O título fica-lhe bem!

O título fica-lhe bem!


Na Fórmula 1 não basta ser rápido, é preciso ser inteligente e audaz nos momentos certos. Foi assim que Max Verstappen venceu o Grande Prémio do Japão e revalidou o título mundial numa época que até tinha começado mal.


O aparecimento de novos monolugares deixava antever uma temporada diferente e mais competitiva, mas o que se viu em pista foi mais do mesmo, ou seja, Max Verstappen continua imparável: venceu 12 corridas em 18 disputadas e foi ao pódio 14 vezes.

A maioria dos grandes prémios até foi bastante interessante, mas chegar a quatro provas do fim do campeonato com o título de pilotos decidido e o de construtores praticamente entregue não abona muito da competição. Verstappen e a Red Bull não têm culpa dos flops que foram a Mercedes e Ferrari, que jogam o mesmo campeonato tendo em conta os orçamentos e o nível dos pilotos. 

Campeão sem saber! 

O piloto neerlandês tem um jeito especial para ser campeão do mundo de forma quase dramática. Em 2021, ganhou o primeiro título na última volta do último grande prémio, em Abu Dhabi, e beneficiou do beneplácito do diretor de corrida. Este ano, foi bicampeão em circunstâncias bizarras.

A corrida de Suzuka realizou-se em condições adversas devido à chuva intensa, e só teve 28 voltas das 53 previstas, pelo que em condições normais não seria atribuída a pontuação máxima. Porém, uma lacuna no regulamento desportivo (descoberto por todos só agora) permitiu ao vencedor somar a totalidade dos pontos e sagrar-se bicampeão do mundo.

Foi ridículo ver o speaker oficial do grande prémio anunciar o novo campeão quando ninguém contava com isso, nem Verstappen, que a caminho do pódio perguntou várias vezes se era verdade. É um facto que no meio da confusão criada pela Federation Internationale de l’Automobile (FIA) destacou-se sempre o mais forte.

«O primeiro título é sempre mais emocional, mas o segundo é ainda mais bonito» sobre a confusão na atribuição dos pontos, Verstappen desvalorizou «para ser honesto, até achei bastante graça». Também é verdade que ao longo de 72 anos nunca a Fórmula 1 tinha sido tão maltratada pelos senhores da FIA como nos dois últimos anos. Coisa de amadores no campeonato mais profissional do desporto automóvel.  

A vida de Verstappen foi mais tranquila este ano devido à «ausência» do seu rival de estimação, Lewis Hamilton – não ganhou qualquer corrida até ao momento – e aos muitos disparates cometidos por Charles Leclerc e pela equipa Ferrari, pelo que o título é inteiramente merecido e justo.  Nos quatro primeiros grandes prémios houve equilíbrio entre a Red Bull e a Ferrari, com Verstappen e Leclerc a repartirem as vitórias. A partir dos GP dos EUA, o francês e a Ferrari eclipsaram-se por falta de andamento, despistes e estratégias de corrida que ninguém conseguiu entender, nem os pilotos da Scuderia… 

Indiferente às aselhices alheias, Verstappen revelou uma força imparável e ganhou 75 por cento das corridas realizadas. «A época tem sido incrível. Quando me disseram que iam ser atribuídos todos os pontos e que o Charles tinha sido penalizado ficou claro para mim que era o campeão. Depois da luta intensa no ano passado nunca pensei voltar a ter um carro forte e ser tão competitivo. Estou muito agradecido a todos os que contribuíram para este sucesso, aos que estão aqui e também a quem está na fábrica que trabalha bastante, nunca lhes falta motivação para tornar o carro melhor. O trabalho que fizemos com a Honda tem sido perfeito e vencer com eles duas vezes, especialmente aqui, é uma pressão positiva. Estou orgulhoso por ter sido campeão no Japão. Temos que manter as recordações deste ano, porque vai haver anos em que as coisas não vão correr tão bem» referiu. A época ainda não acabou, faltam quatro corridas, mas o foco é o mesmo «está a ser um ano especial e vamos trabalhar em equipa para ganhar o campeonato de construtores». 

Programado para vencer

Max Verstappen tem 25 anos e vem de uma família de pilotos. O seu pai, Jos Verstappen, disputou oito temporadas de Fórmula 1 nos anos 90 e fez algum furor mais pela condução rápida e exuberante do que pelos resultados (em 107 grandes prémios disputados fez dois pódios), e a sua mãe, Sophie-Marie Kumpen, foi campeã belga de karting.

Aos quatro anos, Verstappen já andava de quad e pediu ao pai um karting. Começou aí a história de um jovem que chegou à Fórmula 1 com 17 anos e se prepara para acabar com a era Lewis Hamilton. «A primeira vez que andou num kart de aluguer surpreendeu toda a gente ao ser o mais rápido, mostrou que estava à frente da sua idade» lembrou Jos Verstappen.

A forte personalidade que revela dentro e fora das pistas vem do seu pai, que lhe incutiu uma mentalidade ganhadora e a ideia de que iria ser campeão e dominar a Fórmula 1. Os métodos de aprendizagem foram por vezes duros. Jos recordou que a partir dos oito anos levava todas as semanas, depois da escola, o filho para andar uma pista de karting. Num dia de inverno, Max disse-lhe que queria parar porque estava com muito frio, a resposta do pai foi para se aquecer e continuar a conduzir.

«Tinha as mãos geladas e quase não aguentava o volante. Agora entendo a atitude dele, queria que eu aprendesse a resistir às contrariedades» reconheceu. Numa fase mais adiantada da formação, pai e filho percorriam mais de 100 mil quilómetros por ano por toda a Europa para que Max pudesse treinar e correr! Mas as histórias não acabam aqui. No campeonato do mundo de karting de 2013, Max foi chamado à atenção de forma veemente pelo pai à frente dos outros pilotos porque estava a conduzir mal, e devia ir para casa. A pressão funcionou e quando voltou à pista foi o mais rápido na qualificação, ganhou as semi-finais e foi campeão do mundo aos 15 anos.

Verstappen não está na Fórmula 1 para fazer amigos, embora seja dos pilotos mais seguidos nas redes sociais. Está para ganhar e sabe que tem de dar tudo de si sem hesitar, a vontade de vencer é a sua grande virtude, além, naturalmente, da capacidade para conduzir os carros mais rápidos e sofisticados do mundo.

Lutar contra tudo e todos

A sua frieza, raramente mostra sentimentos, a agressividade em pista, muitas vezes ultrapassa os limites para defender a posição, e a forma como encara as corridas e a vida mostram que é especial. Não é piloto de levantar o pé, prefere exceder os limites e arriscar uma saída de pista do que ficar em segundo lugar. Isso ficou bem evidente em 2021 na forma como enfrentou olhos nos olhos e sem pestanejar o heptacampeão do mundo, Lewis Hamilton. Se a Red Bull mantiver o nível competitivo, poderemos assistir à passagem de testemunho entre dois dos melhores pilotos de sempre.