Afinal não há nenhum parecer para demitir CEO da TAP

Afinal não há nenhum parecer para demitir CEO da TAP


Depois de muita pressão, Fernando Medina acabou por admitir que ‘não há nenhum parecer adicional’ a fundamentar demissões na TAP’ e remete para as conclusões do relatório da Inspeção-Geral de Finanças.


A demissão de Christine Ourmières-Widener e de Manuel Beja da liderança da TAP por ‘justa causa’ está longe de ser pacífica. Os partidos de oposição têm vindo a pedir o parecer jurídico que fundamentaria a saída da administradora e do chairman da companhia área, mas o próprio Fernando Medina já veio desfazer as dúvidas e reconhecer que o parecer não existe, havendo apenas uma deliberação da assembleia geral.

«Não há nenhum parecer adicional àquilo que é a base da justificação da demissão, que é mais do que suficiente para quem a leu, relativamente ao parecer da Inspeção Geral de Finanças», disse o ministro das Finanças, esta quinta-feira, no Parlamento, contrariando o que já tinha sido dito por Ana Catarina Mendes, que alegou que «o parecer em causa não cabe no âmbito da comissão parlamentar de inquérito» e que «a sua divulgação envolve riscos na defesa jurídica da posição do Estado». A ministra dos Assuntos Parlamentares também tinha apontado o dedo ao partido liderado por Luís Montenegro. «O que o PSD pede não é a fundamentação jurídica, que é aliás do conhecimento público da demissão da CEO da TAP, mas toda a construção da fundamentação jurídica, toda a documentação que foi trocada entre os vários atores para a construção desta decisão».

Na comissão de inquérito, a ex-CEO da TAP chegou a admitir que tinha recusado sair, mesmo depois de o ministro das Finanças lhe ter perguntado se queria demitir-se, afirmando que a única explicação que encontra para esta decisão são «motivos políticos». Ourmières-Widener explicou ainda, na altura, que «uma demissão é também um reconhecimento de que foi feito algo de errado e nada fiz de errado». Também uma das advogadas da ex-presidente executiva da TAP disse à Lusa que a responsável desconhece a existência de parecer jurídico que sustenta esta decisão.

A questão do parecer para justificar a sua saída foi levantada pelo PSD ao acusar o Governo de «atuar à margem da lei» por recusar enviar à comissão de inquérito à TAP os documentos que «deram respaldo jurídico» ao despedimento. Ainda esta quinta-feira, o líder do PSD acusou o Governo devido ao alegado parecer que justifica a saída de Manuel Beja e de Christine Ourmières-Widener da TAP. Para Luís Montenegro é claro que o primeiro-ministro está a perder autoridade política e reafirma-se como alternativa para governar. «Há uma inconsistência», disse Luís Montenegro. E acrescentou: «Temos quatro ministros que estão a brincar com os portugueses», referindo-se aos ministros das Finanças, Infraestruturas, Assuntos Parlamentares e Presidência do Conselho de Ministros.

Luís Montenegro acrescentou também que «perante esta falta à verdade, quem afinal não está preparado para governar? Quem demonstra não ter preparação? Olhem para o PS, para os atuais ministros». E questionou: «Os portugueses cada vez mais sentem uma grande desilusão com o uso e abuso da capacidade de governar, com esta ligeireza. Porque não dizem as coisas à primeira?».

Ainda assim, o socialista Jorge Seguro Sanches, presidente da comissão de inquérito, afirmou que vai proceder às diligências necessárias para insistir com o Governo para que envie a documentação que foi solicitada. E referiu que ficará claro na exposição que o pedido deste parecer «está dentro do âmbito da comissão de inquérito», refutando assim um dos argumentos do Governo para não enviar esta documentação.

Argumentos que já não tinham convencido o Bloco de Esquerda. Mariana Mortágua já afirmara que «ou esse parecer não existe e o Governo deve dizer que tomou a decisão sem que esta esteja suportada num parecer jurídico ou se o parecer existe tem de ser enviado à comissão de inquérito». 

Parpública à margem

Ouvido esta quinta-feira no Parlamento,Carlos Durães, antigo vice-presidente da Parpública, afirmou que foi deixado à margem da compra de 22,5% à Atlantic Gateway, em 2020. E foi posto à margem pelo então secretário de Estado do Tesouro, Miguel Cruz. «Apercebemo-nos que na interação com a tutela o secretário de Estado do Tesouro privilegiou o contacto sobre este dossier com os consultores externos e com o jurista que o assessorava nesta matéria, em detrimento dos administradores que ficaram nos órgãos sociais», disse.

E disse ainda ter ficado surpreendido por Miguel Cruz tutelar TAP. «Estranhei que, sendo o doutor Miguel Cruz presidente da Parpública, e havendo na organização do Ministério das Finanças duas secretarias de Estado, tendo em atenção que até aí quem liderava o processo da TAP era o senhor secretário de Estado Nuno Mendes, foi com surpresa que vi a delegação de competências no doutor Miguel Cruz, que tinha acabado de ser presidente da Parpública, tutelar a Parpública, da mesma maneira que vi também tutelar o processo da TAP», afirmou Carlos Durães.

Mais do que uma Alexandra Reis

A Comissão contou ainda com a presença do presidente da Comissão de Vencimentos da TAP, Tiago Aires Mateus, que defendeu no Parlamento que o órgão não tem competências para atribuir e gerir remunerações. «A Comissão de Vencimentos não deliberou e dificilmente deliberará sobre uma renumeração variável a uma pessoa que foi demitida pelo acionista», defendendo que a «Comissão de Vencimentos serve para cumprir as atribuições que os acionistas delegam».

E deixou ainda no ar se haverá ou não mais casos como o de Alexandra Reis: «Não sei quantos casos há como a Alexandra Reis, seria especulativo, mas haverá mais do que um, a acreditar nas notícias».