Era um canalha de pai e mãe e fazia-se acompanhar com um cartão de visita de letras arrebicadas: Julio Palau Madariaga, Ingeniero – Standart Oil of Ohio, Columbia, Cª S.A. – – San José 825 – Bogotá. Um luxo. Mas também uma aldrabice pegada. A polícia não tinha dúvidas da falsidade do documento. Identificaram-no como Alberto Campos Gimenez, de 57 anos, um burlão mexicano escorregadio como uma enguia, que tinha estado hospedado no Hotel Tivoli, em Lisboa, durante vários dias de agosto até se volatilizar sem deixar rasto.
Durante essa temporada, solicitou quartos para a mulher e as filhas no Avenida Palace. Como o hotel estivesse cheio, fez um pedido formal para utilizar uma das salas do hotel para a concretização de reuniões que levariam à conclusão de um importantíssimo negócio que tinha em mãos. Bem falante, elegante e finório, ninguém diria que se tratava de um cafajeste. Pelo caminho, segundo o relatório policial levado a cabo entretanto, dirigiu-se à Casa António Gonçalves Lda. para proceder à compra de dólares. Começou com um pacote de 500, acrescentou-lhe, nos dias que se seguiram, mais 400, mais 300 e mais 300. Fazia sempre questão de ostentar publicamente que nadava em dinheiro. Pagava tudo com notas grandes. Estabeleceu uma falsa ideia de confiança, como todos os tranpolineiros do seu género.
O golpe
No dia 5 de setembro, voltou àquela casa bancária e requereu um empréstimo de 21 mil dólares, solicitando a urgência de pelo menos 7000 para o dia seguinte. Foi o empregado da casa, sr. Seixas, que os foi entregar pessoalmente ao engenheiro Madriaga no seu quarto do Hotel Tivoli. Este pediu ao sr. Seixas que esperasse um pouco enquanto abria o cofre para lhe entregar a promissória correspondente. Atrapalhou-se. O cofre não abria. Invocou que tinha a chave errada. Solicitou um instante para ir trocá-la à receção. O sr. Seixas esperou pacientemente meia-hora e impacientemente outros trinta minutos. Quando resolveu ir à procura do aldrabão já este dera às de vila-Diogo por uma porta das traseiras. Levava o bolso do casaco forrado com sete mil dólares.
No dia 7 de setembro, o inspetor da Polícia Judiciária, António Paisana, já tinha uma equipa de agentes à caça do burlão. E, confiante, deixava escapar para os jornais: “O referido indivíduo tem muito poucas possibilidades de escapar. Não apenas por serem reconhecidos os seus sinais mas também por já sabermos da sua verdadeira identidade. Por favor divulguem que aparenta 50 anos de idade, estatura média, forte, cabelo grisalho, ligeiramente calvo, olhos pequenos, fala espanhol e também português com sotaque brasileiro, veste com distinção e geralmente usa panamá”.
O otimismo do inspetor Paisana deu com os burrinhos na água. O malandrim saiu tranquilamente do Hotel Tivoli, apanhou um táxi até Queluz, pagou um almoço ao chofer, criou empatia com ele, pediu-lhe para visitar Sintra e Alcobaça e tomou-o praticamente ao seu serviço para as horas que se seguiram. Como dois compinchas, foram a Mafra, à Batalha, a Fátima e a Coimbra, numa volta turística que terá valido ao chofer umas notas valentes. Depois convenceu-o, no seu português cantado, de que precisava muito que o deixasse em Valença. Aí chegado, tomou outro carro de praça por conta e atravessou a fronteira. O inspetor Paisana, esse, ficou com as mãos a abanar. Ele e a Casa António Gonçalves Lda.