É consensual entre os líderes dos bancos centrais das economias avançadas que estamos a entrar num novo tempo económico. Chamam-lhe “a era da grande volatilidade” e é uma realidade oposta à que vivemos nos últimos anos – que ficará na história pela conjugação improvável de juros baixos, pleno emprego, inflação insignificante e crescimento económico mundial.
Agora os ventos mudaram. A pandemia, que fez o seu caminho num clima de dinheiro barato e procura intensa de bens de consumo, provocou enormes dirupções nas cadeias de abastecimento globais. As pressões inflacionistas começariam, mas não terminariam, aí. Em fevereiro deste ano, a bárbara invasão da Ucrânia por parte da Rússia provocou uma tragédia humanitária de proporções inimagináveis na Europa e um aumento brutal no custo das matérias-primas. As ondas de choque sentiram-se em todas as latitudes económicas.
Crise inflacionista. Crise energética. Crise alimentar. A tripla crise em que vivemos criou muitas nuvens negras no horizonte de nações, empresas e famílias.
E são os próprios banqueiros centrais mais poderosos do mundo a admitir que encontrar um novo equilíbrio para a estabilidade de preços – isto é, controlar a inflação – não será fácil, nem imediato.
A mensagem é evidente: a vida para a maioria das pessoas nos próximos tempos será mais violenta, injusta e imprevisível.
Com uma pequena economia muito exposta ao exterior, altamente endividada e a precisar de reformas como de pão para a boca, mais cedo do que tarde Portugal tende a pagar com juros altos as crises globais.
Gostaria de estar errado, mas temo que Portugal volte a não ser uma exceção.
Com uma inflação historicamente alta, os rendimentos a serem engolidos e a carestia de vida a democratizar-se, as famílias e as empresas portuguesas já estão a passar por grandes dificuldades.
Para fazer face às necessidades do presente, o governo tem acenado com a preparação de um pacote de medidas para o futuro – que, dizem, será conhecido algures lá para meio de setembro.
Isso não é suficiente. As pessoas precisam de ajuda. E precisam de ajuda agora.
A crise mastodôntica que nos caiu em cima não se resolverá nem com o voluntarismo de medidas tomadas em cima do joelho, nem com planos políticos perfeitos (coisa que nunca existiu), produtos do racionalismo radical e que na maioria das vezes mais não são mais do que formas encapotadas de burocratização e procrastinação política.
Esta é uma crise sem precedentes. Os decisores políticos em qualquer nível da administração do Estado devem, com humildade, reconhecer que não têm fórmulas mágicas para a tratar. Mas uma coisa é agir com humildade e prudência sobre a realidade. Outra coisa, bem diferente, é ficar paralisado por ela. Precisamente por ausência de ação visível, o Governo está a criar na sociedade portuguesa a ideia que não tem força nem capacidade para tamponar a crise e proteger as pessoas.
Isto é perigoso. É perigoso porque as empresas e as famílias se sentem abandonadas e não encontram referenciais de liderança e de esperança. É perigoso para o Governo, relativamente ao qual os portugueses começam a ter legitimas dúvidas sobre a capacidade de liderança e vigor executivo. É perigoso para o país, que precisa de um governo forte num tempo de instabilidade crítica. E é perigoso, por fim, para o sistema democrático como um todo.
Como sempre aqui tenho defendido, estas não são alturas para disputar responsabilidades. Todos os líderes têm de cooperar para dar respostas aos anseios e emergências das famílias. Em Cascais temos vindos preparar durante o Verão um fortíssimo plano social preparado para ser complemento ao programa que o Governo anunciará em setembro, com medidas a implementar num calendário que ainda não é claro.
Porém, entendo que as pessoas não podem esperar mais. Com mais um ano letivo à porta, e que se traduz num esforço tremendo das famílias para manter as crianças e jovens na escola, o Estado Providência tem de dizer presente.
Cascais, como eu sempre garanti, ergueu nos últimos um Estado Social Local robusto, proteção para todos os que se encontrem em dificuldade. Nacionais ou estrangeiros, refugiados da Ucrânia ou vizinhos do outro lado da rua. Porque mais apoio de circunstância para uns nunca significou perda de apoios de longo prazo para outros. Somos uma sociedade solidária que encontra um sentido e um propósito quando não deixamos nenhum dos nossos para trás.
Assim, para a próxima Reunião de Câmara de dia 6 de setembro já está agendado um reforço muito substancial de verbas que vão suportar programas nas áreas do apoio social, da educação e da saúde. É um programa ambicioso de proteção social que se estenderá à classe média, a mais sacrificada nas crises – e desta vez não será, infelizmente, exceção – e apontado aos mais jovens e aos mais idosos.
Como exemplo desta nova vaga de políticas públicas capazes de se constituírem como rede de segurança para as famílias, lançaremos um programa de bolsas académicas para apoiar os estudantes de Cascais no ensino superior e, sem prejuízo do que venha a ser o compromisso do Governo para as creches, daremos às jovens famílias cascalenses já em setembro a oportunidade de colocarem as suas crianças em creches privadas, quando o público não der resposta, suportando uma parte substancial da mensalidade. E porque a garantia da dignidade na dificuldade é um fator crítico para a manutenção da coesão social, lançaremos um programa alimentar aberto a todos os cascalenses em necessidade, na esperança de que seja uma política transitória e de curta duração. Também não deixaremos de combater o esforço das famílias no controlo de custos energéticos com especial incidência sobre o gás e a electricidade.
Definimos já no passado as prioridades nos apoios e continuamos a considerar os que estão mais fragilizados, mais novos e mais velhos, alargando os apoios a escalões superiores de rendimentos.
Este tempo, o tempo da “grande volatilidade”, exige escolhas difíceis. As pessoas não esperam que os políticos acertem sempre. Mas esperam, legitimamente, que as suas lideranças lhes apontem um caminho, lhes induzam esperança, ajam sobre os problemas e mostrem empatia e compreensão pelas dificuldades do cidadão comum. As pessoas penalizam menos uma liderança que erra ao tentar do que aquela que ao tentar fazer tudo bem se esconde, se afasta e finge que os problemas se resolvem com declarações bem-intencionadas.
A proximidade e o vigor executivo, a par da humildade, são armas para combater a crise, em todos os níveis da administração do Estado.
Presidente da Câmara Municipal de Cascais
Escreve à quarta-feira