Um livro para o Governo ler


Que se faça justiça a esta excecional iniciativa da Sedes, na melhor prática europeia de afirmação da sociedade que pensa o país para além da doutrina oficial e da espuma dos dias. 


A Sedes nasceu em pleno marcelismo em Dezembro de 1970 e, desde logo, se afirmou como Instituição associativa que iria antecipar o que a década de setenta e seguintes do século passado, iriam trazer à vida coletiva do nosso país, no plano político, económico e social.

E essa mensagem era resultado não apenas dos propósitos anunciados, mas essencialmente, das figuras que integravam os seus órgãos fundadores. De entre todos João Salgueiro, Magalhães Mota, Francisco Sá-Carneiro, Rui Machete, mas também Mário Murteira, José Vera Jardim, Vítor Constâncio, Rui Vilar, Marcelo Rebelo de Sousa e António Guterres.

Todos estariam no centro da política depois de 1974 e o protagonismo assumido revela a qualidade dos seus quadros e a existência de um manancial de ideias alternativas ao velho regime. Com altos e baixos de acordo com as vicissitudes da política e com a mobilização variável dos seus órgãos internos, a verdade é que a SEDES chegou a este tempo com surpreendente vitalidade e, se nem sempre as sugestões dela emanadas foram aproveitadas pelos decisores políticos, tem ficado à disposição do país um acervo de reflexões avulsas ou mesmo de elencagem sistemática de políticas alternativas em exaustivo detalhe, que qualquer sociedade gostaria de ter à  sua disposição, na especificidade de cada realidade. 

É o caso do recente trabalho sobre a ambição que o país deve assumir, de duplicar o PIB em 20 anos, não apenas para sair da pobreza relativa e dos rankings onde se manifesta o que tem sido a ausência de bom governo no nosso país – o que quer que isso seja globalmente apreciado – mas, essencialmente, porque importa mudar e muito as orientações de política geral para melhorar as condições de vida dos portugueses.

Este tema, o do crescimento do PIB, é da maior importância quando Portugal vive à sombra do turismo, cujos sobressaltos estão à mercê de crises cíclicas na economia mundial e nem assim consegue subir o salário mínimo e mudar o regime de pobreza averiguada do sistema remuneratório, da maior parte dos que trabalham em Portugal.
As soluções aqui minimamente referidas e apontadas, passam por “reduzir os custos cruciais e generalizados para as empresas”, designadamente o “custo da energia, dos transportes e da logística”; também uma “ampla reforma regulatória e de redução da burocracia, de diminuição dos custos do crédito e de melhoria da seleção de projetos pelo sistema bancário”.

A “ferrovia em bitola europeia” bem como o equilíbrio das contas públicas até 2033 são também indicações que influenciam o PIB português. No Trabalho, Educação, Saúde e Justiça, em quase todos os setores é o reformismo tantas das vezes clamado que perpassa nas páginas de abundante reflexão pragmática.

No livro pode ler-se: “Nos últimos vinte anos, o país tem-se revelado incapaz de acumular capital e de estimular o crescimento da produtividade do fator trabalho. Portugal tem investido pouco e mal” e “a despesa pública não teve um efeito multiplicador na dinâmica produtiva”. Em matéria de impostos sobre as empresas, a Sedes sugere a “eliminação de todas as derramas sobre o IRC; a eliminação imediata da taxa de IRC para “smart-ups passando a 15%, tal como em Espanha”. A passagem da taxa de IRC para 15% entre outras propostas, tenta controlar o sufoco em que instalaram as empresas no quadro fiscal. 

Segundo a SEDES como se altera este estado de coisas? “Portugal tem de produzir bens e serviços complexos que só os países desenvolvidos são capazes de idealizar e de produzir”. A alteração de leis laborais no sentido da “liberalização do mercado de trabalho”, recreando o “banco de horas”, outra das medidas preconizadas para mudar Portugal.

Pode no final e assim um livro mudar a política que não encontra uma cultura de reformismo e mudanças, algumas enumeradas, outras como a reforma da Lei Eleitoral, condição “sine qua non” para mudar o país? 

É evidente que não chega, nem nos iludamos. A qualidade dos autores desta proposta da Sedes, especialmente o seu Presidente Álvaro Beleza, Abel Mateus e Jorge Bleck, não chegará para levar a um sobressalto de tal modo substantivo, que o que aqui é dito impregne as decisões de reformas urgentes que o país precisa.

Que o livro seja lido pelo governo, sem abordagens dogmáticas  e juízos pré-concebidos, já não seria mau de todo.
Mas aqui se confessa a pouca fé. Um governo que põe sistematicamente no seu programa de governo a reforma da Lei Eleitoral e sistematicamente ignora as suas próprias “convicções” escritas perante o eleitorado, muito menos será capaz de perceber o tempo de medidas propostas pelas Sedes que eram para ontem.

Que ao menos se faça justiça a esta excecional iniciativa da Sedes, na melhor prática europeia de afirmação da sociedade que pensa o país para além da doutrina oficial e da espuma dos dias.

Covilhã, Setembro 2022

Um livro para o Governo ler


Que se faça justiça a esta excecional iniciativa da Sedes, na melhor prática europeia de afirmação da sociedade que pensa o país para além da doutrina oficial e da espuma dos dias. 


A Sedes nasceu em pleno marcelismo em Dezembro de 1970 e, desde logo, se afirmou como Instituição associativa que iria antecipar o que a década de setenta e seguintes do século passado, iriam trazer à vida coletiva do nosso país, no plano político, económico e social.

E essa mensagem era resultado não apenas dos propósitos anunciados, mas essencialmente, das figuras que integravam os seus órgãos fundadores. De entre todos João Salgueiro, Magalhães Mota, Francisco Sá-Carneiro, Rui Machete, mas também Mário Murteira, José Vera Jardim, Vítor Constâncio, Rui Vilar, Marcelo Rebelo de Sousa e António Guterres.

Todos estariam no centro da política depois de 1974 e o protagonismo assumido revela a qualidade dos seus quadros e a existência de um manancial de ideias alternativas ao velho regime. Com altos e baixos de acordo com as vicissitudes da política e com a mobilização variável dos seus órgãos internos, a verdade é que a SEDES chegou a este tempo com surpreendente vitalidade e, se nem sempre as sugestões dela emanadas foram aproveitadas pelos decisores políticos, tem ficado à disposição do país um acervo de reflexões avulsas ou mesmo de elencagem sistemática de políticas alternativas em exaustivo detalhe, que qualquer sociedade gostaria de ter à  sua disposição, na especificidade de cada realidade. 

É o caso do recente trabalho sobre a ambição que o país deve assumir, de duplicar o PIB em 20 anos, não apenas para sair da pobreza relativa e dos rankings onde se manifesta o que tem sido a ausência de bom governo no nosso país – o que quer que isso seja globalmente apreciado – mas, essencialmente, porque importa mudar e muito as orientações de política geral para melhorar as condições de vida dos portugueses.

Este tema, o do crescimento do PIB, é da maior importância quando Portugal vive à sombra do turismo, cujos sobressaltos estão à mercê de crises cíclicas na economia mundial e nem assim consegue subir o salário mínimo e mudar o regime de pobreza averiguada do sistema remuneratório, da maior parte dos que trabalham em Portugal.
As soluções aqui minimamente referidas e apontadas, passam por “reduzir os custos cruciais e generalizados para as empresas”, designadamente o “custo da energia, dos transportes e da logística”; também uma “ampla reforma regulatória e de redução da burocracia, de diminuição dos custos do crédito e de melhoria da seleção de projetos pelo sistema bancário”.

A “ferrovia em bitola europeia” bem como o equilíbrio das contas públicas até 2033 são também indicações que influenciam o PIB português. No Trabalho, Educação, Saúde e Justiça, em quase todos os setores é o reformismo tantas das vezes clamado que perpassa nas páginas de abundante reflexão pragmática.

No livro pode ler-se: “Nos últimos vinte anos, o país tem-se revelado incapaz de acumular capital e de estimular o crescimento da produtividade do fator trabalho. Portugal tem investido pouco e mal” e “a despesa pública não teve um efeito multiplicador na dinâmica produtiva”. Em matéria de impostos sobre as empresas, a Sedes sugere a “eliminação de todas as derramas sobre o IRC; a eliminação imediata da taxa de IRC para “smart-ups passando a 15%, tal como em Espanha”. A passagem da taxa de IRC para 15% entre outras propostas, tenta controlar o sufoco em que instalaram as empresas no quadro fiscal. 

Segundo a SEDES como se altera este estado de coisas? “Portugal tem de produzir bens e serviços complexos que só os países desenvolvidos são capazes de idealizar e de produzir”. A alteração de leis laborais no sentido da “liberalização do mercado de trabalho”, recreando o “banco de horas”, outra das medidas preconizadas para mudar Portugal.

Pode no final e assim um livro mudar a política que não encontra uma cultura de reformismo e mudanças, algumas enumeradas, outras como a reforma da Lei Eleitoral, condição “sine qua non” para mudar o país? 

É evidente que não chega, nem nos iludamos. A qualidade dos autores desta proposta da Sedes, especialmente o seu Presidente Álvaro Beleza, Abel Mateus e Jorge Bleck, não chegará para levar a um sobressalto de tal modo substantivo, que o que aqui é dito impregne as decisões de reformas urgentes que o país precisa.

Que o livro seja lido pelo governo, sem abordagens dogmáticas  e juízos pré-concebidos, já não seria mau de todo.
Mas aqui se confessa a pouca fé. Um governo que põe sistematicamente no seu programa de governo a reforma da Lei Eleitoral e sistematicamente ignora as suas próprias “convicções” escritas perante o eleitorado, muito menos será capaz de perceber o tempo de medidas propostas pelas Sedes que eram para ontem.

Que ao menos se faça justiça a esta excecional iniciativa da Sedes, na melhor prática europeia de afirmação da sociedade que pensa o país para além da doutrina oficial e da espuma dos dias.

Covilhã, Setembro 2022