A Assembleia da República aproveitou a última sessão plenária da legislatura, nesta sexta-feira, para uma maratona de votações e uma ronda de despedidas. Antes de serformalmente dissolvida e convocadas eleições antecipadas para 30 de janeiro, os deputados da AR tinham como ordem de trabalhos um extenso guião de votações. Entre os projetos de lei a serem votados estava, por exemplo, o acesso às barrigas de aluguer, o adiamento da extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), o alargamento do período de luto parental, a possibilidade de obrigatoriedade de máscara na rua, entre muitos outros diplomas, como três do PAN incidindo sobre as estufas e as explorações agrícolas ou a introdução de detetores de incêndios em unidades pecuárias ou, ainda, a prática do tiro ao pombo.
O adiamento por seis meses do fim do SEF foi aprovado sem votos contra, com os votos a favor do PS, do Chega, do IL, do PAN e das deputadas não inscritas e com a abstenção do PSD, do BE, do PCP, d’ Os Verdes e do CDS. A proposta do PS foi viabilizada pela oposição, contudo, com a intenção de o próximo Governo preparar a reformulação do serviço.
Já o acesso à gestação de substituição – a mais comummente denominada barriga de aluguer – foi aprovada com os votos do PS, do BE, do PAN, do IL, da deputada do PSD Margarida Balseiro Lopes e da deputada não inscrita Joacine Katar Moreira. O PSD, o CDS, o Chega, o PCP e o PEV votaram contra. Alguns deputados do PSD vão ainda apresentar uma declaração de voto sobre esta matéria.
Esta proposta abrangerá apenas cidadãos nacionais e estrangeiros com residência permanente em Portugal.
Aprovada por unanimidade foi também definitivamente a revogação do cartão de adepto, após a proposta do IL ter saído da comissão parlamentar com o consenso de todos os partidos. Assim, o cartão do adepto chega ao fim no início do próximo ano, mantendo-se apenas nas zonas específicas para as claques.
O alargamento do período de luto parental, que foi debatido na passada quinta-feira no Parlamento, foi aprovado com os votos de todos os partidos, à exceção do IL, que se absteve. Os partidos tinham apresentado projetos de alteração à lei para que o período de luto pela morte de um descendente direto passe de 5 para 20 dias, aquando da entrada de uma petição da Associação Acreditar.
A alteração à lei da exploração de minas, que contou apenas com os votos contra do PS, do CDS e do IL, também foi aprovada. Foram ainda viabilizados pelo PS o projeto do PCP para alargar progressivamente a gratuitidade das creches, bem como o do BE para permitir a antecipação da idade da reforma para pessoas com deficiência ou grau de deficiência igual ou superior a 80%.
Ao fim de quatro horas e meia de sessão, onde viu luz verde um conjunto variado de novos projetos, Eduardo Ferro Rodrigues levantou-se para uma última intervenção em plenário, referindo que ter sido presidente da Assembleia da República foi a «maior honra da vida», depois de ter liderado um Parlamento em «tempos excecionais», em que «a democracia e as suas instituições estiveram muitas vezes sob ataque, como há muito se não verificava».
Governo habilitado a decretar uso de máscara na rua
O projeto do PS que habilita o Governo a decretar o uso de máscara na rua sem a autorização da Assembleia da República, foi aprovado, apesar das críticas da oposição. O diploma, que cessará a vigência a 1 de março de 2022, foi viabilizado com os votos a favor do PS e a abstenção dos restantes partidos, à exceção do Chega e do IL, que votaram contra.
Pelo PSD, o deputado Carlos Peixoto apelidou esta proposta de «engenhoca constitucional que só se aceita por força das circunstâncias», frisando que «esta exceção não pode ser a regra».
No debate da iniciativa, o socialista Pedro Delgado Alves lembrou que, se o Parlamento impusesse um regime de obrigatoriedade do uso de máscaras com efeito imediato, «só a nova Assembleia a eleger a 30 de janeiro estaria em condições de proceder à sua prorrogação, o que levaria à implementação de um regime excessivo e desproporcional que criava esta obrigação mesmo que a situação pandémica viesse a evoluir favoravelmente».
«Não se trata de implementar obrigatoriamente a utilização da máscara. Trata-se de dar uma faculdade e um instrumento ao Governo para que, através de resolução do Conselho de Ministros decretar alerta, calamidade ou contingência, ter esta possibilidade ao seu dispor se isso se afigurar necessário», justificou.
O deputado do BE Moisés Ferreira defendeu que «a prioridade deve ser a vacinação e o reforço do SNS» e, ainda que seja «demasiado e desproporcional» aplicar esta medida no momento atual, o partido não tenciona «que o Governo fique sem este potencial instrumento».
Da bancada do PCP, João Oliveira acusou o PS de uma «trapalhada», quando, em conjunto com o PSD e o Governo, «decidiu em 2020 que era preciso uma lei para impor a obrigatoriedade do uso de máscaras e era preciso que essa lei tivesse um regime sancionatório com coimas».
Tiro aos pombos proibído
O PAN levou a votos seis requerimentos para que o os deputados fizessem em plenário as votações da especialidade de vários projetos de lei do partido e de várias propostas de alteração.
Das várias propostas, foi aprovado o projeto-lei que proíbe a prática do tiro ao pombo, ou de «aves libertadas de cativeiro com o único propósito de servirem de alvo». Este diploma mereceu os votos a favor do PS, BE, PAN, PEV e das deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e o voto contra de PSD, PCP, CDS, Chega, IL e de alguns deputados do PS.
Também a obrigatoriedade de instalação de sistemas de deteção de incêndio em explorações pecuárias, como em pocilgas, foi aprovada com os votos a favor de PS, BE, PAN e das deputadas não inscritas Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues. Mereceu o voto contra do PSD, PCP, CDS, PEV, Chega, IL e de alguns deputados do PS.
Foram chumbados ainda quatro projetos de lei, entre eles, iniciativas com vista à não discriminação no acesso à habitação para quem tem animais de companhia, o alargamento do crime de maus-tratos a todos os animais vertebrados e o cumprimento do Plano de Ordenamento do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, que previa o impedimento de novas instalações de explorações agrícolas, como estufas, até ao cumprimento do referido plano.