Trinta anos depois, ouviu-se outra vez o discurso do império, agora sob a forma de invocação de uma espécie de direito natural à anexação de territórios vizinhos da antiga URSS, na tentativa de ajuste de contas entre a Rússia e o Mundo.
Não que à época, o autor da Perestroika não tivesse confessado a própria e assumida razão da queda da então União Soviética: demasiada ambição para tão pouca devolução de crescimento económico e bem-estar para os povos então oprimidos pela URSS.
E não só.
Os Estados Unidos, ao inventarem o programa “star-wars” puseram a nu o obsoletismo do complexo industrial-militar de Moscovo.
A falência central, conjugada com a sempre reafirmada autodeterminação das repúblicas periféricas mantidas sob jurisdição da chamada “cortina de ferro”, fez o resto.
E, passados estes anos, o passo terá sido no sentido errado para os povos do centro e da periferia ou foi oportunidade de abertura a um ciclo de liberdade, modernização e afirmação até no seio da União Europeia por parte de algumas NDE (Novas democracias emergentes)?
É uma evidência que assim foi.
Países houve que encontraram um novo caminho na União Europeia, livres do jugo de Moscovo.
Comparada a própria situação da Rússia dos dias de hoje com a da época da dissolução da URSS, não há comparabilidade aplicável.
Aqui chegados, que justifica então o ato despótico deste novo Hitler do nosso tempo, ao invadir a Ucrânia?
Mais que grandes considerações de geopolítica e retorno ao reequilíbrio dos blocos tal como durante a “guerra-fria”, as últimas horas questionam o fundamental círculo decisório de Moscovo.
Quando se passa da invasão de um Estado soberano, à ameaça de países como a Finlândia e a Suécia quanto à sua “neutralidade imposta” e se anuncia ao mundo as ordens transmitidas a ministros sobre a colocação em “apronto nuclear “ as disponibilidades bélicas, ao mesmo tempo que se anunciam conversações com a Ucrânia para a rendição, algo necessita de explicação complementar quanto à estabilidade emocional do decisor…
Em todo o caso, atenta a reação do mundo livre, certo é que nada ficará como dantes no quadro da União Europeia e da NATO.
A consciência da perigosidade residente em Moscovo foi exposta com toda a brutalidade e será difícil que não surja um novo quadro de defesa no âmbito do Tratado do Atlântico Norte.
Nota
Lembram-se ?
Há um ano, o perigo no mundo vinha de Trump, Bolsonaro e Viktor Orbán.
Na América, no Brasil e na Hungria, ali residia a fonte de todos os males.
Por estes dias foi então a verdade revelada na sua crueza de indignação e revolta.
Trump, sabe-se hoje com testemunhos gravados, avisou longamente a NATO e as chancelarias europeias, do perigo de porem ramais de gás e transferências brutais de biliões de euros para Moscovo.
Viktor Orbán é o chefe de Governo da Hungria, que já recebeu desde há quatro dias, milhares de refugiados de guerra com humanidade e abertura ao acolhimento.
Bolsonaro, foi a Moscovo como outros, em missão diplomática, pedir para pararem as intenções de atacar o povo ucraniano.
E como tudo era diferente há pouco mais de um ano…
(Nota: o que aqui se escreve sobre estes três governantes, Trump, Bolsonaro e Orbán, não implica um juízo de aplauso à sua intervenção global. Nem a subscrição do método. Questão diversa é a sua diabolização crónica, face à tolerância para com o déspota de Moscovo.)
Covilhã, fevereiro de 2022