financiado a fundo perdido para instalações de estações de tratamento de águas residuais. Por exemplo, os campos de golfe têm investido em sistemas não só de tratamento de águas residuais, mas também em sistemas eletrónicos de medição da humidade da terra para perceberem se precisam de água ou não. Tem havido muita inovação e muita tecnologia nos campos de golfe, mas também nas unidades hoteleiras. Já temos unidades hoteleiras e projetos de animação turística a funcionar com dessalinizadoras. É o caso, por exemplo, do Zoo Marine que já tem há alguns anos uma dessalinizadora para tratar a água que utiliza. O setor turístico da região está a fazer o seu trabalho. Também é verdade que temos neste momento fontes de financiamento que ajudam, nomeadamente no âmbito do PRR e de outros fundos europeus. Mas claramente é preciso ação porque, infelizmente, nenhum destes investimentos, mesmo que os que já estão concluídos e que estão em funcionamento, são soluções que resolvem o problema no imediato. Há também municípios que têm de fazer investimentos para fazer uma melhor gestão das águas, mas são investimentos que só nos trarão resultados práticos provavelmente daqui a um ou dois ou três anos. 

O avanço desses projetos, nomeadamente por parte dos privados implicou uma mudança de mentalidade? O golfe durante muitos anos foi acusado de usar demasiada água… 

O problema da água existe há vários anos. É mais ou menos recorrente, em função das mudanças climatéricas, principalmente na zona do Barlavento. Essa mudança de mentalidade já existe de há uns anos para cá e por isso mesmo já se veem investimentos concretizados. No entanto, perante aquilo que é o alarme, a reação torna-se mais premente para evitar que nos próximos anos tenhamos uma situação de ‘alarme’ como poderemos vir a ter ainda este ano. 

E que seria ainda pior se nada fosse feito… 

Ainda estamos em agosto, não é expectável que chova durante este mês, depois iremos ver como será quando chegarmos a setembro/outubro e o que é que isso irá implicar em relação à nossa capacidade de resposta face às necessidades. Quanto aos golfes foram injustamente acusados de usarem um maior consumo de água, como também existe, muitas vezes, na região uma dicotomia entre o turismo e a agricultura, em que esta última está a fazer esforços para responder a este problema que vivemos. Por outro lado, há em alguns municípios perdas de água que carecem de uma maior intervenção. 

Em relação ao pacote Mais Habitação que foi esta semana vetado pelo Presidente da República, o alojamento local iria ser penalizado. Tendo em conta que tem um grande peso na oferta da região que impacto é que poderia ter? 

Não acho que seja positivo o veto nem deste nem de qualquer diploma. Ao nível da política nacional tem de haver uma consensualização da legislação produzida para que não haja vetos porque todo o veto, todo o atraso no processo legislativo não beneficia os cidadãos. A insegurança que estas alterações legislativas que, muitas vezes, provocam acabam por ser prejudicais para o desenvolvimento da atividade e para a vida das pessoas. Sem dúvida que o problema da habitação existe e a resposta por parte do setor público e do setor privado continua claramente a não ser suficiente, continuando a existir uma procura muito maior do que a oferta. Depois temos a questão da pressão dos recursos humanos, em que há também uma dificuldade muito grande em encontrar alojamento para os trabalhadores que a região precisa. Mas aí vimos um grupo hoteleiro que adquiriu um grande bloco de apartamentos para única e exclusivamente alojar os trabalhadores de uma unidade de cinco estrelas que abriu há relativamente pouco tempo na Praia Verde. Em relação ao alojamento local não creio que seja um problema na região, nem acho que uma restrição à sua atividade venha resolver o problema da falta de habitação. O alojamento local é uma oferta que foi bastante reconhecida quando foi criada, trouxe dinheiro para as famílias, serviu para reabilitar o edificado que estava abandonado e contribuiu muito para acabar com aquilo que era uma economia paralela que não pagava impostos e que se desenvolvia com o arrendamento de habitações sem contratos. É uma oferta que tem a sua procura e deve continuar a existir. No Algarve não creio que seja nem um problema nem uma solução para a falta de habitação. 

Mas, por exemplo, os profissionais no setor da Saúde ou da Educação queixam-se de ficarem sem casa quando chega o verão…

Sem dúvida e assisto a isso muito de perto. O problema do alojamento para trabalhadores não se reflete só no setor turístico, reflete-se também ao nível dos professores, dos médicos, dos profissionais de saúde na sua generalidade, das unidades das forças de segurança. Mas também é um problema que identificamos em todo o país, mas mesmo que o alojamento local deixasse de existir não resolveria de um dia para o outro todos esses problemas. Mas como se costuma dizer há AL e AL e nem todos estão sujeitos às condições que deveriam reunir perante o serviço que os turistas esperam quando ficam nessa tipologia de alojamento. Felizmente, tanto quanto tenho conhecimento, a oferta de AL é bastante qualificada na região e até associada aos segmentos de turismo diferenciadores e complementares, como o turismo de natureza, o turismo cultural, onde aí temos um alto nível de qualidade da oferta. O meu maior receio é que haja o ressurgimento de toda uma economia paralela que não se quer desregulada e sem qualquer tipo de avaliação das condições que são proporcionadas pelos proprietários. 

Em relação à oferta. A abertura de hotéis no Algarve ficou abaixo das 1022. Já era previsível?

Diria, até com um conhecimento muito prático, tendo em conta uma ou duas reuniões que tive na semana passada com investidores que estão a desenvolver projetos de construção de novos hotéis na região, que tem a ver muito com o impacto da pandemia que fez atrasar muitos projetos de investimento que existiam para a região. Na semana passada reuni-me com um presidente de câmara que me disse que só no seu concelho, no espaço de dois, três anos, estão previstos nove novos hotéis. Outro presidente de câmara falou-me em 11 hotéis para os próximos dois, três anos. Este ano também já grandes unidades novas abriram e temos novas unidades previstas para abrir no próximo ano. É claro que vimos com bons olhos este interesse por parte dos investidores internacionais e nacionais que continuam a investir no Algarve e a qualificar a oferta que temos disponível na região. 

Em relação à sua eleição para presidente do Turismo do Algarve. O PSD criticou por ter sido dirigente da Juventude Socialista e por ser filho da presidente da Câmara de Portimão…

A liberdade permite isso mesmo, permite falarmos à vontade e dizermos o que queremos. Temos, muitas vezes, infelizmente de aprender a lidar com um nível de política que é desenvolvido, quer na região, quer no país, que entendo que não é o adequado, nem é aquilo que as pessoas que votam nas diferentes eleições desejam. Relativamente a essas acusações estou na região há 40 anos e desses 40 dediquei 15 anos, pelo menos da minha vida profissional, ao turismo. Estive 10 anos no turismo em Portimão, depois estive cinco anos como diretor de promoção e animação turística na região do Turismo do Algarve e perante as circunstâncias que se verificaram proporcionou-se a candidatura, coisa que, confesso nunca pensei em sê-lo ou fazê-lo. Mas não escondo que o turismo é sem dúvida a minha área de eleição no que diz respeito ao desenvolvimento da minha atividade profissional. E mal de nós se por sermos filhos de não o podermos fazer. Todos somos filhos de alguém, ninguém apareceu na terra por obra e graça do Espírito Santo, como se costuma dizer. Até mencionaram o facto de ser marido da presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Algarve. É uma coisa completamente absurda. Já trabalhava em turismo há muitos anos quando conheci a minha mulher. Não merece mais comentários do que isso. 

A ideia seria criar mais polémicas em torno dos casos e casinhos? 

Desejo mesmo que este nível de política desapareça porque isso também faria certamente com que as pessoas tivessem mais interesse pela política e dessem mais relevância ao que se faz a nível político no país. Este tipo de opiniões ou de ações não ajudam em nada a esse propósito.