A bolsa e o voto


Se alguma coisa de positivo ficou, foi a nítida afirmação aos olhos dos portugueses de dois blocos políticos para alternarem no poder com visões distintas do país e uso distinto da ideologia ao serviço do pensamento político.


A campanha centrada nos debates televisivos valeu sobretudo pelo cumprimento do princípio do direito de expressão concedido às forças representadas no parlamento e à constatação da existência de um comentariado que, com honrosas excepções e as mais das vezes, se mostrou incapaz de uma exigida independência sobretudo quando o poder estava próximo.

Temos assim que, se alguma coisa de positivo ficou, foi a nítida afirmação aos olhos dos portugueses, de dois blocos políticos para alternarem no poder com visões distintas do país e uso distinto da ideologia ao serviço do pensamento político.

Na parte que importa para a governabilidade do país, de um lado esteve a prevalência de uma economia de mercado como sustentáculo e meio de promoção da riqueza, de par com preocupações de um Estado de solidariedade activa, agregado à volta do PSD e da direita em geral.

A intervenção do Estado, como patrão e produtor, empregador, regulador, estatizante sempre que possível, como marca do PS e da esquerda, embora com matizes diferenciadoras tal como a substância das suas origens doutrinárias.

Segundo o candidato António Costa, ao primeiro modelo está inerente, p.e. e como “marca de água”, a busca de uma intervenção venal do PSD e da direita, designadamente ao prosseguir objectivos de afectar a privados o domínio da saúde pública, a segurança social, a escola pública, um destes dias a habitação pública.

Domínios que, como se sabe, a esquerda pretende erigir em coutada exclusiva.

Por causa desta visão, a páginas tantas do debate sobre um novo modelo de segurança social que assegure as pensões do futuro, A. Costa disparou: “Vocês querem é entregar aos privados os milhões da segurança social, privatizar a segurança social, torná-la um negócio de financeiros e banqueiros”.

Esta imputação tremendista, usual em épocas que tais, sabe-se hoje, é subsidiária de um dualismo de imputação baseado em alguma hipocrisia, já que, hoje mesmo, uma boa parte das poupanças da Segurança Social vêm navegando com este governo, nas vicissitudes bolsistas de marcas e “griffes” celebérrimas como os títulos da Burberry, a AstraZeneca, a EasyJet, o grupo Rolls-Royce, a Unilever, a Royal Dutch Shell, a Louis Vuitton, a Coca-Cola e a Adidas, entre outras e de acordo com dados oficiais, procurando mais-valias que reforcem a base de sustentação a prazo.

Ou seja, anda o Estado português crente da bondade da aplicação dos valores que garantam as pensões, através da valorização bolsista, enquanto o primeiro-ministro e candidato a novo mandato, fica de dedo apontado ao seu opositor, brandindo a intenção de fazer o que ele próprio já hoje pratica.

Estamos perante uma forma de fazer política em que se não reconhece a existência de um campo de políticas sectoriais comuns na gestão do Estado e assente num espectro muito largo de opções consensuais.

Fica assim a disputa política falseada na sua genuinidade, remetendo-se para o mero processo de intenção o que é prática que a realidade impõe.

Um segundo elemento também invocado tem a ver com a declaração de que Portugal vem de um período de crescimento acima da média europeia.

Terá sido assim?

Tomemos o ano de 2017 num quadro de plena expressão das reformas assumidas de 2011 a 2015, pelo anterior governo, tendo o crude caído para 50 USD/barril com a economia mundial a crescer e as taxas de juro do BCE em redução significativa, próxima do zero.

Nesse ano, a Estónia cresceu 4,4%; a Letónia 4,5%; a Lituânia 3,8%; Malta 6,9%; Eslovénia 4,9%; Eslováquia 3,4%; Holanda 3,2%; Austria 3,1%; Luxemburgo 3,4%.

O PIB em Portugal terá crescido 2,7%.

Mas se olharmos os resultados dos países sujeitos a programas de ajustamento tal como o nosso país, Chipre teve um crescimento de 3% em 2016 e 3,8% em 2017, a Irlanda 5,1% em 2016 e 7,3% em 2017, enquanto a Espanha nos superou com 3,3% em 2016 e 3,1% em 2017.

E depois da pandemia? No caso de Portugal, a expectativa é que tal aconteça no primeiro trimestre de 2022, enquanto oito países já ultrapassaram em 2021, o nível pré-pandemia; Letónia (0,1% acima), Polónia (0,19% acima), Hungria (0,6% acima), Dinamarca (0,69% acima), Lituânia (1,51% acima), Roménia (1,95% acima), Luxemburgo e Estónia. Esta a realidade.

Feito o contraditório nas televisões, e decantada a governação que trouxe Portugal aos mínimos nos rankings, fica a escolha entre dois protagonistas: talvez que nos últimos anos, nunca a escolha tenha sido tão fácil.

Jurista

A bolsa e o voto


Se alguma coisa de positivo ficou, foi a nítida afirmação aos olhos dos portugueses de dois blocos políticos para alternarem no poder com visões distintas do país e uso distinto da ideologia ao serviço do pensamento político.


A campanha centrada nos debates televisivos valeu sobretudo pelo cumprimento do princípio do direito de expressão concedido às forças representadas no parlamento e à constatação da existência de um comentariado que, com honrosas excepções e as mais das vezes, se mostrou incapaz de uma exigida independência sobretudo quando o poder estava próximo.

Temos assim que, se alguma coisa de positivo ficou, foi a nítida afirmação aos olhos dos portugueses, de dois blocos políticos para alternarem no poder com visões distintas do país e uso distinto da ideologia ao serviço do pensamento político.

Na parte que importa para a governabilidade do país, de um lado esteve a prevalência de uma economia de mercado como sustentáculo e meio de promoção da riqueza, de par com preocupações de um Estado de solidariedade activa, agregado à volta do PSD e da direita em geral.

A intervenção do Estado, como patrão e produtor, empregador, regulador, estatizante sempre que possível, como marca do PS e da esquerda, embora com matizes diferenciadoras tal como a substância das suas origens doutrinárias.

Segundo o candidato António Costa, ao primeiro modelo está inerente, p.e. e como “marca de água”, a busca de uma intervenção venal do PSD e da direita, designadamente ao prosseguir objectivos de afectar a privados o domínio da saúde pública, a segurança social, a escola pública, um destes dias a habitação pública.

Domínios que, como se sabe, a esquerda pretende erigir em coutada exclusiva.

Por causa desta visão, a páginas tantas do debate sobre um novo modelo de segurança social que assegure as pensões do futuro, A. Costa disparou: “Vocês querem é entregar aos privados os milhões da segurança social, privatizar a segurança social, torná-la um negócio de financeiros e banqueiros”.

Esta imputação tremendista, usual em épocas que tais, sabe-se hoje, é subsidiária de um dualismo de imputação baseado em alguma hipocrisia, já que, hoje mesmo, uma boa parte das poupanças da Segurança Social vêm navegando com este governo, nas vicissitudes bolsistas de marcas e “griffes” celebérrimas como os títulos da Burberry, a AstraZeneca, a EasyJet, o grupo Rolls-Royce, a Unilever, a Royal Dutch Shell, a Louis Vuitton, a Coca-Cola e a Adidas, entre outras e de acordo com dados oficiais, procurando mais-valias que reforcem a base de sustentação a prazo.

Ou seja, anda o Estado português crente da bondade da aplicação dos valores que garantam as pensões, através da valorização bolsista, enquanto o primeiro-ministro e candidato a novo mandato, fica de dedo apontado ao seu opositor, brandindo a intenção de fazer o que ele próprio já hoje pratica.

Estamos perante uma forma de fazer política em que se não reconhece a existência de um campo de políticas sectoriais comuns na gestão do Estado e assente num espectro muito largo de opções consensuais.

Fica assim a disputa política falseada na sua genuinidade, remetendo-se para o mero processo de intenção o que é prática que a realidade impõe.

Um segundo elemento também invocado tem a ver com a declaração de que Portugal vem de um período de crescimento acima da média europeia.

Terá sido assim?

Tomemos o ano de 2017 num quadro de plena expressão das reformas assumidas de 2011 a 2015, pelo anterior governo, tendo o crude caído para 50 USD/barril com a economia mundial a crescer e as taxas de juro do BCE em redução significativa, próxima do zero.

Nesse ano, a Estónia cresceu 4,4%; a Letónia 4,5%; a Lituânia 3,8%; Malta 6,9%; Eslovénia 4,9%; Eslováquia 3,4%; Holanda 3,2%; Austria 3,1%; Luxemburgo 3,4%.

O PIB em Portugal terá crescido 2,7%.

Mas se olharmos os resultados dos países sujeitos a programas de ajustamento tal como o nosso país, Chipre teve um crescimento de 3% em 2016 e 3,8% em 2017, a Irlanda 5,1% em 2016 e 7,3% em 2017, enquanto a Espanha nos superou com 3,3% em 2016 e 3,1% em 2017.

E depois da pandemia? No caso de Portugal, a expectativa é que tal aconteça no primeiro trimestre de 2022, enquanto oito países já ultrapassaram em 2021, o nível pré-pandemia; Letónia (0,1% acima), Polónia (0,19% acima), Hungria (0,6% acima), Dinamarca (0,69% acima), Lituânia (1,51% acima), Roménia (1,95% acima), Luxemburgo e Estónia. Esta a realidade.

Feito o contraditório nas televisões, e decantada a governação que trouxe Portugal aos mínimos nos rankings, fica a escolha entre dois protagonistas: talvez que nos últimos anos, nunca a escolha tenha sido tão fácil.

Jurista