MP avança com recurso contra decisão favorável a Mário Machado

MP avança com recurso contra decisão favorável a Mário Machado


Recurso não tem efeito suspensivo. Ao anunciar “missão” no Telegram, Mário Machado demarcou-se da legião internacional e dizia que plano iria avançar mesmo que medida de coação não fosse levantada.


Depois de o Conselho Superior da Magistratura informar esta segunda-feira que não lhe cabe interferir em matéria jurisdicional e de o Presidente da República dizer que o Estado não se imiscui neste assunto, o recurso foi anunciado pelo Ministério Público. A Procuradoria Geral da República confirmou ontem que vai contestar a decisão que, na passada sexta-feira, suspendeu a obrigação de Mário Machado de se apresentar quinzenalmente às autoridades para que pudesse partir em “missão humanitária” para a Ucrânia, o que o ex-dirigente dos movimentos Frente Nacional e Nova Ordem Social terá feito logo nesse dia.

Em causa está a decisão tomada pela juíza Catarina Vasco Pires do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), anunciada pelo militante nacionalista no seu grupo no Telegram, onde no início do mês partilhou a intenção de partir para a Ucrânia numa missão com duas componentes, de ajuda humanitária, na Polónia, e uma “parte militar”, de apoio a forças nacionalistas no país. Algo que na altura disse que iria fazer mesmo que o pedido de levantamento da medida de coação não fosse diferido por não ir ficar à espera “eternamente” e poder sair do país, traçando um plano para trabalhos “milicianos” de 10 dias, podendo depois regressar a Portugal para se apresentar na esquadra e cumprir a medida. 

Afirmando-se contra Putin, Machado demarcava-se então do apoio ao Governo ucraniano e explicava aos seguidores que se não se tratava de se alistarem na legião estrangeira internacional: “Seria Zelensky a comandá-la, seria o Governo a russo a comandar e nós não estamos à ordem de nenhum governo internacional e de governos com que não nos identificamos”.

Sem muitos detalhes, Mário Machado – atualmente indiciado pelo crime de posse ilegal de arma na sequência de uma investigação levada a cabo pela PJ no ano passado por suspeitas de crimes de ódio e incitamento à violência na internet – expunha o seu raciocínio: “Imaginem que a Espanha invadia Portugal. Nós não gostávamos de estar em guerra mas tínhamos de nos defender. O nosso primeiro-ministro seria o António Costa, o indiano, e íamos desejar a melhor sorte do mundo ao indiano. Apesar de sabermos que o António Costa é uma grande m*, queríamos libertar o nosso país. Isto é mais ou menos o que se passa com os nacionalistas na Ucrânia”, diz no áudio com que pediu donativos para a ação. “Querem libertar o país deles e ficam muito contentes se nacionalistas de todo o mundo se juntassem”.

“Ao lado das tropas ucranianas”, diz o requerimento No requerimento apresentado ao TCIC a 4 de março, pode ler-se que o arguido mobilizou “um grupo de pessoas de diversas nacionalidades que se propõe ir para a Ucrânia prestar ajuda humanitária e, se necessário, combater ao lado das tropas ucranianas”, sem referir quais. A defesa pedia que a medida de coação de apresentação quinzenal fosse substituída por termo de identificação e residência, dado ser incompatível com este objetivo. 

Foi este o pedido que o TCIC diferiu no passado 18 de março, considerando não existir notícia de incumprimento até aqui da medida de coação, o que tinha sido também um dos argumentos da defesa, de que o arguido tem um comportamento exemplar. 

“Assim sendo, e considerada a situação humanitária vivida na Ucrânia e as finalidades invocadas pelo arguido para a sua pretensão, o arguido poderá deixar de cumprir a referida medida de coação enquanto estiver ausente no estrangeiro, designadamente naquele país (…), permanecendo sujeito às obrigações decorrentes do termo de identidade e residência já prestado”, pode ler-se na decisão.

Recurso sem efeito suspensivo Questionada pelo i, a Procuradoria-Geral da República não indicou quando dará entrada o recurso na Relação de Lisboa. 

Qualquer efeito que possa eventualmente vir a ter não será no entanto imediato, explicou ao i fonte da magistratura. De acordo com o Código de Processo Penal, o Ministério Público pode recorrer de decisões que apliquem, substituam ou mantenham medidas de coação a julgar no prazo de 30 dias a contar do momento em que os autos são recebidos, portanto a última sexta-feira, podendo este recurso ser igualmente contestado com um prazo de mais 30 dias. 
Enquanto decorre este processo, não há uma suspensão da decisão “Se o Ministério Público entende que a decisão não é a correta, deve recorrer, independentemente de a decisão poder não ter grande impacto ou de poder ser executada”, diz a mesma fonte. 

No limite, Mário Machado pode já estar em Portugal quando a Relação se pronunciar. Caso haja uma revogação das medidas de coação, o arguido pode ter de voltar a apresentar-se quinzenalmente ou no limite, caso exista incumprimento, as mesmas podiam ser agravadas, explica a mesma fonte.