Regionalização: referendo seria a primeira derrota eleitoral de Costa


Se houver referendo sobre a regionalização, Costa sabe que perde, por isso só finge que o quer.


1. A regionalização em Portugal vai ficar congelada por mais uns anos, o que é saudável. António Costa diz que vai levar por diante o referendo em 2024, o que Montenegro considerou inoportuno. Seria a primeira derrota eleitoral do PS de Costa, pelo que é pouco provável que convoque a consulta. Sabendo-se o seu taticismo, é de apostar que irá, ele próprio, airosamente, descalçar a bota. Agora, finge que quer. Mais à frente, há de virar o bico ao prego, atirando as culpas a outrem. Mesmo quem, não sendo do PS, defenda a regionalização sabe de antemão que o modelo de António Costa não vai dar certo, porque tudo em que mexe estruturalmente piora. Certos puristas lembram que a regionalização está constitucionalizada. É verdade! Mas também lá estão a saúde tendencialmente gratuita e o direito à habitação. E já esteve, e tiraram e muito bem, a irreversibilidade das nacionalizações. Uma regionalização fará sempre crescer a classe política nacional que tem um forte índice de indigência intelectual e de incapacidade executiva. Portugal é uma nação bastante homogénea no seu continente. Por isso, uma descentralização feita com racionalidade permitiria governar uma população igual à da região de Paris. Além disso, já temos regiões autónomas nos Açores e Madeira que pesam muito e trazem pouco ao orçamento da República. É verdade que há países continentais regionalizados e que são mais pequenos do que o nosso. No entanto, têm uma história que o justifica e impõe. Os nossos governos tiveram muitos chefes de fora de Lisboa que nunca fizeram da regionalização uma prioridade. Salazar era de Santa Comba, Sá Carneiro do Porto, Cavaco Silva do Algarve, Sócrates tinha raízes beirãs, Passos nasceu em Coimbra com família em Vila Real. Nunca se lhes ouviu grandes encómios à regionalização. Talvez por terem consciência da desgraça que seria um crescimento exponencial da classe política.

2. Nos últimos tempos verificaram-se alguns movimentos na comunicação social com a aquisição e venda de posições. Uma delas sucedeu com o Nascer do Sol e o i, adquiridos pelo mesmo grupo que recentemente tomou conta da Euronews, uma organização noticiosa audiovisual de escala mundial. O Nascer do Sol e o i são marcos de uma comunicação social resiliente e não vinculada a interesses fora dos média, o que não acontece com praticamente mais nenhum órgão de comunicação social em Portugal. Mário Ramires e a sua equipa mostraram que, sendo difícil, há um caminho de independência que é possível manter. É desejável e expectável que agora se criem melhores condições para continuar esse difícil exercício de liberdade. As movimentações em curso na comunicação social são também um sinal de que os média, nas suas diversas facetas e plataformas, não estão afinal desinteressantes para investidores. Mais do que nunca a sociedade portuguesa precisa de uma comunicação social forte e descomplexada politicamente. Recentemente, fez três anos a Rádio Observador que se situa num campo ideológico conservador, sem deixar de fazer bom jornalismo. No fundo, é uma TSF de outro quadrante, só que feita com competência, rigor e inovação. Obviamente, ganhou a Rádio Observador, ouvida da esquerda à direita. Faz um pleno que a TSF só conseguiu enquanto o espírito de Emídio Rangel pairou na estação. E, a propósito, lá vai passar mais um ano sem a condecoração presidencial do jornalista que mais reformou a comunicação social portuguesa, dirigindo a TSF e a SIC toda.

 

3. A propósito de imprensa, é bom lembrar que há em Portugal um vasto mundo de jornais regionais. Trazem histórias que não são a mera repetição sucessiva de manchetes dos grandes diários, de estudos de organismos de toda a espécie que são fornecidos em primeira mão a jornalistas escolhidos, de comunicados totalmente trabalhados ou de notícias e fotos da Lusa. Os jornais regionais são como tudo. Há do bom e do mau. Os maus são aqueles que independentemente de quem ocupar o poder local estão sempre a seu favor. Os bons são mais raros e estão sempre no papel ativo de denunciar o que está mal, seja quem for que ocupe o poder político ou económico na sua zona. Para estes a vida nunca é fácil. Ainda agora se viu com o jornal de Barcelos. Durante anos denunciou o faroeste lá da terra com um autarca socialista de má memória e a contas com a justiça. A Câmara mudou para um social democrata, mas a postura do jornal manteve-se, não vergando a espinha, até mesmo perante casos que metem outra inevitável instituição: a Igreja. Como Barcelos não é Washington, o dono comunicou à redação o fecho da publicação, o que – a confirmar-se – vai fazer muita falta à democracia. 

 

4. Uma terceira nota sobre a comunicação social prende-se com as desavenças pessoais entre donos de grupos, como a Cofina e a Média Capital. O Correio da Manhã ataca sistematicamente o dono da TVI, Mário Ferreira, que se defende no seu canal. A SIC aproveita e dá voz a uma desabrida Ana Gomes que também carrega em cima de Mário Ferreira em vez de ela própria explicar a história da sua casa ilegal em Sintra que, ainda por cima, tentou vender sem ter tudo resolvido, o que é feio. No jornalismo não deve haver intocáveis. Mesmo assim, percebe-se que haja algum recato com os acionistas, embora não tanto como tradicionalmente no Público, que nunca deu uma notícia incómoda sobre a Sonae. Como diz o outro, uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. 

 

5. Boris Johnson vai mesmo sair de Downing Street, embora não de imediato. A criatura foi uma catástrofe ambulante, um exibicionista, um mentiroso compulsivo, apanhado em todas as curvas. Ao Reino Unido Johnson não deixa nada, nem mesmo o Brexit relativamente ao qual nunca se percebeu se era a favor ou contra. Johnson foi a direita conservadora apalhaçada e Jeremy Corbyn a esquerda anquilosada cheia de laivos marxistas. Constituíram a pior dupla de candidatos a primeiro-ministro de que há memória na Inglaterra. Ganhou o menos mau. Alguém disse que Johnson conseguiu o feito de obter a demissão de três primeiros-ministros: Cameron, Theresa May e ele próprio. É obra!

 

6. José Eduardo dos Santos morreu em paz, mas com peixeirada familiar e nacional da porta do quarto para fora. Era tratado com carinho por Zédu pelos seus admiradores e por nomes impublicáveis pelos muitos mais que, com razão, o detestavam. Sucessor de Agostinho Neto, inspirou Yelstin e Putin na forma de criar uma oligarquia financeira na qual deixou a família fazer gigantescos negócios, enquanto os angolanos morriam como tordos da guerra e de fome. Mesmo assim, Zédu era menos sanguinário do que gente como Savimbi – que sempre desejou e conseguiu eliminar -, ganhando a guerra. A partir daí fez uma relativa abertura que lhe vale o epíteto de Arquiteto da Paz. Fez transições difíceis: a sucessão de Neto e a do fim da guerra sem excessos de vinganças. Já a sua própria correu mal. Apostou em João Lourenço que logo dele se distanciou, perseguindo a família Santos que substituiu por uns amigalhaços. A perfídia de Lourenço ficou bem patente quando, há dias, assegurou o óbvio ao dizer que qualquer angolano pode regressar ao país sempre que entender. Falava dos filhos de Zédu (em que avulta uma exaltada e egocêntrica Tchizzé) dizendo que podiam ir ao funeral do pai a Angola, se ele for lá sepultado. Só não explicou que sair é bem mais complicado e não deu na altura garantia nenhuma disso, o que só fez mais tarde, eventualmente sem base legal para isso. Numa coisa Zédu foi coerente: nunca soube rodear-se bem e educar as suas criancinhas. Mas combateu pela descolonização de Angola, o que faz dele um herói entre muitos. 

Regionalização: referendo seria a primeira derrota eleitoral de Costa


Se houver referendo sobre a regionalização, Costa sabe que perde, por isso só finge que o quer.


1. A regionalização em Portugal vai ficar congelada por mais uns anos, o que é saudável. António Costa diz que vai levar por diante o referendo em 2024, o que Montenegro considerou inoportuno. Seria a primeira derrota eleitoral do PS de Costa, pelo que é pouco provável que convoque a consulta. Sabendo-se o seu taticismo, é de apostar que irá, ele próprio, airosamente, descalçar a bota. Agora, finge que quer. Mais à frente, há de virar o bico ao prego, atirando as culpas a outrem. Mesmo quem, não sendo do PS, defenda a regionalização sabe de antemão que o modelo de António Costa não vai dar certo, porque tudo em que mexe estruturalmente piora. Certos puristas lembram que a regionalização está constitucionalizada. É verdade! Mas também lá estão a saúde tendencialmente gratuita e o direito à habitação. E já esteve, e tiraram e muito bem, a irreversibilidade das nacionalizações. Uma regionalização fará sempre crescer a classe política nacional que tem um forte índice de indigência intelectual e de incapacidade executiva. Portugal é uma nação bastante homogénea no seu continente. Por isso, uma descentralização feita com racionalidade permitiria governar uma população igual à da região de Paris. Além disso, já temos regiões autónomas nos Açores e Madeira que pesam muito e trazem pouco ao orçamento da República. É verdade que há países continentais regionalizados e que são mais pequenos do que o nosso. No entanto, têm uma história que o justifica e impõe. Os nossos governos tiveram muitos chefes de fora de Lisboa que nunca fizeram da regionalização uma prioridade. Salazar era de Santa Comba, Sá Carneiro do Porto, Cavaco Silva do Algarve, Sócrates tinha raízes beirãs, Passos nasceu em Coimbra com família em Vila Real. Nunca se lhes ouviu grandes encómios à regionalização. Talvez por terem consciência da desgraça que seria um crescimento exponencial da classe política.

2. Nos últimos tempos verificaram-se alguns movimentos na comunicação social com a aquisição e venda de posições. Uma delas sucedeu com o Nascer do Sol e o i, adquiridos pelo mesmo grupo que recentemente tomou conta da Euronews, uma organização noticiosa audiovisual de escala mundial. O Nascer do Sol e o i são marcos de uma comunicação social resiliente e não vinculada a interesses fora dos média, o que não acontece com praticamente mais nenhum órgão de comunicação social em Portugal. Mário Ramires e a sua equipa mostraram que, sendo difícil, há um caminho de independência que é possível manter. É desejável e expectável que agora se criem melhores condições para continuar esse difícil exercício de liberdade. As movimentações em curso na comunicação social são também um sinal de que os média, nas suas diversas facetas e plataformas, não estão afinal desinteressantes para investidores. Mais do que nunca a sociedade portuguesa precisa de uma comunicação social forte e descomplexada politicamente. Recentemente, fez três anos a Rádio Observador que se situa num campo ideológico conservador, sem deixar de fazer bom jornalismo. No fundo, é uma TSF de outro quadrante, só que feita com competência, rigor e inovação. Obviamente, ganhou a Rádio Observador, ouvida da esquerda à direita. Faz um pleno que a TSF só conseguiu enquanto o espírito de Emídio Rangel pairou na estação. E, a propósito, lá vai passar mais um ano sem a condecoração presidencial do jornalista que mais reformou a comunicação social portuguesa, dirigindo a TSF e a SIC toda.

 

3. A propósito de imprensa, é bom lembrar que há em Portugal um vasto mundo de jornais regionais. Trazem histórias que não são a mera repetição sucessiva de manchetes dos grandes diários, de estudos de organismos de toda a espécie que são fornecidos em primeira mão a jornalistas escolhidos, de comunicados totalmente trabalhados ou de notícias e fotos da Lusa. Os jornais regionais são como tudo. Há do bom e do mau. Os maus são aqueles que independentemente de quem ocupar o poder local estão sempre a seu favor. Os bons são mais raros e estão sempre no papel ativo de denunciar o que está mal, seja quem for que ocupe o poder político ou económico na sua zona. Para estes a vida nunca é fácil. Ainda agora se viu com o jornal de Barcelos. Durante anos denunciou o faroeste lá da terra com um autarca socialista de má memória e a contas com a justiça. A Câmara mudou para um social democrata, mas a postura do jornal manteve-se, não vergando a espinha, até mesmo perante casos que metem outra inevitável instituição: a Igreja. Como Barcelos não é Washington, o dono comunicou à redação o fecho da publicação, o que – a confirmar-se – vai fazer muita falta à democracia. 

 

4. Uma terceira nota sobre a comunicação social prende-se com as desavenças pessoais entre donos de grupos, como a Cofina e a Média Capital. O Correio da Manhã ataca sistematicamente o dono da TVI, Mário Ferreira, que se defende no seu canal. A SIC aproveita e dá voz a uma desabrida Ana Gomes que também carrega em cima de Mário Ferreira em vez de ela própria explicar a história da sua casa ilegal em Sintra que, ainda por cima, tentou vender sem ter tudo resolvido, o que é feio. No jornalismo não deve haver intocáveis. Mesmo assim, percebe-se que haja algum recato com os acionistas, embora não tanto como tradicionalmente no Público, que nunca deu uma notícia incómoda sobre a Sonae. Como diz o outro, uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. 

 

5. Boris Johnson vai mesmo sair de Downing Street, embora não de imediato. A criatura foi uma catástrofe ambulante, um exibicionista, um mentiroso compulsivo, apanhado em todas as curvas. Ao Reino Unido Johnson não deixa nada, nem mesmo o Brexit relativamente ao qual nunca se percebeu se era a favor ou contra. Johnson foi a direita conservadora apalhaçada e Jeremy Corbyn a esquerda anquilosada cheia de laivos marxistas. Constituíram a pior dupla de candidatos a primeiro-ministro de que há memória na Inglaterra. Ganhou o menos mau. Alguém disse que Johnson conseguiu o feito de obter a demissão de três primeiros-ministros: Cameron, Theresa May e ele próprio. É obra!

 

6. José Eduardo dos Santos morreu em paz, mas com peixeirada familiar e nacional da porta do quarto para fora. Era tratado com carinho por Zédu pelos seus admiradores e por nomes impublicáveis pelos muitos mais que, com razão, o detestavam. Sucessor de Agostinho Neto, inspirou Yelstin e Putin na forma de criar uma oligarquia financeira na qual deixou a família fazer gigantescos negócios, enquanto os angolanos morriam como tordos da guerra e de fome. Mesmo assim, Zédu era menos sanguinário do que gente como Savimbi – que sempre desejou e conseguiu eliminar -, ganhando a guerra. A partir daí fez uma relativa abertura que lhe vale o epíteto de Arquiteto da Paz. Fez transições difíceis: a sucessão de Neto e a do fim da guerra sem excessos de vinganças. Já a sua própria correu mal. Apostou em João Lourenço que logo dele se distanciou, perseguindo a família Santos que substituiu por uns amigalhaços. A perfídia de Lourenço ficou bem patente quando, há dias, assegurou o óbvio ao dizer que qualquer angolano pode regressar ao país sempre que entender. Falava dos filhos de Zédu (em que avulta uma exaltada e egocêntrica Tchizzé) dizendo que podiam ir ao funeral do pai a Angola, se ele for lá sepultado. Só não explicou que sair é bem mais complicado e não deu na altura garantia nenhuma disso, o que só fez mais tarde, eventualmente sem base legal para isso. Numa coisa Zédu foi coerente: nunca soube rodear-se bem e educar as suas criancinhas. Mas combateu pela descolonização de Angola, o que faz dele um herói entre muitos.