“Dream of para-para-paradise / Para-para-paradise / Para-para-paradise”, cantam os Coldplay, mas a verdade é que os preparativos para as quatro datas de Coimbra parecem não estar a constituir um sonho para quem quer ver uma das suas bandas preferidas e muito menos para quem quer lucrar à custa desse amor. Há nove meses, já o i noticiava que encontrar um quarto na eterna Cidade dos Estudantes constituía uma missão praticamente impossível. Havia quem arrendasse um apartamento por cerca de três mil euros por uma noite, nesta semana em que decorrem os eventos.
Agora, o cenário não é melhor. Por exemplo, a 2,5km do local do evento, há um quarto. O preço? 450 euros por pessoa, sendo que, alegadamente, acomoda seis pessoas. Se fizermos as contas, estamos perante um valor máximo de 2700 euros apenas com uma divisão. Também existem opções mais baratas mas que, mesmo assim, continuam a ser incomportáveis para a maioria dos portugueses. A cinco minutos a pé do Estádio, aluga-se um quarto por 850 euros. A verdade é que os anúncios tão depressa aparecem como desaparecem, indicando que, efetivamente, há quem pague para ficar alojado em Coimbra na época em que a banda inglesa estará em Portugal.
E as datas aproximam-se a passos largos: 17, 18, 20 e 21 de maio são dias que estão quase a chegar. E se há quem se continue a ‘safar’ com o aluguer dos quartos, o mesmo não acontece tão facilmente com a revenda de bilhetes. Por exemplo, foram detidas, pela Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), mais sete pessoas por crime de especulação na venda de bilhetes para os concertos dos Coldplay, que se realizam esta semana, nos quais são esperadas mais de 200 mil pessoas. Em comunicado, enviado esta segunda-feira às redações, a ASAE informou que foram apreendidos 13 bilhetes que “estavam a ser promovidos nas redes sociais a preços muito acima do seu real valor facial”, estando em causa “margens líquidas especuladas que oscilavam entre os 45 e os 160 euros por bilhete”, resultando em sete processos-crime, tendo sido decretada a medida de termo de identidade e residência para todos os suspeitos.
Todos já foram presentes a tribunal, tendo sido decidida a suspensão provisória dos processos-crime por um período entre quatro e seis meses, “na condição de os arguidos procederem ao pagamento a título de injunção de valores que variam entre 400 euros e 600 euros”, diz ainda a nota. “A ASAE reforça o alerta aos consumidores que devem evitar a aquisição de bilhetes acima do seu valor oficial, uma vez que essa venda constitui um Crime de Especulação, punido com pena de prisão de seis meses a três anos”, concluiu a ASAE.
Apenas os Pink Floyd em 1994, os U2 em 2010 e Ed Sheeran em 2019 tinham conseguido esgotar dois concertos em estádios portugueses. E os Coldplay conseguiram esgotar quatro concertos num estádio. Algo que deixou Marta Gonçalves, de 24 anos, surpreendida, mas igualmente feliz por ver, pela primeira vez, uma das suas bandas preferidas. “Vou no domingo, dia 21. Hoje não noto nenhuma diferença na cidade. Talvez tudo mude a partir de amanhã. Por aquilo que li nas notícias, creio que a organização será boa e parece haver uma gestão de locais para quem vem de fora. Por exemplo, para estacionamento. Agora… Se tudo acontecerá na perfeição? Disso não tenho a certeza porque este é um dos maiores eventos culturais que Coimbra já recebeu nos últimos anos”, explica. “Mas estou muito entusiasmada!”, esclarece a finalista de Medicina natural de Ponte de Lima, mas que estuda e vive em Coimbra.
“Para quem vem de fora de Coimbra, é recomendado vivamente que organize a viagem de forma a chegar à cidade no período da manhã, pois prevê-se que no período da tarde se verifique um grande fluxo no trânsito que poderá dificultar e atrasar a chegada a tempo do espetáculo. Queremos que todos aproveitem e usufruam do espetáculo desde o início. Recordamos que as portas do Estádio Cidade de Coimbra abrem às 17h00 e o espetáculo tem início a partir das 18h45”, lê-se numa nota da Everything is New publicada nas redes sociais, sendo que a Câmara Municipal atribuiu, em abril, um apoio financeiro no valor de 440 mil euros à Everything is New, no âmbito de um protocolo de colaboração celebrado entre a autarquia, a promotora Everything is New e a Associação Académica de Coimbra – Organismo Autónomo de Futebol (AAC/OAF).
“Tão relevante quanto as receitas e o retorno económico para a cidade, está o facto de estes concertos constituírem um produto estratégico para o turismo em Coimbra, não só pela enorme capacidade de atração de visitantes, mas também pelo efeito catalisador dentro da própria cidade”, justificou a autarquia, tendo em conta que em reunião do executivo municipal, o presidente da Câmara, José Manuel Silva, eleito pela coligação Juntos Somos Coimbra (PSD, CDS-PP, Nós,Cidadãos!, PPM, Aliança, RIR e Volt), evidenciou que estes concertos são “um dos melhores negócios de sempre nesta área para a cidade de Coimbra e para a sua região”. Já o PS apontou o dedo aos “dados ocultos” quanto ao negócio, como a receita global de bilheteira.
“A juntar ao impacto mediático que os espetáculos geram por si só, a atuação dos Coldplay no Estádio Cidade de Coimbra reflete-se sobremaneira na economia local, sendo que dois dos setores diretamente mais beneficiados são, sem dúvida, o da hotelaria e da restauração, com evidentes proveitos financeiros”, foi acrescentado. E lia-se também: “Recorde-se que, a 26 de agosto de 2022 – um dia depois da confirmação das datas dos concertos no Estádio Cidade de Coimbra –, a capacidade das unidades de alojamento do concelho de Coimbra estava esgotada para o período em que decorrem os espetáculos, num total de 7.947 camas, distribuídas por 26 unidades hoteleiras e 521 de alojamento local. A pernoita de visitantes irá, ainda, estender-se aos concelhos vizinhos, o que significa que acaba por alavancar não só a economia do concelho de Coimbra, mas de toda a região”.
Quem partilha da mesma opinião de Marta, mas ficou com os bolsos vazios é Raquel, que prefere não revelar o apelido, sendo que critica ferozmente o lucro gerado pelos quatro concertos. “Há coisas com as quais concordo. Por exemplo, condicionamentos de trânsito, entre os dias 16 e 22 de maio, e a disponibilização de 16 zonas de estacionamento periférico e quatro circuitos especiais dos Serviços Municipalizados de Transportes Urbanos de Coimbra (SMTUC), como li nas notícias”, começa por dizer Raquel. “E há outras que não me fazem espécie: a data do cortejo foi adiada de 21 para 23 de maio, pela organização da Queima das Fitas. É uma tradição, sim, mas há Queima das Fitas em todo o país em datas completamente diferentes. Agora, acho inadmissível que dos 200 mil bilhetes vendidos, apenas 3,8% tenham sido comprados no distrito de Coimbra. Ainda mais inadmissível do que isso é a revenda de bilhetes. Ouvimos que seis, sete, oito pessoas são detidas, mas andam muitas mais a vender bilhetes a centenas e centenas de euros. E não falemos nos quartos. Vou ficar em Coimbra duas noites com uma amiga e pagámos demasiado. Só fizemos isto porque adoramos os Coldplay desde miúdas. De certeza que não faríamos isto por mais nenhuma banda”, confessa.