China e Europa: o pacto suicida


O grande entrave ao consenso internacional para a reversão do aumento da temperatura média prende-se, principalmente, com um plano que elimine gradualmente a exploração dos combustíveis fósseis. 


Após o que parecia ser uma missão quase impossível, a cimeira climática da ONU (COP26) conseguiu aprovar a declaração final, depois de muita discussão em torno do apelo ao fim do uso do carvão. A Índia, através do seu Ministro do Ambiente, travou uma batalha semântica para substituir o “fim progressivo” (phase-out) por uma redução progressiva (phase down) e, a muito custo e não obstante alguns protestos, foi possível a aprovação do texto final.

Desta cimeira há a realçar muito pouco, comparativamente com o que tem que ser feito e com o que, inicialmente, se ambicionou para alcançar: o incentivo ao aumento das contribuições dos membros do Acordo de Paris para o financiamento climático até 2025; o Brasil passou a ser signatário do compromisso global para a redução das emissões de metano (é um dos cinco maiores emissores mundiais de metano); e um acordo global repleto de intenções que visam limitar o aquecimento global a 1,5 grau. Intenções, leu bem! Não há medidas concretas assinaladas. A ausência de metas específicas para 2030 é uma realidade que é compensada com um progresso nos objetivos a longo prazo. Como se nesta batalha, a batalha climática, o tempo não fosse a variável mais determinante para a vitória do homem sobre as suas ambições.

O grande entrave ao consenso internacional quanto aos objetivos a atingir para a reversão do aumento da temperatura média prende-se, principalmente, com um plano que elimine gradualmente a exploração dos combustíveis fósseis, dos quais se destaca o carvão. Desde a Revolução Industrial até 2005, os Estados Unidos da América (EUA) ocuparam a pole position dos países que mais emitem gases de efeito estufa, sendo destronados pela China, que apostou, no início deste século, numa forte industrialização, assente no carvão. Apesar da China deter, à data, o título de país mais poluidor do mundo, as suas emissões per capita não chegam aos calcanhares das dos EUA, o que significa que as suas emissões poluentes têm, ainda, um enorme potencial de crescimento. 

O carvão é responsável por 70% da eletricidade produzida na China. Recentemente, o racionamento da energia nas horas de ponta e o aumento da procura de energia devido ao clima frio nas regiões do nordeste, resultou em: falhas de energia que levaram à paralisação de fábricas; milhões de chineses viram as suas casas sem energia elétrica; semáforos que se apagaram durante horas; e registou-se a falta de cobertura da rede 3G para os telemóveis.
No momento, em que se exige à China que reveja a sua política ambiental e de exploração de matérias fósseis, como o carvão, para a produção de energia, fica por demais evidente que esta estrada é longa e sinuosa. Este breve episódio da crise energética que teve o seu epicentro na China, vai produzir réplicas até à Europa, quando daqui a umas semanas começarmos a ser confrontados com a falta de matérias-primas para as nossas fábricas, ou de produtos originários da China e que fazem parte do nosso dia-a-dia. Bens tão essenciais como carros, tintas, material tecnológico (as fábricas que abastecem a Tesla e a Apple tiveram que encerrar durante um período alargado, na sequência desta crise. Na reabertura, anunciaram que iriam reduzir a sua produção para estarem alinhados com as orientações de Pequim) e que não poderão ser entregues a nível global. Não nos podemos esquecer que muito do que se consome no Ocidente é produzido na China, apesar dessas emissões serem contabilizadas no registo de emissões de carbono chinês. 

Exigir à China que diminua a exploração do carvão enquanto a Europa continua dependente do mercado chinês é uma estratégia arriscada. A União Europeia (UE) tem aqui a oportunidade de liderar a agenda climática, mas para isso tem que apostar na sua autonomia energética, bem como incentivar a um novo processo de industrialização que nos permita sermos autossuficientes para as nossas necessidades. Em 2020, segundo o Eurostat, a China tornou-se o principal parceiro comercial da UE, estatuto que pertencia aos EUA, tendo conservado essa posição em 2021. Entre o primeiro trimestre de 2019 e o segundo de 2021, a percentagem de importações da China para a UE aumentou em 4%.
Este jogo de palavras e de acusações na cena internacional de nada vale se não se escolher, conscientemente, a utilização de energias alternativas renováveis e que possam, eficazmente, ser substitutos das matérias fósseis. Senão, o que irá, repetidamente, acontecer são crises energéticas, como a que ocorreu na China, com consequências globais. E, nos dias seguintes, assistiremos, novamente, ao Governo chinês a ordenar à indústria de extração do carvão que produza “o máximo de carvão possível”, depois do Presidente Xi Jinping ter imposto restrições à sua produção no início deste ano. Um volte face que em nada contribui para a resolução da problemática do aquecimento global.

Escreve quinzenalmente

China e Europa: o pacto suicida


O grande entrave ao consenso internacional para a reversão do aumento da temperatura média prende-se, principalmente, com um plano que elimine gradualmente a exploração dos combustíveis fósseis. 


Após o que parecia ser uma missão quase impossível, a cimeira climática da ONU (COP26) conseguiu aprovar a declaração final, depois de muita discussão em torno do apelo ao fim do uso do carvão. A Índia, através do seu Ministro do Ambiente, travou uma batalha semântica para substituir o “fim progressivo” (phase-out) por uma redução progressiva (phase down) e, a muito custo e não obstante alguns protestos, foi possível a aprovação do texto final.

Desta cimeira há a realçar muito pouco, comparativamente com o que tem que ser feito e com o que, inicialmente, se ambicionou para alcançar: o incentivo ao aumento das contribuições dos membros do Acordo de Paris para o financiamento climático até 2025; o Brasil passou a ser signatário do compromisso global para a redução das emissões de metano (é um dos cinco maiores emissores mundiais de metano); e um acordo global repleto de intenções que visam limitar o aquecimento global a 1,5 grau. Intenções, leu bem! Não há medidas concretas assinaladas. A ausência de metas específicas para 2030 é uma realidade que é compensada com um progresso nos objetivos a longo prazo. Como se nesta batalha, a batalha climática, o tempo não fosse a variável mais determinante para a vitória do homem sobre as suas ambições.

O grande entrave ao consenso internacional quanto aos objetivos a atingir para a reversão do aumento da temperatura média prende-se, principalmente, com um plano que elimine gradualmente a exploração dos combustíveis fósseis, dos quais se destaca o carvão. Desde a Revolução Industrial até 2005, os Estados Unidos da América (EUA) ocuparam a pole position dos países que mais emitem gases de efeito estufa, sendo destronados pela China, que apostou, no início deste século, numa forte industrialização, assente no carvão. Apesar da China deter, à data, o título de país mais poluidor do mundo, as suas emissões per capita não chegam aos calcanhares das dos EUA, o que significa que as suas emissões poluentes têm, ainda, um enorme potencial de crescimento. 

O carvão é responsável por 70% da eletricidade produzida na China. Recentemente, o racionamento da energia nas horas de ponta e o aumento da procura de energia devido ao clima frio nas regiões do nordeste, resultou em: falhas de energia que levaram à paralisação de fábricas; milhões de chineses viram as suas casas sem energia elétrica; semáforos que se apagaram durante horas; e registou-se a falta de cobertura da rede 3G para os telemóveis.
No momento, em que se exige à China que reveja a sua política ambiental e de exploração de matérias fósseis, como o carvão, para a produção de energia, fica por demais evidente que esta estrada é longa e sinuosa. Este breve episódio da crise energética que teve o seu epicentro na China, vai produzir réplicas até à Europa, quando daqui a umas semanas começarmos a ser confrontados com a falta de matérias-primas para as nossas fábricas, ou de produtos originários da China e que fazem parte do nosso dia-a-dia. Bens tão essenciais como carros, tintas, material tecnológico (as fábricas que abastecem a Tesla e a Apple tiveram que encerrar durante um período alargado, na sequência desta crise. Na reabertura, anunciaram que iriam reduzir a sua produção para estarem alinhados com as orientações de Pequim) e que não poderão ser entregues a nível global. Não nos podemos esquecer que muito do que se consome no Ocidente é produzido na China, apesar dessas emissões serem contabilizadas no registo de emissões de carbono chinês. 

Exigir à China que diminua a exploração do carvão enquanto a Europa continua dependente do mercado chinês é uma estratégia arriscada. A União Europeia (UE) tem aqui a oportunidade de liderar a agenda climática, mas para isso tem que apostar na sua autonomia energética, bem como incentivar a um novo processo de industrialização que nos permita sermos autossuficientes para as nossas necessidades. Em 2020, segundo o Eurostat, a China tornou-se o principal parceiro comercial da UE, estatuto que pertencia aos EUA, tendo conservado essa posição em 2021. Entre o primeiro trimestre de 2019 e o segundo de 2021, a percentagem de importações da China para a UE aumentou em 4%.
Este jogo de palavras e de acusações na cena internacional de nada vale se não se escolher, conscientemente, a utilização de energias alternativas renováveis e que possam, eficazmente, ser substitutos das matérias fósseis. Senão, o que irá, repetidamente, acontecer são crises energéticas, como a que ocorreu na China, com consequências globais. E, nos dias seguintes, assistiremos, novamente, ao Governo chinês a ordenar à indústria de extração do carvão que produza “o máximo de carvão possível”, depois do Presidente Xi Jinping ter imposto restrições à sua produção no início deste ano. Um volte face que em nada contribui para a resolução da problemática do aquecimento global.

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