Ucrânia. O Kremlin agora quer ir para lá do Donbass

Ucrânia. O Kremlin agora quer ir para lá do Donbass


O ministro dos Negócios Estrangeiros justificou a mudança dos planos russos com a chegada de armamento de longo alcance vindo da NATO.


O Kremlin, concluída a conquista de Lugansk, mostra-se ambicioso. E agora quer expandir ainda mais o território que conquistou na Ucrânia para lá do anterior objetivo de tomar o Donbass – composto pelos oblast Lugansk e Donetsk – e visando também “Kherson, Zaporizhzhia e uma série de outros territórios”, anunciou na quarta-feira o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov. Que justificou esta alteração dos planos do Kremlin com a entrega de armamento de longo alcance vindo da NATO ao Governo de Volodymyr Zelensky.

“Não podemos permitir que a parte da Ucrânia controlada por Zelensky possua armas que são uma ameaça direta ao nosso território”, salientou Lavrov, numa entrevista ao canal RT. Referia-se em particular à chegada das baterias móveis de mísseis americanas M142 HIMARS, capazes de atingir alvos a mais de 80km.

Este armamento – que enervou notoriamente o regime de Vladimir Putin, tendo até o ministro da Defesa, Sergei Shoigu, ordenado que a sua destruição fosse a prioridade dos militares russos – tem sido utilizado pela Ucrânia para atingir a retaguarda das forças russas. Visando pontos logísticos estratégicos ou depósitos de munições, procurando neutralizar a enorme vantagem da Rússia no que toca à artilharia.

No entanto, com as munições certas, os M142 HIMARS poderiam atingir alvos a uns incríveis 480 km de distância, bem dentro do território da Rússia. Daí que a Administração americana se tenha recusado publicamente a enviar munições com esse alcance ao Governo da Ucrânia, não fosse este sentir-se tentado a atingir a Rússia. Ou para não servir de desculpa para o Kremlin intensificar ainda mais a sua agressão, como parece estar a suceder agora.

A conquista de ainda mais território no sul e leste da Ucrânia é um “processo que está a continuar logicamente e persistentemente”, garantiu o ministro dos Negócios Estrangeiros. De facto, as forças russas conseguiram fazer alguns avanços nas últimas semanas, sobretudo com a queda de Severodonetsk e de Lysychansk, mas muito lenta e custosamente. O conflito virou guerra de atrito, com os militares russos a esmagarem sistematicamente com artilharia tudo no seu caminho. Contudo, a este ritmo pensa-se que demoraria anos para conquistarem o país todo, ou até sequer as áreas declaradas como alvo por Lavrov.

Enquanto isso, isso a expectativa da Ucrânia seria continuar a receber armamento pesado vindo da NATO, para alterar o equilíbrio de forças. Mas isso só tornará a Rússia ainda mais ambiciosa, prometeu o seu ministro dos Negócios Estrangeiros.

“Se o Ocidente continuar a encher a Ucrânia de armamento, devido à sua raiva impotente ou ao desejo de exacerbar a situação, então isso significa que as nossas tarefas geopolíticas irão ter de ir ainda mais além”, prometeu Lavrov.

As ameaças do Kremlin surgem no dia seguinte à Casa Branca alertar que a Rússia estava a tentar avançar com a anexação do seu território conquistado no oblast – uma divisão administrativa equivalente aos nossos distritos – de Kherson, no sul. Seguindo o mesmo guião utilizado na península da Crimeia.

Há muito que as forças russas têm tentado forçar a população desta região a adoptar o rublo como moeda, colocando no poder local representantes políticos ucranianos pró-Rússia, escolhidos a dedo pelo Kremlin. A perspetiva seria de em breve fazer um “referendo fraudulento” à anexação de Kherson pela Rússia, nas palavras do porta-voz do Conselho Nacional de Segurança dos EUA, John Kirby.