Menores têm direito a sigilo sobre saúde sexual. O que está em causa?

Menores têm direito a sigilo sobre saúde sexual. O que está em causa?


Parecer consta de recomendação alargada do Conselho de Ética sobre consentimento informado de jovens. 


O Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV) defende que os menores de idade têm direito a sigilo médico sobre a sua saúde sexual mas também sessões de psicologia, não existindo por regra o “direito à curiosidade por parte dos progenitores”. O parecer consta de um documento mais amplo, publicado pelo CNECV em julho, e que abordou a questão do consentimento informado por parte de jovens à luz da legislação portuguesa, publicando um “fluxograma” para apoiar a decisão em situações que, lê-se no documento, podem ser complexas.  

O que dizem? Os conselheiros assinalam que o Código Penal prevê que o Consentimento Informado para a realização de intervenções ou atos médico-cirúrgicos seja eficaz quando prestado pelo menor a partir dos 16 anos de idade, “que possua em concreto o discernimento necessário para avaliar o sentido e alcance da sua decisão.” Abaixo dessa idade, é obrigatório o consentimento dos representantes legais. 

Há exceções: mesmo crianças mais novas podem vetar ser dadoras. Também nas questões de saúde sexual e reprodutiva, “em áreas de forte intimidade que não impliquem risco de vida ou para a saúde do menor”, deve ser respeitada a relação terapêutica direta entre o profissional de saúde e adolescente, com a devida privacidade e confidencialidade, escreve o CNECV, considerando que isto se aplica a jovens em idade fértil, sem limite de idade.

Remete para a Lei n.º 3/84, que regulamentou a educação sexual e planeamento familiar e estabelece o dever de sigilo em consultas, não estabelecendo limite etário. 

Pais podem ser suspensos Abordando situações de desacordo entre profissionais de saúde e os representantes legais ou entre pais e filhos, o CNECV emite orientações gerais, defendendo que em alguns pontos a legislação deve ser “densificada”. 

No caso de intervenções inadiáveis em que os pais não estejam de acordo com os profissionais, entende o CNECV que a situação deve ser comunicada ao tribunal. E se for inadiável e imprescindível para salvaguardar a vida ou a saúde do menor, e caso os seus representantes recusem consentimento, “deverá ser solicitada, nos termos legais, a suspensão temporária do exercício das responsabilidades parentais, pelo tempo necessário”, defende o CNECV. Já quando a intervenção não for considerada imprescindível, o profissional deverá respeitar-se a posição dos representantes.

Nos casos de desacordo entre os pais, a orientação do CNECV é  que atos “de rotina” poderão ser consentidos apenas por um e que atos “major”, “com riscos importantes”, devem sê-lo por ambos. Em última instância, estes casos devem ser remetidos às comissões de menores ou justiça. É nos casos em que os menores estão de acordo ou em desacordo com os profissionais ou pais e têm 16 ou 17 anos e discernimento que o CNECV entende que a lei deve se clarificada, para garantir o “direito de veto do menor e reforço da sua autonomia”. Caso a intervenção seja imprescindível e inadiável, deve ser realizada “seguindo o princípio da benevolência” e comunicada a tribunal.  

É no fim do parecer que se aborda a confidencialidade. Admitindo que “regra geral” os pais devem ter acesso à informação, o conselho considera que “existem áreas nas quais, em regra, vale o direito à confidencialidade do menor em relação aos representantes legais, com capacidade de discernimento, designadamente em matéria de saúde sexual e reprodutiva, intervenção nos comportamentos aditivos, bem como no caso de intervenções psicológicas e psiquiátricas e ainda respostas a questionários ou a provas de avaliação psicológica”. 

Ainda assim, em circunstâncias em que o profissional entenda que a revelação aos pais é necessária, deverá fazê-lo “dando conhecimento prévio” aos jovens, recomendam. “Nenhum conflito entre os progenitores pode justificar privar um deles da informação sobre o menor”, lê-se ainda no parecer, que não tem carácter vinculativo.

“O que se quer evitar é que as pessoas não vão ao médico com medo de que o pai ou a mãe saibam e depois possam ter problemas em casa”, defendeu a presidente do CNECV, Maria do Céu Patrão Neves, ao Público.