Barcelona. Nunca a Catalunha passou por vergonha igual

Barcelona. Nunca a Catalunha passou por vergonha igual


Se julgam que o Barça está mal, reparem no que aconteceu na época de 1941-42: 12.º lugar numa prova com 14 equipas e não desceu por acaso.


Bem podem os adeptos do grande Barcelona andar de cabelos em pé com a época que a sua equipa tem vivido até ao momento, arrastando-se num bisonho sexto lugar, com oito empates e quatro derrotas em vinte jogos, a uma distância impossível de ultrapassar para o líder da prova, o inimigo de sempre, Real Madrid: 18 pontos. Além do mais, foi despachada da Taça dos Campeões com três derrotas por 0-3, duas frente ao Bayern de Munique e a outra na Luz, face ao Benfica. É de apavorar ornitorrincos, lá isso é.

Mas ainda haverá quem se lembre de pior. Muito, muito pior. A época de 1941-42, na qual o Barça esteve a um curto passo de descer de divisão. Safou-se a tempo. E assim, juntamente com Real Madrid e Athletic Bilbao, é um dos únicos três clubes de Espanha que nunca teve de provar o fel da despromoção.

A Guerra Civil de Espanha tinha devastado o país, deixando por terra mais de 500 mil mortos, num conflito selvagem que se prolongou de Julho de 1936 a Abril de 1939. O futebol só tinha recomeçado a actividade na época anterior. Barcelona fora uma das cidades mais castigadas pela vitória dos nacionalistas de Francisco Franco, El Caudillo. Com toda a naturalidade, o futebol não fazia parte das prioridades dos catalães, ao mesmo tempo que o Real Madrid ganhava os favores do novo regime e se preparava para tomar conta do futebol da Europa e do Mundo.

A Liga Espanhola fora ampliada de 12 para 14 equipas. Algo que acabaria por favorecer o Barcelona, como veremos. No início, havia a convicção de que os blaugrana iriam lutar pelo título. No ano anterior não foram além do quarto lugar, abaixo de Atlético de Madrid (à época ainda Atlético Aviación, pelas suas ligações à força aérea espanhola), Athletic Bilbao (nesse tempo obrigado a castelhanizar-se como Atlético) e Valência, mas acima do Real, o que não deixou de funcionar como prémio de consolação. Mas, de repente, as esperanças renovavam-se. Quem poderia adivinhar, pelo meio de tanto optimismo, a desgraça que esteve à beirinha de acontecer?

Desastroso O início do campeonato foi de tal modo desastroso para o Barcelona que à nona jornada ocupava o último lugar da tabela. Aliás, os resultados obtidos fora de casa foram, na sua totalidade, tão fracos, que no final das contas conseguiu uma única vitória longe de Barcelona, em Sevilha (2-1), tendo passado tormentos em Bilbau (3-6), Granada (0-6) e no campo do vizinho Espanhol (2-5).

Três jornadas vitoriosas consecutivas fizeram os catalães trepar pela tabela até ao décimo lugar, o primeiro que garantia a manutenção já que os 11º e 12º estavam obrigados a jogar um play-off para poderem continuar na liga principal.

Depois, a queda repetiu-se e o Barcelona tombou para o penúltimo lugar que, esse sim, já o condenava à despromoção directa. Como seria de esperar, o treinador, Ramón Guzmán, não aguentou e foi despedido. Para o seu lugar foi chamado o eventual salvador da alma barcelonista Juan José Nogues que, desde início, começou a tirar partido das qualidades de goleador do seu melhor avançado, Mariano Martín.

Apesar dos ventos positivos que sopravam a favor de Nogues, o Barça continuou nos lugares de descida, os dois últimos, até à jornada número 24. Como o campeonato havia sido alargado, restavam-lhe agora mais duas jornadas para lutar desesperadamente pela salvação. Foi de aflitos. Mas, ainda assim, dentro do pior cenário possível, os catalães conseguiram atingir os 19 pontos, ou seja, mais dois do que o Alicante, o primeiro dos despromovidos. A época foi de tal forma horrenda que o antepenúltimo classificado ainda ficou quatro pontos abaixo do Oviedo, o 11º. A contabilidade demonstra a pobreza da época barcelonista: oito vitórias, três empates e quinze derrotas; 57 golos marcados e 66 sofridos.

Obrigados ambos, Oviedo e Barcelona, a disputar uma liguilha contra os 3º e 4º melhores da II Divisão, salvaram-se – o Oviedo à custa do Sabadell (3-1) e o Barcelona à custa do Murcia (5-1). Nunca passara por susto tão grande pelo que, como se pôde ver, esta época acaba por ser uma brincadeira quando comparada com essa de 1941-42.

Curiosamente, a par de um campeonato horrível, que acabaria por ter o Valência como vencedor, o Barcelona esteve muito bem na Copa do Rei (que houvera mudado o nome para Copa do Generalíssimo, em honra do ditador). No dia 21 de Junho de 1921, em Chamartín, defrontou o Athletic Bilbao do famosíssimo avançado Zarra. A batalha foi dura e teve de ir a prolongamento. No minuto 101, o inevitável Mariano Martín fez o 4-3 e levou a taça para Barcelona. Para Franco deve ter sido para o lado em que dormia melhor: não gostava nem de bascos nem de catalães.