Chegamos ao final de 2021 e as notícias estão longe de serem aquelas que gostaríamos de ler e ouvir.
Apesar da vacinação massiva, que sustentou uma precipitada e irrealista declaração do fim da crise de saúde pública, voltamos a viver um Natal marcado pelas incertezas e ansiedades pandémicas.
Escrevo estas linhas quando a azáfama nos aeroportos é grande, com milhares de pessoas a preparem-se para regressar a Portugal. Dentro de portas, as autoestradas agitam-se e são muitos os que fazem as malas para se juntarem às suas famílias no norte ou no sul do país.
Dois anos depois de ter entrado cobardemente nas nossas comunidades, o vírus não conseguiu vencer a nossa vontade de estar com quem gostamos e com aqueles que dão sentido às nossas vidas. Temos, porém, de estar cientes dos riscos que corremos. Para que não se repita a calamidade do ano passado, que resultou em dezenas de milhar de infetados e centenas de mortos, é obrigatório que todos os portugueses tenham noção das suas responsabilidades. Ontem o Governo anunciou mais um cardápio de restrições na tentativa de controlar a pandemia. Quaisquer que elas sejam, e independentemente do seu valor intrínseco, o que já sabemos é que chegam para correr atrás da cauda de contágios, não para conter e liderar o combate ao vírus.
Isto deixa os cidadãos numa posição de enorme responsabilidade: só as pessoas têm a capacidade de se adaptar às rápidas mudanças de cenário, sendo agentes primordiais de saúde pública. Haja ou não haja medidas restritivas, cabe a cada um de nós assumir em cada momento os comportamentos adequados às circunstâncias, que protejam a nossa saúde e a dos que nos rodeiam sem ter de estar à espera do Estado.
Como líder de uma comunidade que tem dado mostras de um enorme compromisso cívico, apelo a todos para que não ponham em causa este esforço de quase dois anos. Para que um Natal em paz e família não seja sucedido por uma ressaca de ansiedade e isolamento, adotemos comportamentos simples: reunamos à nossa mesa os núcleos familiares mais próximos, evitemos grandes ajuntamentos ou o entra e sai de amigos e conhecidos, e precedamos todos os nossos encontros de testes rápidos. Para quem nos lê a partir de Cascais não há desculpa para não ser cuidadoso: a Câmara continua a oferecer máscaras a todos os cidadãos – já foram 20 milhões em menos dois anos – e mesmo dia 24 de dezembro há postos de testagem espalhados por todo o concelho para que cada um possa fazer a sua parte.
Quanto ao resto, e o resto é o que mais importa porque está para lá da circunstância pandémica, aproveitemos esta pausa de Natal para celebrar e para refletir.
Os católicos, como eu, têm como mãe de todas as celebrações o nascimento de Cristo. Mas todos, crentes ou não crentes, encontrarão na mais bela das quadras a atmosfera certa para celebrar as realizações pessoais, os objetivos alcançados e, sobretudo, o dom da vida nas suas expressões mais simples.
Há quem diga que a pandemia nos trouxe coisas boas, embora eu não veja nenhuma. Concedo, ainda assim, que a crise que nos tocou nos permitiu renovar o olhar e colocar todos os problemas e dificuldades em perspetiva. Passear num parque ou numa praia depois de confinamentos sucessivos dentro de casa, abraçar quem mais gostamos depois de semanas de isolamento, voltar ao trabalho ou regressar às aulas e rever colegas. A covid-19 deu-nos a oportunidade de fazer o elogio da simplicidade. E de encontrarmos a felicidade para além da existência material. Afinal, as coisas grandes e caras não são, nunca foram, pré-condição para uma vida feliz e realizada.
O Natal é também o tempo certo para refletir sobre os desafios à nossa frente e, na unidade da família e amigos, encontrar forças para os superar.
Há outras pandemias no nosso horizonte que testarão a fortaleza dos nossos valores e coragem das nossas ações. A pandemia social, que se faz sentir com muita intensidade, é das mais emergentes e requer de todos boa-vontade e empatia. A pandemia da ignorância e do fanatismo, está a cavar divisões entre nós e um ambiente de todos contra todos que degrada a liberdade e a democracia. Em tempo de competição eleitoral, precisamos de moderação, ética e elevação.
Mas aquela que verdadeiramente representa uma ameaça perene é a “pandemia” das alterações climáticas. Criar um mundo melhor depende de todos. Aproveitemos esta quadra para refletir sobre os nossos objetivos coletivos e sobre o contributo individual que cada um de nós pode dar – na nossa casa, na nossa rua ou nos nossos bairros – para mitigar as alterações climáticas e a insegurança política, social e económica que lhes subjazem.
Que não haja equívocos: não é só o nosso modo de vida que está em causa, é todo o nosso edifício civilizacional que pode ruir se nada fizermos perante esta ameaça existencial.
Se há lição que a covid-19 nos trouxe é que nenhum inimigo é grande demais quando nos unimos para o derrotar com o talento que fomenta o progresso tecnológico e científico; com a coragem que levou tantos e tantos profissionais para a linha da frente; e com a Humanidade que colocamos em cada gesto ao serviço do nosso semelhante.
A todos os leitores e colaboradores do “inevitável”, um Santo Natal e um Próspero 2022. Que no país, como em Cascais, continuemos a ser sempre Todos por Todos.
Presidente da Câmara Municipal de Cascais
Escreve à quarta-feira