A arte da mistificação


As colunas de Sir Christopher Wren não chegavam ao tecto, porque desnecessário era; as colunas-estalactites de António Costa não chegam ao chão, como necessário seria.  Dos treze países do alargamento, oito já nos ultrapassaram e só cinco estão atrás de nós. Para quem prometia crescimento, que melhor símbolo da arte da mistificação?


Sir Christopher Wren foi um dos mais insignes arquitectos ingleses, responsável pela construção ou reabilitação de dezenas de conhecidos palácios, edifícios governamentais, hospitais e igrejas após o grande incêndio de Londres de 1666. A sua obra-prima, St. Paul’s Cathedral, testemunha o seu talento. 

Conta-se que em 1688, tendo-lhe sido adjudicado o projecto do edifício da Prefeitura da Cidade de Westminster, o prefeito discordou da segurança da construção e, temendo que o segundo andar desabasse, exigiu ao arquitecto mais duas colunas de apoio.

Sir Christopher Wren combinava o essencial das suas convicções estéticas com a arte de agradar ao cliente e erigiu as duas colunas adicionais. O prefeito ficou satisfeito e orgulhoso, porque a sua vontade se tinha sobreposto ao maior arquitecto da época. Passados anos, operários em trabalhos de conservação vieram a verificar que as colunas não chegavam ao tecto. Elas tinham ficado, e para sempre permaneceram, como símbolo da arte da mistificação. 

Por associação de contrários, o contínuo e efetivo desabar do nosso rendimento per capita, ultrapassado por oito dos treze países do alargamento da CE em 2004, Polónia e Hungria, no ano passado, fez-me lembrar este episódio.

Chegado ao poder, António Costa logo anunciou que o país afundaria se continuasse suportado nas colunas de apoio à recuperação económica e financeira negociadas com a Troika de que a “austeridade” ficou como símbolo redutor, mas que ajudaram o país a sair da crise e a crescer, e habilidosamente baseou a recuperação em novos e luzidios pilares, o consumo e a reposição de rendimentos, que iriam sustentar a economia, o crescimento e o futuro do país.

Todavia, o empobrecimento relativo de Portugal face à generalidade dos países europeus mostrou como esses pilares tão vistosamente ajaezados não produziram efeitos.

Erigidos do tecto para o chão, contrariando as leis da física, atentavam ainda contra a própria física económica, dando prioridade ao consumo em vez da produção, repondo o que não tinha sido criado, e exigindo assim mais impostos e dívida, instabilidade, desequilíbrio e colapso do edifício da economia e do rendimento das famílias. Pilares mal aparelhados e conflituando entre si, a prioridade dada ao consumo foi logo barrada por um agravamento da carga fiscal que atingiu o seu máximo de sempre. A substituição de impostos directos por uma mais pesada, mas anestesiante, tributação indirecta fez que do bolo da riqueza gerada o Estado levasse mais e empresas e famílias ficassem com menos.

A juntar, políticas orçamentais erráticas, ao sabor das circunstâncias, traduzindo-se numa das maiores manipulações do orçamento jamais vistas, cativações, transferências, cortes de verbas, aumento de gastos correntes em detrimento do investimento, que se revelou inferior ao do tempo da Troika, constituíram mais um factor de perturbação na economia.

Ao contrário de Sir Christopher Wren, que sabia que as colunas originais eram sólidas e as adicionais, exigidas pelo prefeito, eram desnecessárias, pelo que as findou antes do tecto, os governos socialistas substituíram colunas-mestras existentes por novos pilares, nascidos contra-natura do tecto para o chão, estalactites porventura reluzentes, mas frágeis e sem base firme de apoio. Delas podem escorrer medidas oportunísticas ou apoios ad-hoc, ao estilo de ivauchers de ocasião para digitalizados, mas nunca políticas sólidas incentivadoras do potencial produtivo que sustentem rendimentos e crescimento. E valem-nos algumas das anteriores colunas que, embora feridas ou camufladas por intensa propaganda, ainda vão dando suporte à economia.

As colunas de Sir Christopher Wren não chegavam ao tecto, porque desnecessário era; as colunas-estalactites de António Costa não chegam ao chão, como necessário seria. Dos treze países do alargamento oito já nos ultrapassaram e só cinco estão atrás de nós. Para quem prometia crescimento, que melhor símbolo da arte da mistificação?

Economista e Gestor
Subscritor do Manifesto Por uma Democracia de Qualidade 
pcardao@gmail.com

A arte da mistificação


As colunas de Sir Christopher Wren não chegavam ao tecto, porque desnecessário era; as colunas-estalactites de António Costa não chegam ao chão, como necessário seria.  Dos treze países do alargamento, oito já nos ultrapassaram e só cinco estão atrás de nós. Para quem prometia crescimento, que melhor símbolo da arte da mistificação?


Sir Christopher Wren foi um dos mais insignes arquitectos ingleses, responsável pela construção ou reabilitação de dezenas de conhecidos palácios, edifícios governamentais, hospitais e igrejas após o grande incêndio de Londres de 1666. A sua obra-prima, St. Paul’s Cathedral, testemunha o seu talento. 

Conta-se que em 1688, tendo-lhe sido adjudicado o projecto do edifício da Prefeitura da Cidade de Westminster, o prefeito discordou da segurança da construção e, temendo que o segundo andar desabasse, exigiu ao arquitecto mais duas colunas de apoio.

Sir Christopher Wren combinava o essencial das suas convicções estéticas com a arte de agradar ao cliente e erigiu as duas colunas adicionais. O prefeito ficou satisfeito e orgulhoso, porque a sua vontade se tinha sobreposto ao maior arquitecto da época. Passados anos, operários em trabalhos de conservação vieram a verificar que as colunas não chegavam ao tecto. Elas tinham ficado, e para sempre permaneceram, como símbolo da arte da mistificação. 

Por associação de contrários, o contínuo e efetivo desabar do nosso rendimento per capita, ultrapassado por oito dos treze países do alargamento da CE em 2004, Polónia e Hungria, no ano passado, fez-me lembrar este episódio.

Chegado ao poder, António Costa logo anunciou que o país afundaria se continuasse suportado nas colunas de apoio à recuperação económica e financeira negociadas com a Troika de que a “austeridade” ficou como símbolo redutor, mas que ajudaram o país a sair da crise e a crescer, e habilidosamente baseou a recuperação em novos e luzidios pilares, o consumo e a reposição de rendimentos, que iriam sustentar a economia, o crescimento e o futuro do país.

Todavia, o empobrecimento relativo de Portugal face à generalidade dos países europeus mostrou como esses pilares tão vistosamente ajaezados não produziram efeitos.

Erigidos do tecto para o chão, contrariando as leis da física, atentavam ainda contra a própria física económica, dando prioridade ao consumo em vez da produção, repondo o que não tinha sido criado, e exigindo assim mais impostos e dívida, instabilidade, desequilíbrio e colapso do edifício da economia e do rendimento das famílias. Pilares mal aparelhados e conflituando entre si, a prioridade dada ao consumo foi logo barrada por um agravamento da carga fiscal que atingiu o seu máximo de sempre. A substituição de impostos directos por uma mais pesada, mas anestesiante, tributação indirecta fez que do bolo da riqueza gerada o Estado levasse mais e empresas e famílias ficassem com menos.

A juntar, políticas orçamentais erráticas, ao sabor das circunstâncias, traduzindo-se numa das maiores manipulações do orçamento jamais vistas, cativações, transferências, cortes de verbas, aumento de gastos correntes em detrimento do investimento, que se revelou inferior ao do tempo da Troika, constituíram mais um factor de perturbação na economia.

Ao contrário de Sir Christopher Wren, que sabia que as colunas originais eram sólidas e as adicionais, exigidas pelo prefeito, eram desnecessárias, pelo que as findou antes do tecto, os governos socialistas substituíram colunas-mestras existentes por novos pilares, nascidos contra-natura do tecto para o chão, estalactites porventura reluzentes, mas frágeis e sem base firme de apoio. Delas podem escorrer medidas oportunísticas ou apoios ad-hoc, ao estilo de ivauchers de ocasião para digitalizados, mas nunca políticas sólidas incentivadoras do potencial produtivo que sustentem rendimentos e crescimento. E valem-nos algumas das anteriores colunas que, embora feridas ou camufladas por intensa propaganda, ainda vão dando suporte à economia.

As colunas de Sir Christopher Wren não chegavam ao tecto, porque desnecessário era; as colunas-estalactites de António Costa não chegam ao chão, como necessário seria. Dos treze países do alargamento oito já nos ultrapassaram e só cinco estão atrás de nós. Para quem prometia crescimento, que melhor símbolo da arte da mistificação?

Economista e Gestor
Subscritor do Manifesto Por uma Democracia de Qualidade 
pcardao@gmail.com