O anúncio da mobilização parcial de cidadãos na Rússia e os referendos para a anexação de territórios ucranianos por parte do Presidente russo, Vladimir Putin, tiveram imediatamente repercussões em todo o mundo, seja com a reação de políticos como os Presidentes dos Estados Unidos ou da Ucrânia ou, até mesmo internas, com os cidadãos russos a lançarem petições contra esta iniciativa e a comprarem voos para abandonar a Rússia, tendo já esgotado os bilhetes para sair do país.
Durante a primeira Assembleia Geral das Nações Unidas desde que a Rússia invadiu a Ucrânia, o Presidente norte-americano, Joe Biden, descreveu a invasão russa na Ucrânia como uma “brutalidade desnecessária”, afirmando que é resultado das escolhas de um só homem: Putin. “Esta guerra é para extinguir o direito da Ucrânia de existir como um estado e como um povo, pura e simplesmente. Onde quer que esteja, onde quer que viva, independentemente do que acreditar… Isso deve fazer o seu sangue gelar”, disse Biden, citado pelo Guardian, acrescentando ainda que um país “não pode tomar o território de uma nação pela força”, continuou.
“A Ucrânia tem os mesmos direitos que pertencem a todas as nações soberanas. Seremos solidários com a Ucrânia, que se solidarizará contra a agressão da Rússia, ponto final”, concluiu o Presidente dos Estados Unidos.
Mesmo estando do outro lado das ameaças, o Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, relativizou as ameaças de Putin e desvalorizou o seu aviso que ia utilizar armas nucleares. “Não acredito que Putin vá usar armas nucleares. Não acho que o mundo vai permitir que use essas armas”, disse, citado pelo jornal inglês.
Zelensky acusou ainda Putin de querer “afogar a Ucrânia em sangue, inclusive no sangue de seus próprios soldados” e instou o ocidente a não se deixar levar pela “chantagem” da ameaça nuclear.
Os Estados Unidos já tinham alertado para as consequências de uma possível ofensiva nuclear.
“Haverá graves consequências. Não apenas será um pária no cenário mundial, mas também haverá consequências graves”, disse um dos porta-vozes da Casa Branca, John Kirby, em declarações à estação televisiva ABC, na primeira reação de Washington às decisões hoje anunciadas pelo Presidente russo Vladimir Putin.
O porta-voz também interpretou a mobilização das tropas como “um sinal definitivo de que a Rússia está a sofrer” na guerra na Ucrânia e a perder terreno.
O Presidente francês, Emmanuel Macron, acusou a Rússia de “provocar o regresso dos imperialismos e das colónias” na Europa com a invasão da Ucrânia, em fins de fevereiro.
“O que estamos a testemunhar desde 24 de fevereiro é um regresso à era dos imperialismos e das colónias. A França recusa essa ideia e irá obstinadamente procurar a paz”, frisou o chefe de Estado francês ao discursar na Assembleia Geral da ONU, em Nova Iorque. “Quem é hegemónico hoje senão a Rússia?”, questionou Macron.
O secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, criticou Putin por usar uma retórica nuclear “perigosa e imprudente”. “Vamos garantir que não haja mal-entendidos em Moscovo sobre como vamos reagir. Claro que depende do tipo de situação ou de que tipo de armas que eles podem usar. O mais importante é evitar que isso aconteça e isso é por que fomos tão claros nas nossas comunicações com a Rússia sobre as consequências sem precedentes”, disse o secretário-geral, citado pela Reuters.
Reações internas Depois do discurso de Putin, vários cidadãos russos, contra a sua decisão, decidiram tomar medidas e protestar. Várias dezenas de pessoas foram detidas em diversas cidades da Rússia por alegadamente participarem em protestos contra a mobilização de reservistas.
A organização de defesa dos direitos civis OVD-Info iniciou já a sua própria contabilização das manifestações e confirmou pelo menos 44 detenções, embora seja previsível que o número venha a aumentar, devido às convocatórias para novos protestos.
O Ministério Público de Moscovo já avisou que a participação em tais manifestações ou a mera difusão das respetivas convocatórias poderá constituir crime, já que a convocação dessas manifestações não foi coordenada com as autoridades pertinentes, que devem autorizar qualquer ação desse tipo. As autoridades russas não permitem qualquer concentração contrária às diretrizes do Governo.
Uma petição contra a mobilização, parcial ou total, na Rússia, que, entretanto, já reuniu mais de 179 mil assinaturas na plataforma Change.org, um número que disparou após as afirmações do Presidente russo.
“Nós, cidadãos da Rússia, homens e mulheres, pronunciamo-nos contra uma mobilização parcial ou geral. O presidente Vladimir Putin não tem, e não pode ter, fundamentos legais ou causas argumentadas e ponderadas para anunciá-la”, afirma a petição.
O texto acrescenta que os russos não estão dispostos a submeter os seus irmãos, filhos, maridos, pais e avós a perigos físicos e morais na “situação atual de incerteza”.
“Esta petição estará em vigor durante todo o período da operação militar especial no território da Ucrânia e até que termine”, acrescenta a petição, que adicionou dezenas de milhares de assinaturas nas últimas horas.
A notícia desencadeou ainda uma corrida aos bilhetes de avião para sair do país e, em poucos minutos, as viagens para destinos como Istambul, Erevan ou Baku, onde não é necessário apresentar um visto ficaram esgotadas.
Voos para países que ainda permitem a entrada de russos sem visto, nomeadamente a Turquia, Arménia, Geórgia e Sérvia, parecem estar com uma procura muito elevada, adianta a Reuters.
Algumas viagens com escalas, como a de Moscovo e Tbilisi, capital da Geórgia, também não estavam disponíveis, enquanto os voos mais baratos para Dubai custavam mais de 300 mil rublos (cerca de 5 mil euros), um valor que é aproximadamente cinco vezes o salário médio mensal de um russo, cita a agência de notícias.
As tarifas típicas de uma viagem de ida para a Turquia subiram para quase 70 mil rublos (cerca de 1150 euros), em comparação com pouco mais de 22 mil rublos (aproximadamente 363 euros) há uma semana, segundo dados do Google Flights.
O Kremlin ainda não clarificou se as fronteiras serão fechadas e pediu paciência aos seus cidadãos enquanto esta nova medida estava a ser revista por legisladores e o ministério do turismo da Rússia afirmou que ainda não existem restrições em relação a viagens.
Um dado também avançado pela Google revela que, na Rússia, as pesquisas por “como partir um braço” aumentaram exponencialmente após a notícia da mobilização parcial da população. Esta pode ser um dos “atalhos” que os russos poderão encontrar para não ter de servir no exército durante a invasão à Ucrânia.