Por José Miguel Pires e Felícia Cabrita
Eduardo Cabrita, antigo ministro da Administração Interna, não vai mesmo a julgamento no caso do atropelamento de um trabalhador na autoestrada A6 pela viatura em que seguia e que era conduzida pelo seu motorista, em junho de 2021.
Após a acusação do Ministério Público – apenas contra o motorista que conduzia o automóvel –, o advogado da mulher e filhas da vítima e a Associação dos Cidadãos Auto-Mobilizados (ACA-M), que são assistentes (ofendidos) no caso, apresentaram pedidos de abertura de instrução, pretendendo responsabilizar também o ex-ministro da Administração Interna e Nuno Dias, elemento do Corpo de Segurança Pessoal da PSP.
A juíza Sílvia Petronilho, do Juízo de Instrução de Évora, a quem foi sorteado o processo, decidiu, porém, que nenhum dos assistentes imputa factos em concreto para que isso se possa fazer, não tendo por isso admitido esses pedidos.
No despacho datado de 24 de junho, a que o i teve acesso, a juíza conclui que, nos requerimentos apresentados, para pronúncia dos arguidos Nuno Dias e Eduardo Cabrita, “não foram imputados aos mesmos os factos necessários ao apuramento da sua culpa, não podendo tal omissão factual ser suprimida através do mecanismo da alteração não-substancial dos factos sob pena de violação do princípio da vinculação temática do tribunal”. “Donde, a realização da instrução constituiria um ato inútil”, conclui.
Cabrita na ‘corda bamba’ O Ministério Público começou por deduzir acusação neste caso apenas contra o motorista que conduzia a viatura, tendo Cabrita sido então ouvido como testemunha.
Na altura, o Nascer do SOL noticiou que o despacho de acusação continha erros factuais, principalmente quando afirmava que no carro do ministro seguiam cinco pessoas (quando apenas iam quatro) e que uma delas era Rogério Moleiro, segurança de Cabrita (quando este seguia atrás, cumprindo ordens, numa segunda viatura da comitiva).
A ACA-M considerou, após consulta dos autos, que existiam provas suficientes para corresponsabilizar o ex-ministro pelo mesmo crime de homicídio por negligência e avançou com um pedido de intervenção hierárquica do diretor do Departamento de Investigação e Ação Penal de Évora. Este deu-lhe razão e reabriu o caso, tendo ordenado à procuradora titular do inquérito que constituísse como arguidos, e os inquirisse, Eduardo Cabrita e o respetivo chefe da segurança pessoal.
A magistrada do MP acabou por assumir os erros revelados pelo Nascer do SOL, retificando-os, e chamou Eduardo Cabrita, constituindo-o arguido. No final, porém, a apreciação voltou a ser a mesma e o despacho de acusação, deduzido em maio passado, continuou a responsabilizar apenas o motorista: Marco Pontes foi acusado de homicídio por negligência.
Contextualização A viatura oficial em que seguia Eduardo Cabrita, há praticamente um ano, altura em que ainda era ministro da Administração Interna, atropelou mortalmente Nuno Santos, trabalhador que fazia manutenção da A6, ao quilómetro 77,6 da via, no sentido Estremoz-Évora.
Em dezembro de 2021, o MP acusou Marco Pontes, motorista de Eduardo Cabrita, de homicídio por negligência. Nesse mesmo dia, o então ministro da Administração Interna apresentou a sua demissão do cargo.